Como a crise econômica está castigando o futebol grego

Atualizado em 25 de março de 2013 às 21:40

Estádios vazios, times arruinados, salários atrasados: a vida está bem complicada.

Sem torcida e sem craques
Sem torcida e sem craques

O texto abaixo foi publicado, originamente, no site alemão DW.

Orçamentos reduzidos, atrasos de salário e estádios vazios. O futebol grego, que já teve estrelas como Rivaldo e Cissé, sente com força os problemas financeiros do país. Mas há quem veja nisso uma oportunidade.

Na lista de clubes licenciados entregue pela Federação Grega de Futebol à Uefa em junho do ano passado, chamou a atenção a ausência de um nome: o AEK Atenas. Devido a problemas financeiros, o clube, nove vezes campeão grego, foi impedido de renovar sua licença para participar da Liga Europa e foi substituído pelo modesto Asteras Tripolis na atual temporada europeia.

A crise da dívida grega fez, assim, sua primeira vítima no futebol local. “Temos uma dívida de 35 milhões de euros. Dessa quantia, 23 milhões pertencem ao Estado”, declarou na época o presidente do clube, Andreas Dimitrelos. “Foi um dia negro na história do AEK.”

Mas o AEK Atenas, do brasileiro Roger Guerreiro (ex-Flamengo), não é exceção na Grécia. Além do tradicional clube da capital grega, também equipes como Aris Thessaloniki, Panionios Atenas, OFI Creta, PAS Giannina e AO Kerkyra foram de encontro ao conceito de fair play financeiro da Uefa. E as seis equipes, todas altamente endividadas, sofreram as consequências. Embora a Uefa tenha lhes garantido a participação no Campeonato Grego, cada time só poderá contratar três novos jogadores com mais de 24 anos na atual temporada.

O renomado time ateniense Panathinaikos também não escapou da crise financeira. A participação na fase qualificatória da Liga dos Campeões ficou incerta durante muito tempo. Somente em fins de junho passado, a equipe recebeu o sinal verde da Uefa e pôde respirar aliviada.

Vinte vezes campeão grego, o Panathinaikos foi parar nos jornais de todo o mundo quando foi descoberto que enfrentava dificuldades até para pagar a conta de luz do Estádio Olímpico. Para economizar pelo menos no custo extra dos holofotes, o presidente da operadora do estádio pediu aos responsáveis pelo Campeonato Grego que os jogos do Panathinaikos fossem realizados durante o dia.

Um olhar sobre os gastos de contratação do Campeonato Grego mostra um dos problemas financeiros vividos pelas 16 equipes da Primeira Divisão. Segundo o portal de internet transfermarkt.de, as equipes da liga grega gastaram, até agora na atual temporada, somente 5,7 milhões de euros em novos jogadores. Na temporada 2008/09, os gastos somaram 58,9 milhões de euros.

Rivaldo quando jogava na Grécia
Rivaldo quando jogava na Grécia

Fazendo uma comparação internacional, o impacto da crise fica ainda mais evidente. Na atual temporada, os clubes da primeira divisão da Inglaterra e da Alemanha gastaram, respectivamente, 775,8 milhões e 288,4 milhões de euros em novas contratações. A estatística divulgada pelo jornal esportivo Goal News, no começo da temporada, também não é menos preocupante: o orçamento do Panathinaikos diminuiu 30%, e o do AEK, 65%. O do Panionios chegou a cair mais de 80%.

Ao contrário de outros países, não há investidores nacionais ou estrangeiros em vista que possam atuar como salvadores. A situação é ainda mais grave nas segunda e terceira divisões do futebol grego. Todas as equipes dependem da loteria e da empresa estatal de apostas esportivas Opap, já que estão proibidas de procurar outra fonte de renda.

Desde que os pagamentos dos patrocinadores foram encerrados devido aos constantes tumultos no final da temporada 2010/11 do Campeonato Grego, as equipes da segunda e terceira divisões viram-se incapazes de arcar com os custos básicos.

Assim, por exemplo, foi feito seguro para os jogadores apenas para os jogos do campeonato, mas não para os treinamentos. Somente quando os jogadores entraram em greve, houve um acordo entre a federação e o sindicato.

Quando um clube se encontra em dificuldades, geralmente os primeiros a sentirem as consequências são os jogadores. A falta de pagamento de salário não é novidade no futebol grego. Mas com a crise da dívida, o problema cresceu. Segundo a associação internacional de jogadores FIFPro, dois terços dos jogadores gregos recebem salários com atraso. Muitos têm de esperar até mesmo mais de seis meses.

Alguns jogadores parecem ter descoberto nas apostas uma lucrativa fonte de renda. O futebol grego também foi abalado por um escândalo no setor. Após o fim da temporada 2010/11, as equipes do Olympiakos Volou e AO Kavala foram automaticamente rebaixadas devido ao envolvimento em manipulação de resultados.

Também a qualidade técnica do campeonato sofre com a crise. Somente no período de transferências no início de 2013, quatro jogadores da seleção grega deixaram o país: Vasilis Torosidis (para o Roma), Nikos Spyropoulos (Chievo Verona), Lazaros Christodoulopoulos (Bologna) e Loukas Vyntra (Levante).

A ida de jogadores gregos para o exterior não é necessariamente uma novidade, mas sim a partida deles para tentar a sorte em países do segundo escalão do futebol mundial, como Rússia, Ucrânia, Romênia, Hungria, Azerbaijão, Bulgária, Eslovênia e Emirados Árabes Unidos. Além disso, o aumento dos impostos na Grécia fez com que jogadores estrangeiros não pudessem ser mais contratados ou tomados por empréstimo. Foi-se o tempo em que estrelas internacionais como Djibril Cissé, Gilberto Silva, Sidney Govou, Rivaldo ou Yaya Touré enriqueciam a liga grega.

Rivaldo com a camisa do Olympiakos em 2006

Seja com ou sem estrelas, a maioria dos fãs não consegue, de qualquer maneira, pagar os preços dos ingressos e acaba ficando longe dos estádios. Isso, por sua vez, traz menos dinheiro para os cofres das equipes – um círculo vicioso, difícil de ser interrompido. Embora os clubes sempre tenham lidado com públicos baixos, a média costumava ser maior do que a da atual temporada. Em 2008/09, a média nos estádios era de 7.534 espectadores por jogo – atualmente, a cifra é de 4.653.

A crise, no entanto, também pode trazer um potencial de desenvolvimento para o futebol grego. O fato de muitos clubes terem pouco dinheiro disponível para contratações abre a possibilidade de apostar, agora, cada vez mais em jovens talentos. Recentemente, o treinador da seleção grega, o português Fernando Santos, defendeu a promoção dos jovens. Num congresso internacional de futebol, no final de janeiro em Atenas, ele sugeriu, entre outras medidas, o estabelecimento de um campeonato sub-15.

Georgios Sarris, que desde outubro passado preside a Federação Grega de Futebol, tem um projeto para colocar um freio na dívida do futebol nacional – colocar a Liga Grega, a federação e, possivelmente, o Estado como órgãos de controle. Assim, caso um clube não respeite a política financeira, estará sujeito a enfrentar sanções. A prioridade seria o salário dos jogadores.

Resta saber se trata-se apenas de promessa ou se realmente a ideia poderá ser a salvação do futebol grego. De qualquer forma, tanto a vontade quanto a necessidade de mudança existem. Como disse Giannis Moralis, presidente da liga grega: “Sair dessa crise como vencedores depende apenas de nós.