A ingratidão de Alckmin para com seu ex-braço direito acusado de enriquecimento ilícito. Por José Cássio

Atualizado em 8 de maio de 2016 às 13:09
Aparecido com o guru FHC
Aparecido com o guru FHC

 

Quem vê Edson Aparecido indo trabalhar todo dia na Câmara Municipal de São Paulo dificilmente acredita que segue ali, com destino à sua mesinha de escriturário no departamento de RH, um virtual campeão de votos na eleição de outubro.

O ex todo poderoso chefe da Casa da Civil do Governo de São Paulo, braço direito de Geraldo Alckmin, cumpre na Câmara uma espécie de penitência calculada: ao mesmo tempo em que, após ter sido colhido no escândalo da merenda e na compra suspeita de um apartamento de luxo, precisa deixar Alckmin confortável, subliminarmente ele quer sinalizar para os eleitores que é uma pessoa que vive dos próprios rendimentos – e que é um sujeito trabalhador.

No mais, sua rotina é de alguém em permanente campanha eleitoral, cujo objetivo é “arrebentar de voto”, como se diz na gíria, para se possível obter a maior votação da cidade, chegar à presidência da Câmara de vereadores e retomar uma carreira que teve início no final dos anos 70 como líder estudantil.

Aparecido é um dos fundadores do PSDB. Foi deputado estadual de 1998 a 2002 e federal duas vezes: em 2006 e em 2010.

Passou a integrar o governo de Alckmin primeiro como Secretário do Desenvolvimento Metropolitano e, depois, como chefe da Casa Civil.

Coordenou as campanhas de Alckmin à Presidência, em 2006, à Prefeitura, em 2008, e ao governo do Estado, em 2014.

Apesar dessa relação com o governador, fez corpo mole nas prévias do PSDB para a escolha do candidato a prefeito de São Paulo, quando Alckmin fez das tripas coração, inclusive com uso despudorado da máquina estatal, para garantir a legenda ao publicitário João Doria.

A indecisão acabou sendo a gota d´água que Alckmin precisava para combinar com o subordinado o exílio forçado na Câmara, visto que Aparecido já vinha sofrendo isolamento desde que seu nome começou a aparecer no processo da Operação Alba Branca, que investiga a máfia da merenda escolar.

De acordo com grampos telefônicos plantados pela Polícia Civil, grande parte das ordens que articularam as fraudes partiu do Palácio dos Bandeirantes, sede do governo estadual. As conversas saíram precisamente da Casa Civil, da sala de Luiz Roberto dos Santos, o Moita, ex-chefe de gabinete de Aparecido.

A Casa Civil é responsável pela articulação política e administrativa do governo.

À pasta compete articular o trabalho das secretarias estaduais na elaboração e execução de políticas públicas, na apresentação e coordenação da aprovação de projetos de lei na Assembleia Legislativa e no relacionamento do governo com as prefeituras, o governo federal e o Congresso Nacional.

Só alguém muito ingênuo para acreditar na conversa de que Aparecido se desincompatibilizou para se candidatar a vereador em São Paulo. Ainda mais tendo de reassumir um cargo de escriturário, para o qual foi aprovado em concurso há 30 anos.

Sua pré-campanha acontece em duas frentes: nas reuniões com líderes políticos, empresariais e populares durante os sete dias da semana e 24 horas nas redes sociais, notadamente em sua página no Facebook.

Nas postagens com a tag #SPNoCoração, ele aparece visitando bairros da cidade e dialogando com moradores, conversando com lideranças como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso ou, ainda, utilizando serviços públicos.

No início deste mês, postou uma imagem no Metrô, também alvo de inúmeros escândalos do governo paulista, em que diz:

– O Metrô é a melhor forma de transporte da cidade. Eu uso muito nas minhas viagens, que têm sido numerosas. Muito bom poder conversar com as pessoas e conhecer mais de perto os problemas concretos da cidade, e pensar soluções.

A página tem boa interação de seguidores, a maioria simpatizante ao seu desejo de garantir uma cadeira na Câmara municipal.

Numa postagem em que se defende de acusações, a maior parte dos usuários diz para ele não se preocupar, já que é “íntegro” e “comprometido”.

O caso da merenda não é a sua única pedra no sapato.

Em 2007, no início de seu mandato como deputado federal, Edson teria comprado um imóvel de alto padrão em Moema por um valor, R$ 620 mil, bem abaixo do mercado.

O apartamento pertencia a Luiz Albert Kamilos, cuja empresa prestava serviços ao governo de São Paulo.

Em março deste ano, o Ministério Público abriu um inquérito para investigar o caso, onde Aparecido é acusado de enriquecimento ilícito e improbidade administrativa.

A despeito do exílio calculado, fatos concretos ajudam a formar o quebra-cabeças que garante que ele não só conta com o apoio irrestrito de Alckmin, e vai se envolver de cabeça na campanha de Doria, ou seja lá quem for o candidato do PSDB, como também é parte da engrenagem estratégica de outro importante cacique tucano.

Em relação a Alckmin, basta dizer que Aparecido deixou a Casa Civil, mas o atual titular da pasta, Samuel Moreira, vem mantendo rigorosamente, sem pestanejar, todos os acordos definidos por ele.

Numa outra ponta, dias atrás saiu radiante de um encontro com FHC.

Ouviu aquilo que o próprio senador José Serra já havia sinalizado. Que havia pedido para que todos os seus ex-subprefeitos apoiassem a sua candidatura.

A decisão que acendeu uma luz amarela no partido, dando margem a uma interpretação óbvia: no seu plano B, Serra está sim mirando a candidatura a governador em 2018, num entendimento com Alckmin – e o pré-candidato travestido de humilde escriturário seria o elo entre os dois.

Edson Aparecido é alguém que merece figurar no radar fino daqueles que se pretendem entendedores do jogo do poder paulista e, especialmente neste momento, da cena eleitoral de São Paulo: sua volta por cima, se é que ela vai acontecer, é um bom case de como os animais políticos são capazes de se reinventar mesmo diante das maiores adversidades.

 

Em seu exílio na Câmara
Em seu exílio na Câmara