“Em abril, lançamos a candidatura do Lula. Não tem como tirá-lo do jogo”: Lindbergh Farias fala ao DCM

Atualizado em 4 de março de 2017 às 9:02
Lula e Lindbergh
Lula e Lindbergh

 

POR ROBERTO DE MARTIN, jornalista, ator, mineiro de Matias Barbosa e pai da Eva.

 

O senador Lindbergh Farias, do PT do Rio de Janeiro, quer Lula já. “Eu defendi isso e praticamente não tem ninguém contra. Antecipar a candidatura do Lula para abril, até porque a gente não sabe se esse governo Temer acaba”, disse ao DCM.

“Temos muitos fatores imponderáveis. Uma delação do Eduardo Cunha, por exemplo. O povo não aceita eleições indiretas”.

Lidbergh criticou duramente a liberação da bancada petista para apoiar Eunício Oliveira, candidato de Temer, para presidente do Senado.

Para ele, alguns membros do partido não entendem o recado das ruas, tampouco o significado negativo da atitude, buscando uma conciliação com quem vem “rasgando a Constituição” desde a retirada de Dilma do poder. “Há uma parte do PT muito acomodada, burocratizada, que se adaptou a uma política de conciliação exagerada”, afirma.

A seguir, sua entrevista:

DCM: A ideia do PT é lançar já a candidatura de Lula?

Lindbergh Farias: Eu defendi isso e praticamente não tem ninguém contra. Antecipar a candidatura do Lula para abril, até porque a gente não sabe se esse governo Temer acaba. Temos muitos fatores imponderáveis. Uma delação do Eduardo Cunha, por exemplo.

E se o governo Temer cair e as eleições forem indiretas, com Rodrigo Maia e Eunício Oliveira comandando o Congresso? 

Eles não vão conseguir fazer isso. O povo não aceita eleições indiretas.

No TSE, se Temer for afastado pela chapa, tem um debate que diz que a eleição seria direta, além de outras PECs que tramitam no Congresso. Claro que a ideia deles é levar o Temer até 2018, mas pode ser que não consigam, que o governo desmonte. Eu acho que eles vão ter muita dificuldade de colocar eleição indireta. Acho que não é “Lula 2018”, é “Lula agora”. Com um plano para tirar o Brasil da crise, apresentando propostas, enfim, fazendo esse lançamento em abril, maio, o mais rápido possível.

Por que o PSDB tem cada vez mais espaço no governo Temer?

Os amiguinhos do Temer são muito barra pesada. O Cunha está preso, Geddel saiu, Padilha está todo enrolado, Moreira Franco também, Jucá. O Temer, primeiro, está refém da mídia, da burguesia, e segundo do PSDB, porque em torno do PMDB não há figuras para tocar o barco.

Ele tenta ser aceito com essa aliança com o PSDB, mas eu diria a você o seguinte: se tem um partido que perdeu com esse impeachment, com o golpe, esse partido foi o PSDB, porque eles estavam com 35% dos votos em 2015, com o Aécio, agora têm menos de 10%, atrás do Bolsonaro.

Como vê um eventual crescimento do Bolsonaro?

Acho que temos que ter cuidado. Ele teria muitas dificuldades numa campanha porque fala bastante besteira, como por exemplo que o salário da mulher tem que ser menor etc, mas o crescimento dele a gente não pode subestimar, até porque tem uma base real, com um discurso autoritário, cada vez maior no País. A lógica da criminalização da política como um todo.

E o aumento do desemprego, aumento da crise, convulsão social – veja o que aconteceu no Espírito Santo, o que está acontecendo no Rio de Janeiro – isso tudo é um terreno fértil para o discurso da ordem, autoridade. Tem uma parte da sociedade brasileira que hoje, se pudesse, fechava o Congresso Nacional e iria por um caminho autoritário. A tendência é que tenha mais espaço para esse tipo de discurso em 2017.

Acho, inclusive, que o PSDB foi irresponsável porque foi àquelas passeatas de verde e amarelo e em nenhum momento demarcou campo contra aqueles que defendiam intervenção militar. E acabou que essa turma comeu a base social do próprio PSDB, porque o Bolsonaro cresceu em cima dos eleitores de Aécio, Alckmin etc.

E a indicação de Aloysio Nunes para o Ministério das Relações Exteriores?

A política externa do governo Temer é um desastre completo. Eles atacaram a integração latino americana, fragilizaram o Mercosul, com a tese de acabar com a união aduaneira. Se acabassem com ela, o Mercosul iria virar uma espécie de “Alca-Sul”, ou seja, os Estados Unidos iam fazer um acordo de livre-comércio com o Paraguai e pronto, valeria para toda a área do Mercosul.

