A luta da mãe do menino Eduardo com os canalhas que querem assassinar a reputação de seu filho

Atualizado em 16 de abril de 2015 às 12:40
Terezinha de Jesus Ferreira
Terezinha de Jesus Ferreira

 

 

O policial que matou o menino Eduardo mirou no que viu e acertou o que não viu. Esta é uma expressão usada para designar lances de sorte, em que o sujeito alveja uma presa pequena mas derruba elefante que estava atrás da moita.

No caso do policial que esfacelou o crânio de Eduardo de Jesus Ferreira na porta de casa, foi azar. Dos grandes, daqueles azares de vilão de James Bond. Porque ele mirou, como muitos de seus colegas, no que viu: numa criança favelada cuja morte não deixaria rastros.

Uma estatística do Sistema de Informação da Mortalidade do SUS diz que, nos últimos 10 anos, 60% das mortes de crianças por policiais no Brasil aconteceram no Rio. Das 82 crianças e adolescentes de até 14 anos assassinados por policiais no Brasil, 60 tombaram pelas mãos da PM do Rio.

Mas ele não foi o único azarado na história.

No mesmo dia em que Eduardo morreu, o menino de 10 anos sofreu outra tentativa de assassinato, desta vez de reputação. O fundador da ONG Afroreggae, José Junior, escreveu no Facebook que o garoto era bandido. Não hesitou um segundo em publicar o boato que lhe fora soprado por uma de suas “fontes”. Também não titubeou ao covardemente apagar o post diante da grita geral.

José Junior e o policial que atirou em Eduardo podem ter pensado que tudo ficaria como estava. Só mais um projeto de bandido, como tantos. Não vale nada. Mas como tiveram azar. Acertaram no filho de um casal trabalhador, acertaram no filho de uma mãe que não tem medo.

“Eu só só quero mandar um recado para o José Junior, o líder do Afroreggae, que colocou na internet que o meu filho é bandido, que criança morta de 10 anos no Alemão é bandido. Eu quero dizer que bandido é ele. Meu filho não é bandido. Meu filho é uma criança que estudava, que tinha projeto na escola”, disse Terezinha, mãe de Eduardo.

Mãe é mãe, não é? Defende o filho em qualquer situação. Que tal então ouvir a professora de Eduardo, que gravou uma mensagem de vídeo depois de sua morte? Disse a professora Camila Oliveira:

“No ano passado, fizemos um projeto para ajudar a comunidade, e o Eduardo foi um dos que se interessou em participar. Ele adorava contar história para as crianças menores, fazer atividades com teatro, e principalmente de ir a asilos, e fazer atividades que envolvessem a cidadania. No nosso último encontro, Eduardo teve a sua ultima conversa comigo: ‘Tia, quando vamos a um outro asilo? Queria muito cuidar das vovós’. E é essa a memória que vai ficar dele.”

Todas as características de bandido sem coração que merece tiro de fuzil na cabeça, não é mesmo?

A luta de Terezinha de Jesus agora é pela memória de seu filho e por justiça.

“Reconheço o policial em qualquer lugar do mundo. Se botar um milhão de policial eu vou direto nele”, disse Terezinha Maria de Jesus. Ela acaba de voltar ao Rio com o marido, depois de enterrar o filho na cidade de Corrente, sua terra natal no sul do Piauí.

“Eu o agredi. Eu agarrei no colete dele e falei: você matou meu filho desgraçado. E ele falou: ‘assim como matei o filho, posso muito bem matar a mãe’. Ele me falou duas vezes e depois de tudo fiquei perto dele e perguntei se ele era pai e se tinha filho e ele não me respondeu nada”.

Depois de declarar sua guerra sagrada, qual campanha de difamação se abaterá sobre o cadáver de Eduardo, sobre Terezinha e sua família?

No caso do pedreiro Amarildo, que simplesmente não morreu mas também nunca mais foi visto depois de entrar na UPP da Rocinha, uma campanha orquestrada para abafar o caso e desacreditar os familiares se pôs em marcha imediatamente.

Como era noite e ninguém por perto, as 84 câmeras da UPP que filmavam a Rocinha deram problema. Os GPS dos carros da UPP também calharam de não funcionar naquela noite. Ninguém sabe, ninguém viu. Contra a mulher de Amarildo surgiram denúncias de que era ligada ao tráfico, que frequentava churrascos de traficantes, e por aí vai.

Voltemos ao azar do policial que matou Eduardo e do benfeitor que condena o cadáver de uma criança de 10 anos de idade, o indefectível José Junior.

Se Eduardo fosse bandido, a única coisa que justificaria sua execução seria a legítima defesa. Desta vez, pelo poder das câmeras de celular, não foi possível presentear a criança postumamente com vistosos rifles AR-15 ou um AK-47. O vídeo mostra a criança, com sua roupinha limpa, de camiseta e bermuda, numa poça de sangue no chão.

A liberdade de expressão desta mulher é responsabilidade nossa. Se um raio ou um meteoro cair sobre ela, se ela pegar uma pneumonia fatal, se tropeçar na escada e morrer nos próximos meses, a culpa será de todos nós. Estão revogadas todas as possibilidades de coincidências.