A miséria da festa de abertura das Olimpíadas. Por Paulo Nogueira

Atualizado em 7 de agosto de 2016 às 12:35
Ausência imperdoável na abertura: Pelé nos anos 60
Ausência imperdoável na abertura: Pelé nos anos 60

Você sabe aquela do Brizola com o Roberto Marinho, não sabe?

Roberto Marinho convidou Brizola para um encontro na Globo. A sala de Marinho, no tamanho de um campo de futebol, dava para um vista maravilhosa do Corcovado.

Marinho ofereceu a vista a Brizola. Ficou de costas para o Corcovado.

No meio da conversa, Marinho disse a Brizola. “O senhor realmente detesta o Rio. Não olhou nenhuma vez para a paisagem.”

Brizola devolveu: “É que o senhor estraga qualquer vista.”

Disse isso pelo seguinte. Detestei a abertura das Olimpíadas. A presença de Temer, como a de Marinho nas palavras sábias e imortais de Brizola, destroi qualquer festa.

Mas tenho razões adicionais.

Estava em Londres em 2012. Personagens essenciais da história inglesa foram magistralmente evocados, de Shakespeare a James Bond, de Mister Bean aos revolucionários do rock dos anos 60. Até o NHS, o amado sistema de saúde pública do Reino Unido, foi celebrado.

Agora vejamos a cerimônia brasileira, uma espécie de rascunho da inglesa, feita pelo cineasta Danny Boyle.

Onde o maior nome da literatura brasileira, e um dos maiores da literatura mundial, Jorge Amado?

Numa mistificação histórica, apareceu Santos Dumont com seu 14 Bis, inventor do avião só reconhecido pelo Brasil.

Por que não, em vez dele, Ayrton Senna, um homem que levou o nome do Brasil para o mundo quando éramos universalmente alvo de chacota?

Imagine a cena de Senna com a bandeira brasileira numa volta pelo Maracanã igual àquelas que ele imortalizou nos domingos pela manhã do passado?

E o futebol?

Tanto se falou de Pelé para acender a tocha e os organizadores se esqueceram que ninguém como ele simboliza aquele futebol arte que deslumbrou o mundo no final dos anos 50 até 1970, período em que ganhamos três títulos mundiais.

E Garrincha? Alguém quer coisa mais brasileira, na glória e na tragédia, que Garrincha?

Há um arquivo de imagens maravilhosas da época dourada do futebol brasileiro: as gravações do Canal 100, no mesmo Maracanã da festa de abertura.

O futebol da década de 60 está para o Brasil como o rock de então está para a Inglaterra. Ambos foram embaixadores de gala de seus países. Danny Boyle não esqueceu disso.

E nossos organizadores?

Tom Jobim foi merecidamente festejado, mas um trecho de Construção faz jus ao tamanho de Chico Buarque?

É aí que você na questão política. Chico Buarque certamente não figura na lista dos favoritos de Fernando Meirelles, o cineasta brasileiro que fez o papel de Boyle na abertura da Rio-2016. Meirelles comparou o marqueteiro de Dilma a Goebells.

E então Chico vira nota de rodapé na cerimônia.

Tivemos Giselle, mas não Elis Regina.

Repito. Por causa de Temer nada me faria gostar da cerimônia. Mas as ausências de ícones vitais do Brasil me fizeram detestar a festa, excetuadas, é claro, as vaias a Temer.