O soldado americano e o hacker inglês

Atualizado em 13 de junho de 2013 às 17:43
Como nos tempos da Guerra do Ópio, a justiça continua ao lado de quem tem canhões mais fortes

 

O soldado americano que matou 16 pessoas no Afeganistão foi retirado do país pelas forças militares dos Estados Unidos. Isso quer dizer: ele não vai responder pelo crime no lugar em que o cometeu. Os afegãos queriam levá-lo a um tribunal local, mas foi o triunfo da esperança sobre a experiência. (Imagine o que aconteceria se um afegão matasse inocentes em Nova York, por exemplo.)

Nesta mesma semana, os Estados Unidos conseguiram, da Justiça da Inglaterra, a extradição de um jovem inglês  acusado de piratear filmes na internet, o hacker Gary Mckinnon.

Que o mundo é injusto, sabemos todos. Mas tinha mesmo que ser tanto assim?

A manipulação da Justiça é um velho costume das potências ocidentais. Uma das razões pelas quais, em meados do século 19, a Inglaterra moveu uma guerra contra a China é que os chineses reivindicavam o direito de julgar lá mesmo os crimes perpetrados em seu solo por ingleses. Segundo um historiador inglês escreveu poucas décadas depois, a reivindicação foi uma “insolência” chinesa. (Com a guerra, a Inglaterra conquistaria o direito de impor aos chineses o tráfico do ópio produzido na Índia. Foi a forma encontrada pelos britânicos de equilibrar o comércio com os chineses, de quem os ingleses consumiam chá, seda e porcelana. Foi, também, provavelmente o momento mais baixo do império britânico.)

Passam anos, décadas, mas os hábitos ocidentais permanecem os mesmos nas suas relações com os bárbaros. O soldado americano já não está no Afeganistão. E o jovem inglês vai ser julgado nos Estados Unidos.

Perfeito. Como na guerra entre Inglaterra e China, a justiça continua a obedecer, cegamente, a quem tem os canhões mais potentes.