Mas no meio de tudo isso houve um desastre para eles que foi a vitória do Donald Trump. O que o governo Temer era uma aproximação estratégica dos Estados Unidos, e a política do Trump muda tudo. Até rever o Nafta, que é um acordo de livre-comércio com o México, ele quer, imagina fazer um acordo de livre-comércio com países da América do Sul. É um fracasso total.

Então, a entrada do Aloysio Nunes, ao meu ver, significa um Itamaraty mais do confronto do que da diplomacia. No momento em que tem uma vitória do Trump o que deveria ser feito? Aprofundar a integração entre os países da América do Sul e não o contrário.

O Itamaraty sob o comando de Aloysio Nunes Ferreira vai ser, portanto, mais ideológico, no pior sentido da palavra. Vai fomentar mais divisão na parte sul da América, menos sobriedade, menos preocupação com o que é melhor para as relações comerciais com o Brasil, e um Itamaraty que vai estar em confronto permanente com a Venezuela, Equador, Bolívia. Eu acho que, infelizmente, o Aloysio Nunes como ministro das Relações Exteriores significa isso.

Alexandre de Moraes no STF vai ajudar a estancar a sangria do governo?

Eu fiz um questionamento na sabatina pedindo para ele se declarar impedido em relação à Lava-Jato e o fato de ele ser revisor da operação. Não fez porque não pôde, já que quem o indicou pensou na atuação dele na Lava-Jato. É isso.

O governo pelo qual ele foi indicado tem cinco ministros e o próprio presidente da República aparecendo nas delações premiadas. Ele conseguiu ser aprovado no Senado, mas não resolveu o problema com a sociedade, porque as pessoas estão vendo essa indicação como mais um movimento para blindar a cúpula do PSDB e do PMDB.

É a velha história do Romero Jucá, que falava em estancar a sangria, fazer um acordo com todo mundo, inclusive com o Supremo. Está havendo uma série de ações nesse sentido. A nomeação de Moreira Franco para um ministério, agora a transferência de delegados da Polícia Federal, eles estão interferindo na PF.

O Temer indicou ele para tentar se safar. Lembra daquela gravação do Jucá? “Fazer um acerto entre todo mundo, com o Supremo, delimitar onde está”. Aquela gravação é o que o Temer está fazendo. É isso mesmo. É um roteiro.

Por que uma ala do PT está contra o “discurso do golpe”? 

Acho que falta a compreensão por parte do PT do que significava a simbologia de estarmos juntos na chapa com quem apoiou o golpe. E não só isso. Estarmos juntos com quem está rasgando a Constituição para retirar direitos dos trabalhadores.

A gente tem que entender que o golpe não foi um golpe que aconteceu só com o afastamento da Dilma. O golpe está em curso. Ele começa com o afastamento dela, mas o que eles querem é restaurar o neoliberalismo, retirar direitos dos trabalhadores, entregar o patrimônio público nacional. Então, num momento como esse é muito mais importante a gente preservar nossa posição, apostar tudo nas mobilizações sociais para 2017, do que criar uma grande confusão em nossa base social, nos movimentos sociais, para estar junto com a turma que está fazendo tudo isso com o País.

Mas eu acho que esse episódio teve uma lição muito grande, porque houve um levante, uma rebelião da base petista e da esquerda brasileira, que disse para os seus parlamentares: nós não aceitamos apoio a golpista. Foi muito forte o movimento de baixo para cima. E isso levou à mudança de posição na Câmara dos Deputados, e aqui no Senado, infelizmente, a gente não conseguiu fechar questão. Mas tivemos seis votos contra o Eunício Oliveira e quatro votos favoráveis a ele.

Diante disso, eu acho que a esquerda do PT vai ter que definir um pouco o seu rumo para o próximo período. Há uma disputa em curso no Congresso. Há uma parte do PT muito acomodada, burocratizada, que se adaptou muito a uma política de conciliação exagerada.

Fisiologismo por cargos na Mesa Diretora?

Cargos na Mesa, mas mais do que isso. Um pessoal que não entende que neste momento nós temos que fazer uma luta, um enfrentamento permanente contra esses que deram um golpe no País, e apresentar uma alternativa, que eu acho que é o presidente Lula, mas com outro programa. Chegou a hora de entrar no debate sobre a tributação de grandes fortunas, porque nesse país os mais ricos não contribuem. Quem paga imposto no Brasil é trabalhador. Chegou o momento de desmontarmos o sistema da dívida. São 500 bilhões por ano em juros.

