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Oposição se coloca como juiz, diz professor que previu o golpe de 64

 

Do cientista político Wanderley Guilherme dos Santos, que em 1964 previu em artigo o golpe militar, em entrevista ao Estadão:

 

Qual balanço o senhor faz de 2015, considerando o processo de impeachment, investigações, ruas?

Primeiramente, no médio prazo, não acredito em nenhuma das seguintes coisas: que o Supremo convalide a posição do (presidente da Câmara, Eduardo) Cunha, que o núcleo pró-impedimento consiga 2/3 da Câmara e que sejam capazes de fazer significativos de rua. Enquanto o Supremo Tribunal Federal continuar dando respaldo, não nos resta outra opção senão considerar que nada efetivamente criminoso cometido pelo Judiciário está acontecendo. É impossível dizer qual vai ser o comportamento do PT, PSDB, PMDB daqui a 48 horas. Mesma coisa em relação ao Judiciário, ao Legislativo, ao Executivo. Tratando-se então de um processo de grande envergadura em execução, não parece prudente já falar em saldo. Neste momento, nós estamos em processo de investigação do desempenho da democracia brasileira.

O processo de impeachment representa tentativa de golpe?

A questão desde o início com relação ao problema do golpe é se havia ou há sustentação objetiva de crimes legalmente apurados e estabelecidos que, conforme a Constituição, autorizem o movimento de impedimento. Até agora, isso não se constituiu, não ficou evidente para o público em geral que há um comprometimento da pessoa pública da presidente da República que justificasse um pedido de impedimento. Os parlamentares da oposição têm qualquer direito de se manifestar. Para isso serve a democracia. Uma vez que não há essa base, então essa é uma atitude, obviamente, de violação das regras da democracia.

O fato de o Tribunal de Contas da União ter rejeitado as contas do governo fortalece o argumento pró-impeachment?

O processo decisório do TCU foi contaminado. Não ficou convincente para mim que estariam justificadas as desconsiderações de todos os precedentes, inclusive as do próprio Tribunal de Contas. Precedente não é só do governo, é do tribunal também. Eles são cúmplices ao longo de muitos anos em que aprovaram contas semelhantes. Não podem jogar responsabilidade em apenas um dos lados. Não foi uma decisão racional. Foi contaminada por emoção. O tribunal é um tribunal de assessoria. Ele não rejeitou as contas do governo, apenas não recomendou sua aprovação pelo Congresso, o que já é uma forma de alterar os nexos institucionais reais entre uma coisa e outra.

Nesse contexto do impedimento, a oposição tem desempenhado um papel sadio para nossa democracia?

A oposição tem todo o direito de querer o impedimento da presidente. Agora, por conta de que não é possível fazer mais nada enquanto não for aprovado o impedimento, e com isso se negarem a governar e obstruir o governo sem que esteja provado que existam dados para isso, eles estão se colocando na posição dos juízes e, consequentemente, na medida em que podem, estão impedindo o governo de governar. Isso é antidemocrático. Eles estão violando as regras democráticas por conta de uma ideia que teria que ser. Enquanto isso não acontecer, tudo o mais é ilegítimo? Quem tem que dizer isso é o Supremo. Ao tomar o lugar do Supremo e declarar o governo ilegítimo, eles estão violando a democracia.