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Por que somos indiferentes à morte de negros, ao contrário dos EUA?

Do site do PSOL:

A pequena cidade de Ferguson, com cerca de 21 mil habitantes, no subúrbio de Saint Louis, estado de Missouri, nos EUA, se tornou um grande palco da luta racial desde a morte do jovem negro Michael Brown, de 18 anos, no dia 9 de agosto. Ele foi atingido por seis tiros disparados pelo policial branco Darren Wilson, 28, em plena luz do dia.

O caso gerou revolta, comoção e mobilização popular. A indignação com a morte de Brown ganhou as ruas de Ferguson e depois se ampliou para outras 170 cidades de 37 estados nos Estados Unidos e uma grande repercussão internacional.

Quando parecia que as coisas se acalmariam, na última semana o caso ganhou novos contornos com a decisão da justiça de não indiciar o policial branco que matou um jovem negro desarmado, reativando os protestos populares.

Esse cenário é revelador de quanto o centro do capitalismo é incapaz de resolver suas próprias mazelas, tendo o racismo ainda como grande motor das profundas desigualdades do país, onde a população negra está submetida aos maiores índices de desemprego, violência policial, encarceramento, entre outros dados.

Por isso faz todo o sentido essas mobilizações populares que remetem ao chamado movimento por direitos civis que, entre 1955 e 1968, garantiram conquistas para população negra estadunidense e merecem toda a nossa solidariedade e apoio.

O que isso tem a ver com o Brasil ?

Dados recentes evidenciados pelo Mapa da Violência apontam que o Brasil, em números absolutos, é o país com o maior índice de assassinatos do mundo. Só em 2012 foram 56 mil pessoas, sendo 30 mil jovens entre 15 e 29 anos, destes 77% jovens negros.

O que é curioso em nosso país é que essas mortes não comovem, são naturalizadas e além de tudo contam com mecanismos institucionais que as legitimam como os “autos de resistência” ou “resistência seguida de morte”, onde os agentes da segurança pública alegam estarem em confronto com as pessoas assassinadas e os inquéritos não são levados adiante.

Fruto da pressão dos movimentos sociais, em especial o movimento negro, está para ser votado no Congresso Nacional o Projeto de Lei 4471/2012 que estabelece maior rigor nas investigações nos crimes cometidos por agentes do Estado e enterra os autos de resistência. Sua aprovação depende muito da pressão popular, tendo vista a composição conservadora do Parlamento Brasileiro.

Como mudar esse quadro tendo em vista que a morte negra não comove?

A denúncia do extermínio de jovens negros praticados pela Policia não é uma novidade. Em 1978 um dos estopins das mobilizações que laçaram o Movimento Negro Unificado Contra a Discriminação Racial (MNUCDR), nas escadarias do Teatro Municipal, foi a morte do Robson Silveira da Luz em uma delegacia em Guaianazes, Zona Leste de São Paulo.

Na década de 90, período de aprofundamento do neoliberalismo, aumento do desemprego, aumentos dos chamados cinturões de miséria, produziram um aumento da violência nos territórios periféricos, praticados pela policia muito bem relatado pelo movimento Hip Hop e sua música Rap.

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No Brasil, quando um jovem negro é assassinado, logo se imagina que ele estava envolvido com alguma coisa errada. Ideias de séculos passados, como o racismo científico que estabelecia um fenótipo padrão para os criminosos, ainda são largamente utilizadas pela polícia em nosso país que estabelece o jovem negro como o suspeito padrão.

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A inversão desse quadro só é possível com mudanças estruturais no Estado Brasileiro.

Neste sentido, articulações importantes ocorreram no último período que vêm construindo uma agenda política importante, como as redes de familiares vítimas da violência, o Comitê Contra o Genocídio de São Paulo, a Campanha Reaja na Bahia, o Fonajunes no Espírito Santo, a Marcha Contra o Genocídio e mais recentemente a campanha da Anistia Internacional, entre tantas outras iniciativas.

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A forte polarização do segundo turno das eleições de 2014, a ampliação das bancadas conservadoras e as sinalizações à direita do próximo governo federal apontam para um cenário difícil para as pautas progressistas, o que exigirá uma grande capacidade de atuação em frentes de lutas e mobilização social para impedir retrocessos e avançar em conquistas reais para o povo.

Que as ruas de Ferguson inspirem o povo negro brasileiro a se levantarem contra o racismo em defesa de uma sociedade mais justa, humana, fraterna e igualitária.