Globo encontra “especialista” para convencer anunciantes a não migrar para a internet. Por Leo Mendes

Atualizado em 7 de novembro de 2015 às 12:32
Audiência despenca
Audiência despenca

O desespero da Globo com a queda vertiginosa e constante de sua audiência produziu nessa semana uma das entrevistas mais patéticas da história da televisão.

Acostumada a manipular a audiência, a Globo tenta agora enganar também os anunciantes.

No programa Milênio da Globo News, o “especialista” em mídias Michael Wolff tentava de todo modo convencê-los a continuar a investir em anúncios na TV e não na internet.

Mas os canais de televisão se tornam aos poucos canais de internet. Emissoras que produzem e compartilham vídeos em tempo real.

Canais na internet também já são capazes de transmitir conteúdo ao vivo, e há muitos a nossa escolha.

Não precisam transmitir o dia todo, mas se quiserem podem também vender espaço para igrejas ou teleshops e completar sua programação.

A qualidade do vídeo depende do quanto o usuário da internet pode pagar por velocidade e equipamentos.

Mas não é difícil imaginar um futuro em que todo computador poderá reproduzir ao vivo e on line conteúdos de alta qualidade, gratuitos ou pagos, via internet.

E então qual seria exatamente a diferença entre esses canais e os canais de tevê?

As smarts tvs já funcionam como um computador conectado à internet para assistir a vídeos. O Netflix é maior do que muitas TVs.

E o entrevistador, o jornalista Marcelo Lins, confessa:

“Os executivos (incluídos seus patrões?) estão preocupados com a queda da audiência.”

O desespero desses executivos trouxe Michael Wolff ao Brasil.

Wolff é estadunidense, escreve para a revista Vanity Fair, edita uma publicação especializada em publicidade e propaganda chamada Ad Week e também foi escolhido pelo magnata das comunicações Robert Murdoch para escrever sua biografia, o que nos dá um bom indício da relação que Wolff mantém com os barões da mídia. E o quanto está disposto a tentar ajudá-los em troca de dinheiro. Foi chamado pela New York Magazine de “um homem raivoso de aluguel”.

Para chegar às conclusões fantásticas apresentadas na entrevista, Wolff cita como exemplos o SuperBowl (a final do maior campeonato de futebol americano nos Estados Unidos) e o Buzzfeed.

“O SuperBowl com uma audiência de 100 milhões de pessoas gera uma receita com anúncios publicitários de 1 bilhão de dólares. O Buzzfedd, com 200 milhões de visitantes únicos mensais, gera 10 milhões”.

A partir dessa constatação, a conclusão mais óbvia – e dramática para as emissoras de TV -parece ser a de que os anunciantes estão gastando muito na televisão, por resultados que podem alcançar na internet gastando uma parcela ínfima desse orçamento.

Mas Wolff tem uma defesa a fazer, e segundo ele, os anunciantes que preferem a televisão sabem o que fazem, pois o “tráfego” na internet é muito diferente da “audiência” da tevê.

“20% dos anúncios na internet sequer são vistos, pois as pessoas saem da página antes de carregá-los. Há também os robôs e gente que fica clicando várias vezes…”

Sobre o controle remoto, que há décadas tornou possível fugir dos intervalos comerciais na televisão com apenas um clique, nenhuma palavra. Sobre pessoas que deixam a tevê ligada e vão fazer outras coisas também não.

A empresa ComScore divulgou recentemente uma pesquisa que mostra que no Brasil, assim como em toda a América Latina, o número de pessoas que assiste a vídeos on-line (82% no Brasil, 81% na AL) já é maior do que o dos que assistem televisão aberta (72% no Brasil, 70% na AL).

E mais uma vez a lógica e as evidências trabalham contra as previsões, esperanças ou torcida de Wolff: o acesso à internet ainda é restrito e deve crescer muito nos próximos anos, assim como a acesso a smartphones, tablets, notebooks, computadores.

Já o potencial de crescimento da tevê é pequeno, pois ela já está presente na maioria dos lares, e quem não assiste mais a tevê, parece não assistir principalmente por escolha própria, e não por falta de acesso.

Tudo isso, aliado à série de recordes negativos históricos na audiência da Globo, que não param de ser quebrados em todos os horários, fazem a entrevista com o Wolff lembrar algo como “Ne me quitte pás”, interpretada por Jaques Brell no auge de sua agonia, prestes a ser abandonado pelo que mais ama.

O que a Globo mais ama é o dinheiro, as bilionárias verbas publicitárias que fizeram da família Marinho a mais rica do Brasil.

Wolff, aliás, disse que seu sonho era ser brasileiro, trabalhar na televisão brasileira.

“Trata-se de um mercado impressionante. Houve um momento nos Estados Unidos no qual a televisão era a voz mais singular e poderosa, mas não tem mais a singularidade que parece ainda ter aqui”.

Essa voz singular e poderosa no Brasil durante décadas se chamou Rede Globo.

E é péssimo para a democracia que exista uma única voz superpoderosa na mídia.

Wolff deve saber disso, mas sua raiva e conclusões variam de acordo com quem aluga seus comentários.