Doria ganhou uma antena da Oi, mas ele pode porque é rico e vizinho de rico. Por Mauro Donato

Atualizado em 9 de dezembro de 2016 às 8:25

Captura de Tela 2016-12-09 às 09.12.57

 

Inúmeras vezes Lula repete em seus discursos que a elite sempre ficou incomodada ao vê-lo ascender. Que não suporta saber que um nordestino, sem formação e metalúrgico esteja tomando vinho em vez de cachaça barata.

Ter uma adega virou crime, um pecado capital, se o proprietário for Lula. Possuir dois pedalinhos num lago cujas dimensões pouco diferem de algumas piscinas 5 estrelas? “Que absurdo!”, exclama a madame a bordo de sua lancha de 3 milhões de dólares.

O episódio da antena de telefonia instalada nas proximidades do sítio que Lula diz não ser dele – mas muito frequentou – é mais um exemplo para se atentar que, tirando alguns excessos, os discursos do ex-presidente não são apenas demagogia. Não é simples retórica embalada em vitimismo.

Quando questionada a respeito da tal antena vizinha ao sítio de Atibaia, a empresa Oi afirmou que pedidos assim não são tão raros e que muitas vezes são atendidos.

Para ilustrar o que estava falando, relatou exemplos de antenas instaladas junto a localidades descobertas da prestação do serviço, por solicitação da tal elite. Um dos casos prontamente atendidos foi de João Doria.

Em 2012 o futuro prefeito dos paulistanos deu um aperto na Oi para que o condomínio de luxo em Trancoso (BA), no qual possui uma casa, recebesse serviço de telefonia. E tudo saiu a toque de caixa.

“Nosso condomínio acaba de ser inaugurado e dele fazem parte o Ivan Zurita (presidente da Nestlé), Nizan Guanaes, Amilcare Dalevo (dono da Rede TV!), o Ronaldão (Fenômeno), Roberto Carlos (cantor), Dody Sirena e eu, entre outros empresários e personalidades que estão completamente sem telefone no condomínio”, escreveu Doria em um email para James Meaney, diretor de operações da Oi na ocasião.

Em menos de 20 minutos o e-mail já estava na caixa de entrada de um técnico da diretoria de Implantação para a Bahia com a ordem explícita: “Entender e resolver imediatamente”. Em 15 dias o condomínio passou a ter telefone e internet (o prazo normal gira em torno de seis meses).

João Doria execerceu pressão sobre um diretor da Oi que havia sido seu entrevistado no programa Show Business. Utilizou-se de seu status de ‘personalidade’ e também se fez valer da saia justa na qual ficaria a empresa depois de desfilar propaganda disfarçada de entrevista como eram aqueles programas bajuladores do novo prefeito.

O email de Doria não deixa dúvidas. Eram ‘personalidades’, ele incluso. Daí, tudo pode, tudo precisa ser feito, atendido. Onde já se viu alguém como Dody Sirena ficar sem telefone? E alguém importante como Amilcare Dalevo, então?

Onde já se viu ficarem na fila? “Que absurdo”, exclamaria a madame em sua cobertura na Vieira Souto. Sim, eram personalidades. Mas Lula é Lula, não pode. Ele era apenas o presidente da República, queria falar no celular com quem? Para que esse luxo todo?

Doria apela a seu status para atacar mas em sua defesa alega que a instalação não beneficiou apenas a ele, mas também ‘funcionários e prestadores de serviço que antes não tinham acesso à telefonia’. Já a antena de Atibaia…

Não se está aqui a defender incondicionalmente as escorregadas de Lula. Mas quando ele é um dos benefeciários de qualquer coisa, o assunto é tratado como crime. Mesmo sendo uma situação idêntica e corriqueira entre os endinheirados. É sobre isso que se deve debruçar.

Há sim uma rejeição da elite em ver Lula não morar em um barraco. Há sim um desconforto da elite ao ver a filha da empregada doméstica frequentar a faculdade. É inegável.

Não é possível fechar os olhos para as motivações do golpe que guilhotinou Dilma/Lula/PT. Uma sociedade mais justa não estava nos planos, nunca esteve.

A Odebrecht afirmou que realizou pagamento em dinheiro vivo, cash, bufunfa, via caixa dois, para as campanhas de 2010 e 2014 do governador Geraldo Alckmin (PSDB).

Segundo a delação premiada acordada com a Operação Lava Jato, R$ 2 milhões em espécie foram entregues ao irmão da primeira-dama, dona Lu Alckmin. Mas Alckmin é o ‘santo’. Lula sempre foi o demônio.

Entre os poderosos, aqueles que estão, sempre estiveram e querem continuar acima da lei, brecar a Lava Jato era fundamental. E para a casta branca e rica, dona de empresas e casas bacanas, que foi para as ruas pintada de verde e amarelo, o zé povinho é uma praga que precisa ser mantida longe e paga com salários baixos.

Os avanços sociais nos dois mandatos Lula e mais um de Dilma são acanhados mas superam qualquer outro período. Isso fez com que a elite se sentisse ameaçada e expusesse seu ranço.

O caso do condomínio de Trancoso ilustra que os privilégios que os ricos condenam em Lula (ou em qualquer pessoa menos favorecida) são os mesmos que conferem para si. Isso não é elitismo?