Almirante Othon : “A gente quer é a felicidade do povo”. Por Wadih Damous

Atualizado em 16 de novembro de 2017 às 14:03
Othon Pinheiro e Wadih Damous

Com essa frase, o almirante Othon Luiz Pinheiro da Silva, genial cientista brasileiro e considerado o pai do nosso programa nuclear, se despediu da conversa que tivemos na última segunda-feira, 13 de novembro, quando me deu a honra de receber-me em sua casa no Rio de Janeiro.

Impressiona como o patriotismo e o compromisso com o povo brasileiro desse senhor de 78 anos, condenado a 43 anos de prisão – o  que, na prática, é prisão perpétua -, permanece rijo e impermeável à perseguição política que sofre. Cumprindo prisão domiciliar para tratamento de um câncer de pele, os olhos de Othon brilham ao falar do projeto ao qual se dedica atualmente.

Em parceria com Paulo Leone, tido pelo almirante como um dos mais brilhantes engenheiros do país, Othon trabalha na criação de um hidroturbogerador, equipamento capaz de operar em baixas quedas d’água, gerando energia barata em áreas isoladas do Brasil.

Nascido na cidade de Sumidouro, no interior do estado do Rio de Janeiro, e criado no “Brasil profundo”, como gosta de dizer, às margens do Rio São Francisco,  ele ingressou na Marinha aos 15 anos de idade. Depois de atingir o oficialato como engenheiro naval, fez vários cursos de pós-graduação em engenharia e em tecnologia nuclear no Brasil e no exterior, o que o dotou de sólida formação acadêmica.

Depois de assinado o programa nuclear com a Alemanha, ele, ao lado de uma equipe que, como faz questão de destacar, se notabilizava pelo engajamento e por não temer desafios, trabalhou em inúmeros projetos, dentre eles o que culminou na criação de um tipo revolucionário de centrífuga. As pesquisas e os trabalhos que levaram o Brasil a dominar completamente o ciclo do urânio contaram com a liderança e o forte protagonismo de Othon.

Acerca da possibilidade de o Brasil produzir artefatos nucleares, ele é taxativo : “temos todas as condições de fabricá-los, mas apenas como inibidores de concentração de forças que por ventura venham a nos atacar. Mas só seria necessário se o cenário mudasse. No momento, vivemos em paz no continente e uma eventual produção da bomba desequilibraria a correlação de forças entre os países da região.”

Após a ida para a reserva da Marinha, em 1994, Othon chegou a ser aprovado em primeiro lugar entre os 16 doutores que concorreram para duas vagas na CNEN- Comissão Nacional de Energia Nuclear. Como as regras do concurso, porém, não garantiam ao primeiro colocado a nomeação e um amigo seu se dizia prejudicado, resolveu apresentar sua desistência em favor do amigo.

Desde então se lançou no ramo da consultoria, realizando inúmeros trabalhos técnicos nas áreas de energia, principalmente. Em dezembro de 2004, é procurado pela empresa Andrade Gutierrez, que havia vencido a licitação para a construção de Angra III, mas depois da escavação paralisara as obras. No trabalho feito para a empresa, Othon deixou claro a importância para o país da construção da usina do ponto de vista econômico e energético.

Mal podia imaginar que ali começaria seu calvário, uma vez que esse trabalho seria criminalizado pelo Ministério Público, mesmo que sua conclusão tenha se dado em dezembro de 2004. Como se sabe, o almirante só assumiu a presidência da Eletronuclear no final de 2005. Nem a extensa folha de serviços prestados à nação nem as evidências temporais foram capazes de impedir que o MP e o Judiciário sucumbissem à pressão dos interesses internacionais contrariados pelo trabalho de Othon. Ao contrário, o seu brilhantismo, reconhecido pelo justiceiro Marcelo Bretas, serviu de agravante da pena.

A partir daí o estado de exceção em que vivemos não fez por menos. De uma dosimetria de pena absurda de 43 anos a mentiras como a presença de telefone na cela (como justificativa para a não concessão de habeas corpus) e a acusação de ter feito contato com empresas quando estava em prisão domiciliar, tudo seguiria o roteiro voltado para o aniquilamento moral do acusado.

Até ações flagrantemente ilegais, como a visita de integrantes do MP à clínica na qual se tratava a esposa do almirante, que sofre de Alzheimer, com o objetivo de, através da violação do segredo médico, comprovar sua enfermidade, foram praticadas. Até que, ao ver a filha também injustamente condenada a 14 anos, Othon, tomado pela revolta, tentou o suicídio, na cela em que se encontrava, usando cadarços de uma bermuda. Acabou salvo pela pronta intervenção de um oficial que a tudo assistira pelo circuito interno de imagens.

Depois de mais de dois anos preso, Othon, que agora tem a chance de cuidar de sua saúde e de sua esposa, continua trabalhando pelo Brasil. E não resta dúvida de que ele tem lugar cativo na história. Já seus algozes, como o justiceiro Marcelo Bretas, com todo seu deslumbramento por ser adorado por globais,  parlamentares da esquerda que a direita gosta, como apontaria Brizola, e os procuradores fascistas do Ministério Público se não forem condenados ao esquecimento pela posteridade – pois são figuras medíocres-, serão lembrados como inimigos do povo brasileiro.

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Wadih Damous – deputado federal e ex-presidente da OAB