“Era a brecha que o sistema queria”: um policial conta ao DCM se haverá retaliação ao Black Bloc

Atualizado em 17 de outubro de 2014 às 17:27

pmesp

O soldado MJP falou com o DCM sobre a ação da corporação durante as manifestações. Em sua opinião, a polícia não sabe lidar com a explosão dos protestos quase diários no Brasil. “Não tem plano, não tem padrão, não tem protocolo. Ficou complicado. Se a gente reprime, é violento; se não faz nada, é conivente”, diz ele. MJP, que trabalha em São Paulo, acredita que a morte do adolescente Douglas Martins Rodrigues na Vila Medeiros foi acidental — uma “fatalidade” –, mas admite que a polícia age com mais rigor na periferia. “Sempre foi assim”, afirma.

Ele conversou também sobre uma possível retaliação aos black blocs após o ataque ao coronel Reynaldo Simões Rossi, destacado para supervisionar o ato que o Movimento Passe Livre convocou no dia 26 de outubro.

A seguir, alguns trechos da entrevista:

Existe alguma orientação para retaliar os manifestantes depois do ataque ao coronel Reynaldo? 

Oficialmente, nenhuma. Mas a polícia vai agir com rigor logo de início, sem esperar muito. O contingente será maior, a força também. Você conhece aquela música do Racionais MCs? Tem uma que diz: “Essa era a brecha que o sistema queria”. O que aconteceu com o coronel era a brecha que o sistema queria… Isso serviu também para justificar a invasão do Carandiru, por exemplo. A rebelião dos presos era a brecha.

Você acredita que tenha havido armação?

Não acho que tenha sido armação, como alguns black blocs estão dizendo. O vídeo mostra isso bem. Tanto que ele perdeu uma arma de fogo.

A polícia tem um plano de ação para lidar com os protestos?

Não. Essa situação das manifestações é nova e ninguém sabe o que fazer direito. Não tem plano, não tem padrão, não tem protocolo… Politicamente, ficou muito complicado: quando a gente reprime, é violento; quanto não faz nada, é conivente. A PM está perdida. O secretário de segurança de São Paulo mandou “observar” para depois agir. Mas isso nem sempre dá certo. No protesto na rodovia Fernão Dias, o pessoal tacou fogo, fez aquela bagunça… Só quando um caminhão virou é que os soldados partiram para a ação, mas aí já era tarde demais.

O que você e seus colegas pensam sobre a desmilitarização?

Eu sou a favor. Eu e muita gente. Mas ninguém questiona nada dentro da polícia. O caso Amarildo teve muita repercussão. Só não sei se a desmilitarização vai diminuir o rigor. Para ela acontecer, vai ter de se discutir como ficam os planos de carreira e mais várias coisas. Por enquanto, fica tudo só na especulação.

O caso da morte de Douglas é mais uma prova de que o trabalho da polícia é diferente na periferia?

Sim, sempre foi. As áreas nobres têm mais contingente, mais viaturas… É assim que funciona. Nos bairros pobres não tem estado, e isso inclui a polícia, claro.