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“Sou muito reservado, discreto”, diz o “Japonês da Federal”

Do Correio Braziliense:

Oriental, grisalho, óculos escuros, 1,70m. Newton Ishii, 60 anos, virou um dos personagens mais falados da Operação Lava-Jato, que investiga esquema de corrupção na Petrobras. Sempre ali, de “papagaio de pirata” nas imagens de prisões de políticos e empresários renomados, a figura do Japonês da Federal virou até boneco de Olinda. O chefe do Núcleo de Operações da Polícia Federal de Curitiba não consegue entender o que aconteceu. “É o meu trabalho. Tem colegas que participaram até de mais prisões que eu, mas virei o rosto da Lava-Jato.”

Apesar de se divertir com a fama, o policial, nascido em Carlópolis (PR), está cansado e pensa em se aposentar em maio, quando lhe será permitido por lei. Aos 60 anos e dono de uma trajetória difícil, Newton quer se dedicar mais à filha. Filho de pai japonês e mãe nissei (segunda geração de imigrantes), o Japa da Federal só foi ao Japão uma vez, quando levou a neta para visitar o filho que trabalhava lá.

Orgulhoso da mudança que a Lava-Jato está promovendo no país, Newton acredita que a sensação de impunidade mudou. “Diminuiu a cultura do país de achar que é melhor levar vantagem em tudo.” Para ele, a parte mais satisfatória é estar servindo de exemplo para crianças e adolescentes.

Em entrevista exclusiva ao Correio, Newton fala sobre a sua história e a fama repentina. Mesmo preferindo que o foco tivesse se voltado para outro colega, o policial consegue se divertir. “Passei a andar com os óculos escuros no bolso até de noite, porque as pessoas não querem tirar foto comigo sem ele.”

O senhor está afastado do cargo?
De jeito nenhum. É boato. Não sei de onde saiu isso. Estou em férias. Elas acabam em 7 de março e voltarei para o mesmo lugar.

Como virou o “Japa da Federal”?

Sou chefe do Núcleo de Operações. Uma das funções do núcleo é conduzir os presos. Com a Lava-Jato, começaram a aparecer na mídia fotos da equipe. E, por algum motivo que não sei, a mídia começou a focar em mim. A origem disso tudo é desconhecida. Talvez por ser o único oriental. Tem colegas que participaram até de mais prisões que eu, mas virei o rosto da Lava-Jato. Ninguém consegue explicar o porquê de esse foco ter se virado para mim.

Formou-se essa imagem de símbolo de combate à corrupção. Na verdade, esses símbolos não têm nada a ver. Eu, Newton, só represento a corporação. Sou muito reservado, discreto. A gente precisa estar na rua. Agora, por exemplo, como é que vou efetuar uma prisão? Se chego a um local, todo mundo sabe que a Polícia Federal está lá. Então, tenho preferido ficar mais na parte de coordenação.

A fama tem atrapalhado?
Agora não mais, porque estou ficando mais na parte de logística. A imprensa começou a fotografar direto. Fica inviável. As prisões estão sendo feitas por outras pessoas também envolvidas na Lava-Jato. Não somos exclusivos da operação. Tudo que se refere à parte operacional é do meu setor. Temos operações de pedofilia, tráfico de drogas… A Lava-Jato é uma delas. Só que esse personagem criado saiu um pouco do controle. Sempre tem algo sendo publicado a meu respeito. Tanto que fizeram marchinha de carnaval, máscara, até boneco de Olinda. Ligaram para mim, pediram autorização. As máscaras, não. Mas tudo bem. Não me incomodo.

Você recebeu direito de imagem?

Não, nem faço questão. Deixa os comerciantes ganharem o dinheiro deles.

E como está lidando com a fama?
A cada dia essa fama me surpreende mais. Ela tem dois lados. Tem o lado bom, do reconhecimento. O lado das crianças e adolescentes é muito legal. Eles querem tirar foto, conversar e estudar para mais tarde fazer concurso para a Polícia Federal. Estamos dando um bom exemplo. No Brasil, a polícia nunca teve esse papel de exemplo e agora, com a Lava-Jato, estamos tendo apoio em todos os sentidos, todas as classes sociais. Dizem que estão rezando, torcendo para que tudo acabe bem. Isso fortalece o trabalho e nos dá força para continuar.