Aécio ainda não entendeu que perdeu perdendo

Atualizado em 7 de março de 2017 às 16:02
E foram felizes para sempre
E foram felizes para sempre

Há uma coisa estranha em Aécio: passado mais de um mês das eleições, ele está com um discurso de quem ganhou as eleições.

Isso ficou claro na entrevista que ele concedeu a Roberto Risadinha d’Ávila, o homem-Caras do jornalismo brasileiro: sorrisos antes, durante e depois do programa.

Se não se imaginasse vencedor, Aécio não diria que encarnou o “sentimento de mudança” da sociedade brasileira. Porque esta é uma coisa que só quem vence pode dizer, e com moderação – ou passará por arrogante.

Mas Aécio é Aécio: ele consegue ser arrogante na derrota.

Compare sua atitude com a do candidato uruguaio derrotado neste final de semana, Luis Lacalle Pou.

Pou telefonou elegantemente a Tabaré Vázques, o vitorioso, para lhe dar os parabéns pela vitória “legítima” assim que os números mostraram que o resultado estava definido.

Aécio não.

Ainda agora, ele não parece ter aceitado que foi batido. “Perdi ganhando”, disse ele a d’Ávila. Dilma, segundo ele, “ganhou perdendo”. Aécio estava citando não Churchill, não Lincoln, não Napoleão, não de Gaulle. Estava citando Marina, que também reivindicou uma vitória na derrota.

A primeira providência para Aécio retornar ao Planeta Terra é ele entender que perdeu perdendo. Mesmo com toda a ajuda que teve da mídia, mesmo com Marina e a viúva de Eduardo Campos a seu lado, mesmo com os vazamentos seletivos da Polícia Federal – mesmo assim ele conseguiu perder.

Foi uma façanha.

Quando puser os pés nos chãos, Aécio tem que explicar algumas coisas. O aeroporto de Cláudio, por exemplo. Para citar mais um caso, o dinheiro público que sua irmã Andrea colocou nas rádios da família quando ele era governador de Minas.

Demagogo, no sentido clássico, é quem faz coisas na política que acusa os inimigos de fazerem.

Aécio se queixa de ter sido “ofendido” na campanha, mas fez coisas como usar a expressão “mar de lama” para caracterizar o governo de sua adversária.

Repetiu inúmeras vezes que Dilma estava destruindo o Brasil, se valendo para isso de pseudoestatísticas feitas para enganar os leitores.

Luciana Genro também experimentou o veneno de Aécio durante os debates: foi chamada de “leviana” e acusada de comandar um partido que é “linha auxiliar” do PT.

E este é o homem que se declara vítima de “desconstrução”.

No programa de d’Ávila, o construtor Aécio chamou o PT de “organização criminosa” em duas ocasiões — sem que d’Ávila fizesse nada além de sorrir. D’Ávila reagiu como se Aécio estivesse falando sobre o tempo, ou sobre o resultado da última rodada.

Aécio falou em “aparelhamento”, mas como governador ele aparelhou até a mídia mineira com sua política de anunciar apenas em quem não o criticasse.

Aécio condenou o “crime de responsabilidade fiscal” cometido agora por Dilma ao tentar mudar algumas regras relativas ao orçamento.

Mas um momento: como noticiou um insuspeito colunista do G1, FHC fez também uma gambiarra com os mesmos propósitos em 2001.

“O Brasil acordou”, disse uma hora Aécio a d’Ávila.

Eis uma das raras frases em que ele acertou, embora ele tenha se atrasado uma enormidade para perceber o fenômeno.

Foi exatamente por terem acordado que os brasileiros não elegeram Aécio e tudo aquilo que ele representa.

O final ideal para o programa teria sido uma imagem de Aécio e d´Ávila com a seguinte inscrição: “E foram felizes para sempre.”