Eu acho que quando a gente olha para trás fica claro que fizemos uma política excessivamente de conciliação. Um exemplo é que não fizemos nada em relação à democratização dos meios de comunicação. Era para ter feito.

Por que não fez?

Por acreditar demais numa política de conciliação de classes, como se fosse possível juntar burguesia e trabalhadores. Não. Nós temos um lado que são os trabalhadores. Esse próximo período, se o Lula for eleito novamente, a gente só vai ter condições de fazer um governo de reformas profundas se comprarmos algumas brigas. Por isso eu falei do sistema tributário, dos juros. Temos a maior taxa de juros do mundo.

Então, por trás desse debate do PT tem também essa visão, de uns que acham que fomos expulsos do governo, mas que temos, novamente, que correr para fazer uma política de conciliação com a burguesia, quando a burguesia, na verdade, nos esfaqueou.

Quem são esses setores com quem eles querem fazer uma política de conciliação? Alguns membros do PT ficam atrás dessa ilusão. A gente tem é que formar uma frente popular nesse país, com um programa bem claro, levantar o povo, o trabalhador, contra essa retirada de direitos em curso. Nosso caminho é aprofundar as relações com os trabalhadores. Não é ficar acenando para setores da Fiesp, como se isso fosse nos dar novamente uma outra política de alianças.

Portanto, há um debate na esquerda e dentro do PT sobre que rumos tomarmos. Só que acho que tem uma coisa muito boa. Essa base do PT que se levantou, se rebelou nesse processo contra o apoio a quem participou do golpe contra a Dilma, pode fazer mudanças também. Esse pessoal está dizendo para dentro do PT: Chega. Nós queremos um outro PT, o PT das origens, o PT que tem capacidade de luta, o PT que não esteja adormecido e burocratizado nas estruturas, nos cargos.

lindbergh farias

 

Chega-se a pensar em expulsão ou punição a alguns parlamentares que apoiarem candidatos do governo Temer?

Não. O debate não está aí. Estamos começando o debate dentro do próximo congresso do PT. Acho que não é o caso de expulsão de ninguém. O debate é na política. O que a militância não está disposta é lutar nas ruas, mas fazer aqui dentro pequenos acordos. Isso desmoraliza a militância.

Qual é a justificativa, por exemplo, do senador José Pimentel apoiar o Eunício Oliveira?

Isso eu preferiria que você perguntasse para ele.

Não comentaram dentro de partido em algum momento?

Eu acho que seria bom vocês conversarem com ele. A justificativa de que não pode se isolar aqui dentro, no Senado, e que é importante estar na Mesa. Mas na verdade não é a Mesa que fecha a pauta. Quem decide o que pautar é o presidente, às vezes escutando os líderes. Então, do que adianta isso em relação à votação de projetos? A gente não ganha nenhum voto estando na Mesa.

Como o vê a entrevista do senador Humberto Costa para a Veja?

Eu prefiro não comentar, eu queria não comentar isso. O meu silêncio já fala muito.

O senhor daria uma entrevista para a Veja?

Não. Não daria.

Quem governa o Brasil?

O sistema financeiro. Na verdade, esse governo Temer é completamente fraco, o que houve foi uma aliança entre parlamentares deste grupo que está no governo Temer, de políticos que queriam fugir da Lava Jato, fizeram aliança com o mercado financeiro, que tinha a suas posições bem definidas, e foi feito um acordo: “eu tento me livrar aqui,  ganho esse governo, e vou aplicar a política do mercado financeiro”. A política deles é muito clara. Acenaram desde a Ponte para o Futuro um cenário que era o seguinte: “olha, o país está em crise econômica e as empresas estão em dificuldade. Nós temos um plano para você, que é apertar ao máximo o trabalhador, reduzir salário, retirar direitos e também os fundos públicos, o orçamento”. Porque hoje mais de 30% do orçamento da União é desviado para pagar juros para o rentismo, ou seja, sistema financeiro, duzentas grandes empresas que aplicam em títulos da dívida pública, que ganham 8% de juros reais por ano. Para que investir na produção se você tem 8% de juros reais por ano?

Como reagir hoje ao golpe?

Acho que em 2017 a nossa grande questão é mobilizar o povo. Nós parlamentares não conseguiremos barrar nada, o nosso trabalho tem que ser mais para denunciar o que está acontecendo, tentar ajudar nas mobilizações, porque esse ano será de graves crises. A economia não vai melhorar, porque não tem governo, não tem uma proposta para sair da crise. Teremos um agravamento da crise social, da crise política.

