Agatha Christie sobre os segredos e os encantos dos romances policiais. Por Camila Nogueira

Atualizado em 22 de novembro de 2016 às 22:55
Christie, a Duquesa da Morte
Christie, a Duquesa da Morte

Em nossa nova Conversa com Escritores Mortos, entrevistamos a célebre romancista policial inglesa Agatha Christie. Tiramos os trechos abaixo de diversos de seus livros, entre os quais A Casa Torta, Punição para a Inocência Assassinato na Casa do Pastor.

Mrs. Christie, o que a levou a escrever romances policiais?

Dizem que todo mundo ama o amor. Mas transporte esse ditado aos assassinatos e então terá uma verdade incontestável. Ninguém deixa de se interessar por um assassinato.

Como identificar um bom detetive?

Um bom detetive prioriza a prudência e o autocontrole em detrimento da impulsividade e a energia.

Isso não deixa de fazer sentido.

É necessário que se acomode em uma poltrona confortável, tome um chocolate quente e permita que os eventos sigam seu curso natural. Exercitando suas células cinzentas nesse meio tempo, é claro.

Existe alguma maneira de identificar um assassino?

Não creio que existe um sinal, um indício universal, que ajude a reconhecer um assassino no meio de um grupo de pessoas aparentemente normais e amáveis. Se é que existe uma espécie de denominador comum, me sinto inclinada a dizer que é a vaidade. Quase todos os assassinos são vaidosos. É a vaidade que os leva a fazer o estrago, nove entre dez vezes. Podem até ter medo de serem pegos, mas não conseguem evitar se exibir e se gabar, e de modo geral têm certeza que foram espertos demais para serem descobertos. A tem outra coisa: assassinos querem falar. Cometer um assassinato coloca o autor do crime em uma situação muito solitária. Você deseja contar a alguém tudo o que aconteceu, e no entanto não pode. E isso faz com que você queira contar ainda mais. E, se você não tem meios de falar como fez isso, pode pelo menos falar sobre o assassinato em si. Pode discuti-lo, criar teorias e analisá-lo.

Acha que há algum padrão comportamental entre os seres humanos?

A verdade é que somos todos mundo parecidos. A maioria das pessoas não é boa nem má – são apenas tolas. E, é claro, devemos agir com elas de acordo com suas personalidades.

Como assim?

Em cada dez pessoas que encontramos, pelo menos nove poderiam ser levadas a agir da maneira que quisermos pela aplicação do estímulo correto. Existem os homens tirânicos; grite mais alto do que eles e eles obedecerão. Há os homens contraditórios; intimide-os na direção oposta àquela que quer que sigam. E assim por diante.

Algo a acrescentar, Mrs. Christie?

Em um assassinato, o que importa não é o culpado, e sim o inocente. Ele não afeta apenas o assassino e a vítima, afeta também os inocentes.

A senhora poderia explicar um pouco melhor?

Pensemos no caso Bravo, que ocorreu há cerca de cem anos. Todos eram suspeitos: a sua esposa, a governanta e o médico da família, e até o próprio Charles Bravo – que poderia ter cometido suicídio. Várias teorias são plausíveis, mas o fato é que agora jamais iremos saber o que aconteceu. O que se sabe é que sua mulher, Florence Bravo, foi abandonada pela família e morreu na sarjeta; a sra. Cox, condenada ao ostracismo, jamais conseguiu outro emprego; e o dr. Gully foi arruinado social e profissionalmente. Um deles cometera um assassinato e escapara da forca, mas os outros eram inocentes e foram condenados.

Curioso.

O mal nunca passe impune, mas nem sempre essa punição é evidente.

Como cometer o crime perfeito?

Leia Otelo e se inspire em Iago, que cometeu por inveja um dos crimes mais engenhosos de toda a literatura, profissionalmente falando. Iago conseguiu que os outros realizassem tudo por ele. Imagine um criminoso de hoje que ninguém jamais poderia prender porque ele em si nunca chegou a fazer nada.

Qual é a sua opinião sobre assassinatos?

Eu tenho uma atitude burguesa em relação a assassinatos: eu os desaprovo.