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“Não quero mortes em meu nome”, diz sobrevivente do Holocausto que assinou carta aberta sobre Gaza

 

Nascida em 1923, em Hamburgo, na Alemanha, Edith Bell é um dos sobreviventes do Holocausto que assinaram uma carta aberta publicada no jornal The New York Times no último fim de semana. O documento critica duramente a atual ofensiva de Israel na Faixa de Gaza, chamando-a de “genocídio”.

Bell sobreviveu aos campos de concentração de Theresienstadt e Auschwitz, entre outros. Após a Segunda Guerra Mundial, emigrou para Israel, e, depois, mudou-se para os EUA em 1954, onde vive até hoje. Para a alemã, ninguém mais deveria ser tratado da maneira sub-humana como os judeus foram tratados durante o Holocausto.

DW: Por que a senhora decidiu assinar uma carta que critica publicamente Israel e os Estados Unidos de forma tão severa? 

Edith Bell: Estou muito chateada com o que vem acontecendo em Israel e em Gaza. E estou convencida de que o poder militar não resolve nenhum desses problemas. Acima de tudo, estou amargurada pelo fato de o Holocausto, meu próprio sofrimento durante a guerra, ser usado para justificar a morte de inocentes.

A senhora faz referência a Eli Wiesel que, através de um anúncio – também no “The New York Times” –, fez uma conexão entre o Hamas e os nazistas e acusou o Hamas de fazer culto aos mortos. Quais são seus argumentos?

Cresci na Alemanha. Meu pai lutou na Primeira Guerra Mundial, a chamada Grande Guerra, que deveria acabar com todas as guerras para sempre. Nós descobrimos que lutas provocam ainda mais lutas. Isso não resolve nada. Fomos tratados como sub-humanos, como o senhor sabe. Lutei grande parte da minha vida por paz e justiça, para evitar que isso aconteça novamente algum dia com alguém, seja um nativo americano, afroamericano, gay ou lésbica, judeu ou árabe.

Por que a senhora acredita que o ataque de Israel a Gaza pode ser chamado de genocídio?

Porque eles matam as pessoas cegamente. Uma população inteira está sendo morta. Meu sobrinho israelense me disse há 20 anos: vocês [americanos] mataram seus índios. Sim, tem razão. Mas duas coisas erradas não formam uma coisa correta.

Há muito furor entre as linhas da carta aberta e em suas respostas. Por quê?

Eu não quero que as pessoas façam essas coisas em meu nome. O dinheiro dos meus impostos é usado para isso. O governo dos EUA parece pensar que o Aipac (o American Israel Public Affairs Committee, que, segundo sua própria descrição, é uma organização lobista pró-Israel) nos representa, mas isso não é verdade. É uma organização que tem muita influência sobre o Congresso dos EUA e que alega representar os judeus americanos. Mas, obviamente, não o faz.

A senhora quer que o governo americano deixe de apoiar Israel?

Sim, exatamente. Eu tenho sido há muito tempo um membro da Women’s International League for Peace and Freedom, e somos a favor de que se acabe com a ocupação ilegal de Gaza e a matança. Defendemos um cessar-fogo, negociações com todas as partes e ajuda humanitária multinacional a Gaza e exigimos que os Estados Unidos e Israel sejam responsabilizados.

A chanceler federal alemã, Angela Merkel, apoia firmemente Israel e seu direito de se defender. Ela deveria mudar sua política?

Esta autodefesa é bastante desproporcional. Israel é a nação mais poderosa do Oriente Médio. Os palestinos em Gaza não têm exército, força aérea, marinha ou armas comparáveis às do lado israelense. A população de Gaza vive num constante estado de sítio. As pessoas foram expulsas de suas casas para campos de refugiados sem água suficiente, comida, cuidados médicos e eletricidade. Agora são até mesmos expulsos dessas acomodações. Para onde eles devem ir?

 

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DW