Nós que defendemos um Brasil mais justo só temos uma saída: colocar o povo nas ruas. Eu digo isso e peço ajuda às pessoas, porque se isso não acontecer, eles vão passar o trator por cima, vão entregar tudo. E eu acho que nós temos condição de colocar o povo nas ruas, principalmente em relação à reforma da Previdência, porque é muito concreta, afeta diretamente o trabalhador, O cara faz a conta. Portanto, termos um 2017 melhor ou pior do que o ano passado, vai depender da nossa capacidade de mobilizar a sociedade.

Acha possível uma aliança suprapartidária, pensando inclusive nessas discordâncias internas do PT e de outros partidos também, como o próprio PMDB?

Claro que eu vejo. Acho que primeiro nós temos que juntar os movimentos sociais, as forças de oposição, PT, PC do B, Psol, PDT com o Ciro Gomes, Requião do PMDB, e outras pessoas dentro desse processo. Acho que essa é a aliança, de um campo popular, de quem defende um projeto de desenvolvimento nacional, não voltar a fazer uma aliança com determinados setores do PMDB, porque essa turma, na verdade, tem um projeto oposto ao nosso.

O senhor foi absolvido pelo STF na Lava Jato?

Sim. O problema é o desgaste disso. A imprensa, quando aparece um nome, principalmente do PT, é seletiva. Eles protegem tudo do PSDB, os nomes deles, é uma coisa impressionante. Quando é do PT eles vão para cima. E quando mostra que determinado político não tem nada a ver com a questão, o espaço também é muito pequeno. Mas o fato é que eu sempre tive plena consciência.

Tem gente que está na política porque defende ideias. Eu comecei muito garoto, ainda como líder estudantil, defendendo um Brasil e um mundo diferente. Continuo lutando por isso. Então, às vezes você fica chateado de ser colocado num balaio com um bocado de gente que é patrimonialista. Infelizmente, esse Congresso tem gente que é lobista de interesses privados. A bancada dos bancos aqui é gigantesca.

Está tudo dominado, senador?

O Congresso? Claro. Por isso eu digo que a unidade que tem no Parlamento a favor do governo Temer é da burguesia, que se expressa aqui. Então, o campo popular no Congresso, de defesa dos trabalhadores, é minoria atualmente. Eu sabia que esse processo contra mim não teria nada, mas eu lamento que a cobertura da imprensa não seja a mesma, caso fosse um político do PSDB, por exemplo.

Na hora que aparece um nome do PT eles tentam desmoralizar, mas na hora que você prova que não tem nada, o espaço, infelizmente, é muito pequenininho. Mas ainda bem que nós temos as redes sociais hoje em dia, porque imagina se não tivéssemos? Imagina se não houvesse o DCM, por exemplo, e outros sites.

A gente cresceu, vocês cresceram. Isso aqui tem uma repercussão grande. A Globo não me entrevista porque eu falo mal dela, nem eu fico preocupado em dar entrevista para ela, mas eu sinto que às vezes a gente faz gravação aqui que tem um alcance muito maior do que com eles, da grande imprensa. Nós estamos equilibrando esse jogo. É claro que a discussão da democratização da mídia continua colocada como questão central, mas o avanço dos últimos anos foi muito importante.

Por que o PT não avançou na regulamentação da mídia no governo Lula?

Hoje quando se conversa isso com o Lula, ele concorda. Era uma ilusão muito grande de uma política de conciliação, que a gente viu no que deu: houve um golpe. Porque a burguesia brasileira não tem um projeto nacional, é uma burguesia que não tem compromisso com a democracia, não tem elaboração intelectual. Fico cada vez mais impressionado com a baixa capacidade desses setores.

Se o Lula for condenado, o PT tem outra opção para 2018?

Eles vão tentar tirar o Lula do jogo, mas não tem como.

Tiraram a Dilma, senador…

Eu espero que não aconteça isso com o Lula. Tem delegado da PF falando que perdeu o “timing”. Eu acho que fica cada vez mais difícil, porque eles começaram uma cruzada contra o Lula, mas tivemos vários depoimentos de testemunhas que desfazem o que eles falaram. O Lula está liderando as pesquisas, nas últimas subiu muito, eles vão ter muitas dificuldades. Vai ter um impacto tão grande, que é difícil, por exemplo, explicar isso no exterior.

Porque, internacionalmente, esse golpe contra a Dilma foi um desastre para os apoiadores desse governo. Tirar o Lula do jogo nesse momento, sem crime, sem nada, vai ter uma repercussão muito grande. Seria o segundo grande momento do golpe. Não está tão simples para eles. Por isso eu acho que temos de antecipar a candidatura do Lula, viajar o País. Nós seguiremos dificultando para eles.