Então Balta Nunes, o infiltrado do Exército no “Fora Temer”, não foi preso porque estava bem vestido? Por Donato

Atualizado em 22 de setembro de 2017 às 23:27

 

Amigo leitor, estamos vivenciando um estado de exceção, que é aquele oposto ao estado de direito. Afinal, o desfile de arbitrariedades e cassação de direitos no caso dos jovens detidos em uma emboscada planejada por um capitão do Exército antes de um ato Fora Temer no ano passado é de encher os olhos. De lágrimas.

Como se todo o episódio já não fosse de um surrealismo inenarrável, o julgamento marcado para esta sexta-feira foi mais um show de demonstração de força bruta e psicológica das autoridades em cima dos acusados, dos familiares e dos amigos apoiadores.

Logo de cara o aparato policial na porta do Fórum Criminal da Barra Funda era muito superior ao habitual, com dois caminhões da Tropa de Choque ostensivamente ao lado da porta.

Para que isso? O que pensavam enfrentar, mísseis da Coréia do Norte? Um clima de terrorismo instaurado com a finalidade de intimidar manifestantes – todos adolescentes – que foram apenas prestar solidariedade.

A agressividade de impedir pais e mães dos acusados (todos muito jovens que nada fizeram além de se reunirem para irem juntos a uma manifestação) de entrarem no Fórum foi de uma brutalidade atroz. Inicialmente nem mesmo testemunhas de defesa estavam sendo autorizadas a entrar. Em que situação isso ocorre? Sob qual pretexto? Apenas com a chegada do deputado federal Paulo Teixeira foi que algumas mães conseguiram passar do portão.

A suspensão da audiência de hoje foi uma mostra de que a estratégia do estado é a de desgastar os jovens e suas redes de apoio. Quando não há muita consistência na acusação – e neste caso não há nenhuma – o que se faz? Cria-se um circo e força-se uma lentidão nos procedimentos por si mesmos já lentos. A intenção é ir minando a resistência do(s) acusado(s). Implanta-se uma guerra psicológica.

A ausência de uma das testemunhas de acusação, um dos policiais envolvidos no episódio e que prestaria depoimento, fez com que a audiência fosse suspensa e remarcada para 10 de novembro. Nenhuma testemunha de defesa nem os acusados foram ouvidos.

Na saída, Gabriel Cunha, um dos estudantes acusados, demonstrava um sentimento de alívio e indignação ao mesmo tempo.

“Nenhum dos PMs sabe contar uma história coerente. A versão de um não bate com a do outro. Falam que a denúncia partiu de um ‘transeunte’ mas a descrição dessa pessoa varia de um depoente para outro. Um outro chegou a dizer que foi feita por telefone. E por que só esse tanto de policiais como testemunha? Haviam dezenas no dia, é só ver os vídeos. Eles também se contradizem com relação a isso a todo momento, nem o número de viaturas envolvidas eles coincidiram”, disse Gabriel ao DCM.

Quando perguntado sobre William Pina Botelho, o capitão do Exército que se apresentava pelo codinome Balta Nunes e armou toda a operação (inclusive assediando meninas menores de idade) Gabriel ficou irritado: “Ficaram desviando da pergunta e diziam que só tomaram conhecimento depois, pela imprensa.”

A declaração de Gabriel corrobora o que já havia dito anteriormente ao DCM o deputado João Paulo Rillo, também presente ao Fórum. Ele acompanhou o depoimento do primeiro policial quase sem querer. Ao ser informado que o caso está sob segredo de Justiça precisou se retirar e veio falar com a reportagem.

“Percebi muita contradição no depoimento do policial. Ele não consegue justificar a denúncia, como ela foi feita, nem como ele chegou até lá. Foi uma armação e é um absurdo o que está acontecendo. O policial reconheceu que o capitão do Exército estava lá mas afirmou só ter tomado conhecimento de quem era posteriormente, pela mídia. Questionado do por que não ter detido Balta Nunes, declarou que foi porque ele estava vestido de forma diferente. Seria cômico se não fosse trágico.”

De fato, se a PM atribuir a si mesma o papel de consutora de moda, estamos perdidos. Será ela a decidir quem vai preso e quem será solto mediante as roupas?

Questionado se vê chances de os jovens serem condenados, o deputado não é otimista:

“Num estado de normalidade, eu diria que não há nenhuma chance pois esses garotos não fizeram nada. Mas o país vive um período de anormalidade jurídica então é necessário vigiar o processo”, declarou Rillo.

O adiamento poderá prejudicar ainda mais os jovens? O deputado Paulo Teixeira discorda. Ele acredita que o tempo joga a favor. “Vai haver uma campanha nacional importante em defesa desses jovens. E eles são vítimas.”

Todos sabemos disso, deputado. Falta combinar com os russos.