A índole democrática da PM está impressa no “Sai, lixo” dirigido ao repórter da BBC. Por Donato

Atualizado em 5 de setembro de 2016 às 11:07

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O ‘Sai, lixo!’ que o repórter Felipe Souza da BBC ouviu de um policial ao mesmo tempo em que recebia golpes de cassetete representa exatamente o que a corporação é levada a acreditar e instada a fazer perante uma mídia independente.

A experiência vivida pelo jornalista é, infelizmente, o que ocorre em 99% das oportunidades em que há manifestações. Quando há qualquer tipo de repressão contra a manifestação, a imprensa independente é reprimida junto com os manifestantes. Ela é atacada, é xingada, é desrespeitada, pois é assim que a polícia vê a imprensa que não é amiga: um lixo.

Todas as vezes em que acontece de a manifestação sofrer um bloqueio formado pela polícia de modo a impedir o prosseguimento da marcha, nós da imprensa ficamos confinados igualmente. O comando da polícia diz ‘ninguém vai passar’ e ninguém passa. Se ousar tentar será empurrado, agredido, xingado.

Você se identifica como imprensa, mas ele diz: “Ninguém vai passar. Ninguém é ninguém, entendeu?”. Mas numa segunda olhada você logo identifica os jornalistas da grande mídia do lado de lá do cordão. Autorizados que foram e protegidos que serão.

Já perdi as contas de quantas vezes fui agredido pela polícia de forma gratuita nesses últimos anos. Mesmo estando identificado como imprensa. Mas só quando alguém da grande mídia por engano é atingido é que se faz alvoroço, por mais superficial que tenha sido a ocorrência.

No início deste ano uma jornalista da CBN recebeu um jato de spray de pimenta, foi o que bastou para dar até Jornal Nacional. De tão frequente, nós independentes nem constumamos considerar isso agressão. É um bom retrato da disparidade de tratamento.

Muitos colegas de profissão já ficaram gravemente feridos nessas situações e hoje estão sendo declarados pela justiça culpados pelo que lhes ocorreu. Por estarem ‘onde não deveriam estar’. E onde a imprensa deveria estar? Protegida e acovardada atrás da polícia?

Só nos protestos da semana passada, nada menos que nove profissionais da imprensa foram agredidos ou feridos em decorrência do armamento policial. Dois ainda foram detidos sendo que um deles, Vinícius Gomes, teve seu equipado completamente destruído. Depois de agredi-lo, o policial pisoteou em cima da câmera, triturando-a. Ele faria isso se visse um logotipo da Globo no equipamento?

Assim como todo esse processo de impeachment foi um tremendo teatro que encenou estar seguindo os ‘estritos ritos jurídicos e democráticos’ (quando na verdade Dilma estava condenada desde o dia seguinte em que foi eleita), também a polícia faz uma ação que se anuncia como de proteção aos manifestantes sendo que de fato está lá para reprimir e atacar tão logo resolva que aquilo deve ser feito. E contará com a cumplicidade da grande mídia que divulgará ter havido primeiro uma depredação, um ‘vandalismo’.

Essas corporações se apoiam mutuamente. Uma manifestação como a de ontem, com a avenida Paulista absolutamente repleta, teria um destaque muito grande no PIG se o escopo do protesto fosse contra Dilma, contra o PT, contra a ‘corrupção’. A Folha de S.Paulo de hoje até deu uma foto na capa, mas a manchete a principal era sobre outro assunto e ‘otimista’ para o atual governo. Reportagem sobre o protesto de ontem mesmo, só lá na página 6. Por quê?