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“SP tem hoje o prefeito que deveria ter tido há mais de uma década”, diz urbanista

Do urbanista Antonio Risério, na Folha:

São Paulo tem, hoje, o prefeito que deveria ter conhecido há mais de uma década. A engenharia antiurbanística da ditadura militar, que se apresentava como solução para o futuro, era, na verdade, um atraso de vida, uma obsessão viarista de olhos fechados para a qualidade de vida na cidade.

As administrações de Luiza Erundina (1989-93) e Marta Suplicy (2001-05) se voltaram para realizações sociais, mas não exatamente citadinas. José Serra (2005-06) e Gilberto Kassab (2006-2013) deixaram correr solto o barco da urbe neoliberal. E perdemos tempo.

Só agora, com Fernando Haddad, São Paulo se concentra em si mesma como realidade socioespacial específica, carente de ações que a direcionem para um novo modo de vida.

(…)

Haddad descobriu, em tempo, que a saída era ser ele mesmo. E tirar partido, inclusive, da distância e do isolamento com relação aos ditames tantas vezes estreitos do PT. Sim, há momentos em que a solidão política é boa conselheira. Até porque o pensamento de Haddad encontrou uma “ecologia” favorável para medrar.

Era cada vez maior o número de paulistanos convencidos de que a cidade precisava buscar soluções fora da cartilha de sempre, encarando a questão da mobilidade urbana e discutindo sem temor o beco sem saída automobilístico, com todas as suas implicações ambientais.

É certo que esses paulistanos abertos para as novas soluções constituem ainda uma minoria –e não tão barulhenta quanto a dos proprietários de automóveis individuais. O que significa que Haddad se move, ao mesmo tempo, numa conjuntura mental propícia, mas minoritária.

A situação cultural e política é complicada. Se é cada vez maior o número dos que aceitam a vantagem ambiental da cidade compacta e a mescla programática de classes sociais no espaço citadino, assim como o retorno ao centro, persistem, na contramão, tabus arraigados, signos de status, falsos direitos adquiridos. E a batalha é pesada.

Mas Haddad entendeu três coisas fundamentais. Que teria de trabalhar com dificuldades orçamentárias, sem esperar qualquer solidariedade federal. Que teria de repensar e rediscutir o sentido desta cidade em maré adversa, enfrentando os preconceitos do conjunto da população, sem contar com a boa vontade da mídia. E deixar taticamente de lado o projetismo tipo “Arco do Futuro” em favor de um realismo mais pedestre, no horizonte do possível.

Não teremos mais de levar utopia alguma à sociedade. A sociedade é que se verá obrigada a entender que a cidade ideal, agora, está se fazendo cidade necessária.