Defender o direito de Lula se candidatar vai além do PT e do lulismo. Por Luis Felipe Miguel

Atualizado em 11 de janeiro de 2018 às 7:16
Lula. Foto: Ricardo Stuckert/ Instituto Lula

PUBLICADO ORIGINALMENTE NO FACEBOOK DE LUIS FELIPLE MIGUEL

É muitíssimo improvável que Lula não venha a ser condenado no próximo dia 24.

O que tem acontecido em Porto Alegre, assim como em Curitiba, não tem nenhuma proximidade com justiça. Não serve nem como farsa. É um deboche.

No momento em que foi anunciada a data do julgamento, atropelando prazos e bom senso, a coalizão golpista já tinha tomado a decisão de condenar o ex-presidente. Os desembargadores, sem jamais abandonar a empáfia que os caracteriza, cumprem seu papel numa trama na qual são meros peões.

Não há nada que justifique a condenação de Lula. Há muito o que criticar em sua trajetória, mas depois de anos de devassa em sua vida não surgiu nenhuma prova de ilícito. As evidências que abundam no caso de outros, como Aécio Neves, Michel Temer, José Serra ou mesmo o homem que se fantasia de “reserva moral da república”, Fernando Henrique Cardoso, estão simplesmente ausentes no caso de Lula.

Seus acertos e seus erros devem ser submetidos a um julgamento político. O verdadeiro, das urnas, não o julgamento politizado de falsos juízes.

Ao definir que Lula deveria ser impedido de concorrer, a coalizão golpista decidiu apressar o passo no sentido do fechamento do regime. O ex-presidente representa a melhor aposta possível para uma reconstrução pouco traumática de algo que se aproxime da “normalidade democrática”, acomodando interesses e repactuando compromissos. É duvidoso se tal estratégia é correta (eu mesmo julgo que não), mas é seu direito apresentá-la.

Afinal, é disso que se trata: não apoiar ou deixar de apoiar a candidatura do ex-presidente, mas de entender que o veto a ela marca a eleição de 2018 com uma ilegitimidade intransponível.

Tirando Lula do páreo, a coalizão golpista mostra que está disposta a abandonar qualquer fachada de democracia e não se dispõe a negociar nada, nada mesmo, com a maioria do povo brasileiro. Sua bandeira parece ser: “nenhum retrocesso a menos”. Para protegê-la, está pronta a sacrificar qualquer pretensão à legitimação popular de seu mando.

É pouco provável, já disse, que no dia 24 surja um veredito diferente da condenação. Depois disso, talvez – mas só talvez – a reação da sociedade os obrigue a procurar brechas que permitam uma candidatura instável, sub judice, para evitar um confronto maior, mas mantendo Lula frágil e acuado.

Isso não depende de retórica jurídica, de provas, de hermenêutica legal. Não é como se fosse uma disputa na justiça. Depende de mobilização, de capacidade de resposta. É muito mais do que a candidatura de Lula que está em jogo. É se vamos continuar deixando o golpe avançar ou se vamos começar a dar um basta.

Por isso, a defesa intransigente do direito do ex-presidente a se candidatar é muito maior do que o PT e o lulismo. É uma linha divisória entre democracia e golpismo.

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Professor de Ciência Política da UNB, coordenador do Demodê – Grupo de Pesquisa sobre Democracia e Desigualdades.