“Chegou a vez do Padilha fazer o sacrifício”, diz peemedebista ao DCM. Por Joaquim de Carvalho

Atualizado em 3 de março de 2017 às 15:40
"Mano, você vai por ali que eu vou por aqui, firmeza?"
“Mano, você vai por ali que eu vou por aqui, firmeza?”

 

Quando José Yunes contou à Procuradoria da República uma versão sobre o dinheiro que a Odebrecht liberou a pedido de Michel Temer, seu amigo de 40 anos, a primeira reação de quem acompanha a política foi: agora, esse governo corrupto cai.

No mesmo dia, uma fonte que tenho no PMDB me mandou um WhatsApp com a mensagem: “o José Yunes não faria uma coisas dessas sem combinar com o Michel.” Como assim? “Eles vão jogar a culpa no Eliseu Padilha, e ele vai pagar essa conta sozinho.”

A relação de Michel Temer com Eliseu Padilha é muito antiga. No governo de Fernando Henrique Cardoso, Michel Temer era presidente da Câmara e pressionou o então presidente para que Eliseu Padilha fosse nomeado ministro dos Transportes.

Era uma troca implícita. O PMDB de Temer queria o Ministério dos Transportes depois que evitou a instalação de uma CPI para investigar o escândalo da compra de votos para aprovar a emenda da reeleição e, além disso, tinha uma bancada que podia aprovar ou barras as reformas da Constituição. Fernando Henrique chegou a desconfiar:

“O PMDB entrou no nível de chantagem (…) Michel Temer um pouco atordoado, mas também participando, parece que ele quer nomear esse rapaz, Padilha, por quem tenho simpatia, mas parece está havendo aí um lobby muito forte, e isso já torna a nomeação mais perigosa”, disse Fernando Henrique Cardoso, em gravação feita na época, agora revelada em seu Diários da Presidência.

Apesar de desconfiado, Fernando Henrique cedeu à pressão e nomeou Eliseu Padilha, exatamente como Geddel Vieira Lima, então líder do PMDB, havia anunciado aos jornais, antes mesmo da decisão do presidente da República.

“A relação entre Michel, Padilha e Geddel é antiga e muito mais forte do que qualquer um pode imaginar”, disse a fonte do PMDB.

E o Yunes faz o jogo de Michel Temer.

“Você acha que ele entregaria o Michel, depois iria visitar o Michel no Palácio do Planalto e a GloboNews noticiaria essa visita assim, numa boa? Foi tudo combinado. Chegou a vez do Eliseu fazer o seu sacrifício”, disse a fonte do PMDB.

Para o cidadão comum, que usa metrô ou trem da Central do Brasil todos os dias, vai ao trabalho de Uber ou táxi ou enfrenta horas de congestionamento no próprio carro, é difícil entender essa lógica, que é a mesma lógica de quadrilha.

Há vinte anos, o então governador do Rio de Janeiro, Marcelo Alencar, chamou o delegado Hélio Luz para chefiar a polícia civil e aliviar a crise de segurança no Estado, com a população assustada em razão de muitos sequestros.

Hélio Luz chamou alguns policiais que estavam afastados em razão de denúncias de corrupção e abuso de poder, e formou o grupo Astra. Eram policiais bons de serviço, mas com patrimônio muito acima do que o salário podia pagar.

“Eu entreguei a eles uma lista com dez sequestradores e disse: quero que vocês prendam esses caras. Vocês terão liberdade para agir. Se fizerem algo errado, e eu não souber, tudo bem. Agora, se chegar até mim, tomarei providências.”

O primeiro da lista era um bandido conhecido como Uê, e ele foi preso alguns dias depois. Fruto de muita investigação? Nada.

“Uma investigadora que fazia parte do grupo Astra tocou a campainha de um apartamento e disse para o Uê. A casa caiu. Vamos embora”, me disse Hélio Luz dois anos depois, quando ele era deputado estadual pelo PT no Rio de Janeiro.

Para Hélio Luz, a prisão de Uê foi combinada. Os policiais corruptos tinham reconquistado espaço, e o preço a pagar era colocar na cadeia gente como Uê, com quem esses mesmos policiais mantinham relações. Para Uê, tinha chegado a hora.

Quem está no crime sabe que esse dia pode chegar.

Para Eliseu Padilha, o ministro que estava na linha de frente da reforma da previdência, o dia do sacrifício também chegou.