Autor de clássicos como “Passagem para a Índia” e “Um Quarto com Vista”, o romancista inglês britânico E.M. Forster (1879-1970) foi não só um grande escritor como um excelente crítico literário. Os trechos a seguir foram retirados de seu livro “Aspectos do Romance”.
Mr. Forster, muitas pessoas consideram a literatura inglesa a mais perfeita de todas. O senhor concora com tal julgamento?
Preciso encarar uma verdade desagradável e nada patriótica: Não.
Por que?
Nenhum romancista inglês é tão grande quanto Tolstói; quer dizer, nenhum nos apresentou um retrato tão completo da vida do homem, seja em seu lado doméstico ou heroico. Nenhum romancista inglês explorou a alma do homem tão profundamente quando Dostoiévski. E nenhum romancista em parte alguma jamais analisou a consciência moderna com tanto êxito quanto Proust. A poesia inglesa não tem o que temer – destacando-se tanto pela qualidade quanto pela quantidade. Mas a ficção inglesa é menos triunfante: Não contém o que de melhor já se escreveu, e se o negarmos incorremos em provincianismo.
Por falar em provincianismo – quais são seus méritos e desméritos?
O provincianismo não é significativo no que concerne a um escritor, e pode até ser a sua principal fonte de força: só um pedante ou um tolo se queixaria do acento cockney de Defoe ou do sotaque interiorano de Thomas Hardy. Já em um crítico, o provincianismo é um sério defeito. Um crítico não tem direito à estreiteza que é a prerrogativa frequente do artista criador. Ele deve ter uma visão ampla, do contrário não terá nada mais. Embora o romance exerça o direito de um objetivo criado, a crítica não tem tais direitos.
Retomando: O senhor considera a literatura inglesa superestimada?
Eu a considero bastante superestimada. Muitas pequenas residências da ficção inglesa tem sido aclamadas (tais como Cranford ou Jane Eyre), em prejuízo delas mesmas, como importantes edifícios.
O romance Jane Eyre, de Charlotte Brontë, é tido como um dos melhores já escritos. Por que o considera uma “pequena residência da ficção inglesa”?
Pegarei Cranford e Jane Eyre como exeplos. Cada um desses livros está ligado a razões pessoais ou locais. Cranford irradia o espírito das cidades do centro do país, e Jane Eyre é o sonho apaixonado de uma mulher e tanto, mas ainda não desenvolvida. Mas repito; são pequenas residências e não grandes edifícios. Temos de avaliá-los e respeitá-los pelo que são, se os pusermos por um instante em meio às colunatas de Guerra e Paz ou sob as abóbadas de Os irmãos Karamazov.