Indignem-se!

Atualizado em 3 de março de 2013 às 18:51

Um trecho do célebre ensaio que despertou protestos na Europa, e cujo autor morreu dias atrás.

Protesto em Portugal neste final de semana: indignação com a iniquidade
Protesto em Portugal neste final de semana: indignação com a iniquidade

O Diário homenageia aqui o embaixador e escritor alemão Stéphane Hessel, morto há poucos dias aos 96 anos. Seu pequeno ensaio “Indignai-vos” está na raiz dos protestos contra a desigualdade que arrebataram a Europa nos últimos meses. Um detalhe extraordinário é que o manifesto foi escrito quando Hessel tinha já 93 anos. Apenas a edição francesa vendeu quase 2 milhões de exemplares.

“Olhem à sua volta e vocês encontrarão coisas que justificam a sua indignação”, Hessel escreveu. “Só a indignação leva à esperança”. A edição francesa de “Indignai-vos” já vendeu mais de 1,5 milhão de exemplares.

Hessel fazia uma distinção entre se indignar e se exasperar. Indignar-se leva ao trabalho persistente e esperançoso em busca de mudar as coisas erradas. Exasperar-se leva à cólera e, eventualmente, às bombas.

Ele pregava a indignação, e não a exasperação, como se pode ver neste trecho de seu célebre ensaio.

                                            AS VIRTUDES DA NÃO VIOLÊNCIA

Estou convencido de que o futuro pertence à não violência, à conciliação das diferentes culturas. É por esta via que a humanidade deverá superar a próxima etapa. E aí eu me junto a Sartre: não podemos desculpar os terroristas que jogam bombas, mas podemos entendê-los.Sartre escreveu, em 1947: “Eu reconheço que a violência, sob qualquer forma que se manifeste, é um fracasso. Mas um fracasso inevitável, porque estamos em um universo de violência. E, se é verdade que o recurso à violência contra a violência se arrisca a perpetuá-la, também é verdade que é o único meio de fazer com que ela cesse”.

A isto acrescentarei que a não violência é um meio mais seguro de fazer a violência cessar. Não podemos apoiar os terroristas como Sartre fez, em nome deste princípio, durante a guerra da Argélia, ou por ocasião do atentado nos Jogos de Munique, em 1972, cometido contra atletas israelenses. Não é eficaz, e Sartre acabaria se questionando, no final da vida, sobre o sentido do terrorismo, e duvidando de sua razão de ser. Dizer para si mesmo “a violência não é eficaz” é muito mais importante do que saber se devemos ou não condenar os que a ela se dedicam.

Hessel
Hessel

O terrorismo não é eficaz. Na noção de eficácia é necessária uma esperança não violenta. Se existe uma esperança violenta, ela está na poesia de Guillaume Apollinaire, “Como a esperança é violenta”, não na política. Em março de 1980, três semanas antes de morrer, Sartre declarou: “Precisamos tentar explicar por que o mundo de hoje, que é horrível, não passa de um momento no longo desenvolvimento histórico; que a esperança sempre foi uma das forças dominantes das revoluções e das insurreições, e como eu ainda tenho na esperança minha concepção de futuro”.

Devemos entender que a violência dá as costas à esperança. Devemos preferir a esperança, a esperança da não violência. Este é o caminho que se deve aprender a trilhar.

Tanto do lado dos opressores quanto do dos oprimidos, devemos chegar a uma negociação para fazer a opressão desaparecer; é o que permitirá não haver mais violência terrorista. Eis por que não devemos deixar que ódio de mais se acumule. A mensagem de um Mandela, de um Luther King encontra toda a sua pertinência em um mundo que ultrapassou o confronto das ideologias e o totalitarismo conquistador. É uma mensagem de esperança na capacidade das sociedades modernas de ultrapassar os conflitos por meio de uma compreensão mútua e de uma paciência vigilante.

Para alcançá-la, devemos nos basear nos direitos cuja violação, qualquer que seja o autor, sempre há de provocar nossa indignação. Não se pode transigir sobre esses direitos.