A jararaca não apareceu, mas Lula continua pronto para a briga. Por Pedro Zambarda

Atualizado em 15 de setembro de 2016 às 19:24
Lula na coletiva sobre a denúncia do MPF
Lula na coletiva sobre a denúncia do MPF

 

Depois de memes com o powerpoint vagabundo divulgado pelo MPF, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez um discurso duro nesta quinta-feira (15), que mostrou sua disposição para lutar diante do linchamento judicial e midiático.

O procurador Deltan Dallagnol, do Ministério Público Federal, afirmou que “provas são pedaços da realidade que formam convicção”. Depois, Roberson Pozzebon disse que, na investigação, “não teremos provas cabais de que Lula é efetivo proprietário do triplex no Guarujá”. Para o MP, a suposta ocultação do imóvel seria parte do crime imputado a Lula.

“Não conheço os meninos que fizeram a denúncia e vocês não ouviram nenhuma palavra de ofensa da minha parte. Aprendi com minha mãe que não adianta ficar zangado, porque senão você faz o jogo do adversário”, disse Lula antes de criticar o dinheiro público gasto pela força tarefa da Lava Jato em sua apresentação de uma denúncia sem fortes provas de crime no Petrolão.

E completou: “Não posso dizer qual é a convicção que tenho deles [os procuradores]. Li um artigo do Nassif hoje que chamou minha atenção. Eles sabiam e tinham provas de um helicóptero com 450 quilos de pasta base de cocaína. Eles viram a droga, mas eles não tinham convicção!”.

A declaração pública de Lula bateu forte no senador mineiro Zezé Perrella (PTB), que seria o dono do helicóptero no escândalo não solucionado de 2014. O político é afilhado político de Aécio Neves, o candidato derrotado do PSDB.

Lula relembrou de sua história na construção do PT, após entender que as centrais sindicais deveriam ter alternância de poder, e disse, do começo ao fim do discurso que começou com atraso às 13h20, que estava “indignado”.

Chorou também em duas ocasiões, sobretudo quando falou da família. Mesmo assim, não deixou de fazer piadas ao falar com companheiros, embora estivesse visivelmente triste.

“Eles entraram com o pé na porta na casa dos meus filhos e dos meus netos. Ninguém pode dizer eu não os respeitei. Tomaram os iPads dos meus netos. Tiraram até o celular da Marisa, que ela usava pra ficar no zapzap de noite”.

No momento em que acontecia a cobertura jornalística na coletiva de Lula, o jornal Folha de S.Paulo colocou em uma manchete de seu blog ao vivo: “’Só não sou mais que Jesus Cristo’, diz Lula sobre sua honestidade”.

Quem estava diante do ex-presidente ou assistindo a coletiva online, viu que ele se referia à sua popularidade. Em momento algum Lula disse que era tão honesto quanto Jesus.

Fez as críticas necessárias à imprensa. “O que eles fizeram com Dilma hoje tentaram contra mim em 2005. O fracasso de determinados setores da imprensa é que alimentam esse ódio. A lógica de hoje não é a da justiça, mas a das manchetes”.

“Construíram uma mentira, uma inverdade, como se fosse um enredo de uma novela. E tá chegando o fim do prazo, afinal de contas já cassaram o Cunha, já elegeram o Temer, pela via indireta, pelo golpe, já cassaram a Dilma, agora precisa concluir a novela. Acabar com a vida política do Lula. Porque não existe outra explicação para o espetáculo de pirotecnia”.

Lula afirmou que os golpistas vão se arrepender do que fizeram no âmbito da história. O ex-presidente também disse que o orgulho que o Brasil sentia em seu governo não foi mérito dele, mas sim dos trabalhadores que levaram a boa imagem ao exterior. Admitiu que não foram os pobres somente que prosperaram no seu mandato, mas sim empresários e banqueiros que ofereceram empregos.

Cristiano Zanin Martins, advogado de Lula
Cristiano Zanin Martins, advogado de Lula

 

Ele também afirmou que, se forem encontradas provas de algum crime que ele cometeu, iria se entregar a pé às autoridades. Disse estar disponível para prestar qualquer esclarecimento.

“Se alguém não gosta de mim, eu não vou pedir pra gostar. Quero agradecer à imprensa e espero ter o mesmo destaque que os meus acusadores tiveram ontem. Só desejo isso para poder comunicar, porque no fundo quero falar com as pessoas mais pobres neste país, aqueles que perderam seu emprego e sua aposentadoria”, falou.

“É isso que [os golpistas] estão tentando fazer. O pobre não é problema. Ele é solução. Não pensem que eu estou sofrendo. Estou é orgulhoso. Porque a perseguição que eles fazem a mim é pelas coisas que ocorreram de bom”, encerrou ao som de “Lula é meu amigo” e “guerreiro do povo brasileiro” da militância.

Na coletiva compareceram os senadores Lindbergh Farias, Gleisi Hoffmann e o líder da bancada, Humberto Costa. O advogado Celso Bandeira de Mello, o presidente e a diretora do Instituto Lula, Paulo Okamotto e Clara Ant, também estiveram presentes, assim como representantes da CUT e do MTST, como Guilherme Boulos. O ex-senador Eduardo Suplicy, por não encontrar uma cadeira para se sentar, viu o discurso do chão junto com fotojornalistas.

Antes de Lula, o presidente do PT, Ruy Falcão, leu uma nota de repúdio do partido à denúncia do MPF. Cristiano Zanin Martins e Roberto Teixeira, da defesa do ex-presidente, deram uma coletiva após a fala do ex-presidente.

Zanin Martins foi entrevistado pelo DCM sobre as declarações Deltan Dallagnol e Roberson Pozzebon na coletiva do Ministério Público. “As falas mostram que não há provas de que o apartamento pertença ao ex-presidente ou a dona Marisa. Não se justifica a formulação de um denúncia sem o mínimo de materialidade. Nesta circunstância, a única conduta possível é a rejeição desse procedimento. Nós vamos conturbar pelo histórico conturbado para fazer uma análise detida”, declarou.

“Acredito que a fala de Lula foi muito boa e rebateu os principais pontos da falsidade que foi armada e questionou abertamente se as pessoas conhecem o Brasil. Essa meninada não conhece e acha que pode fazer tudo sem nenhuma consequência”, comentou a senadora Gleisi Hoffmann ao Diário sobre o discurso do ex-presidente.

No final da coletiva, por volta das 15h, petistas protestaram na Rua Martins Fontes contra o golpe e a grande mídia. Empunhando bandeiras do PT e do Brasil, pediram um “basta nos ataques seletivos e sem provas”.

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