“Intocáveis”: o filme francês para tirar da lista dos que você NÃO verá este ano

Atualizado em 21 de novembro de 2012 às 20:41

De todos os filmes franceses que você não verá este ano, tire da sua lista Intocáveis, de Olivier Nakache e Eric Toledano. A segunda maior bilheteria da história do cinema francês estreou no Brasil discretamente — e em pouco tempo também emplacou por aqui. Estava em quinto lugar, com mais de 80 mil espectadores. Ou seja, sempre haverá uma esperança para as pessoas interessadas em entretenimento inteligente. Mas isso não vem ao caso agora.

O que vem ao caso é que Intocáveis é uma história emocionante, contada de maneira clara e límpida, sem maneirismos, que poderia cair na pieguice facilmente. O milionário Phillippe (François Cluzet), tetraplégico por causa de um acidente de paragliding, procura um enfermeiro para cuidar dele. Aparece Driss (Omar Sy), que faz uma entrevista apenas para pegar o seguro-desemprego. Driss faz tudo errado, basicamente. Dá em cima da secretária, admite que queria apenas a assinatura do papel para poder pegar seu benefício e, ao ser perguntado sobre se conhecia Berlioz, diz que sim, claro: “Quem você conhece lá, me diga”. Phillippe se referia ao compositor, obviamente.

Driss e Phillippe: amizade improvável

O ricaço pede para ele voltar no dia seguinte. Tinha gostado dele. É um encontro de dois mundos diferentes e o início de uma amizade improvável. Driss é um filho de imigrantes africanos, criado pela tia, que o expulsa de casa por vadiagem. Phillippe tem retratos de seus antepassados aristocratas em sua mansão e uma filha adolescente intratável, que o ignora sistematicamente. Ele gosta do fato de Driss não ter pena dele, de não enxergá-lo como um pobre coitado, um pária. Driss faz com que o patrão recupere sua alegria de viver. Apresenta-lhe a maconha e o som de Earth, Wind & Fire. Traz prostitutas para a casa. Troca a van adaptada para cadeira de rodas pelo carro esportivo, que dirige sem ter carta, rasgando as ruas de Paris até ser pego pela polícia (e mentindo para os policiais que estava levando o passageiro para o hospital, numa emergência. Phillippe colabora babando).

Um baseado para o patrão

Poderia ser uma sucessão de clichês raciais e sociais. Você já viu algo parecido em Driving Miss Daisy, por exemplo. Os dois personagens são estereótipos – o milionário, branco, contrata uma pequena orquestra para ouvir música clássica e dita cartas com poemas para uma mulher com quem tem um relacionamento epistolar; o ajudante negro dança funk como ninguém, é semianalfabeto, tarado e tem ataques de riso na ópera.

Mas Intocáveis trata de um tema candente na França – a imigração – e não poupa ninguém de piadas com deficientes que poderiam dar cadeia nos Estados Unidos (daqui a pouco, no Brasil). Driss despeja chá fervendo nas pernas de Phillippe para ver se ele não sente nada, chama-o de mimado e, na hora de dar-lhe comida na boca, erra a mira, distraído com a secretária ruiva, e acerta seu olho.

Além disso, há o desempenho dos dois atores principais, numa química incrível. Omar Sy, 34 anos, descendente de senegaleses, é bonito e carismático. Ganhou o César de melhor ator, desbancando o canastrão gente fina Jean DuJardin, que concorria com O Artista (pelo qual DuJardin faturou o Oscar). Cluzet é um patrimônio do cinema francês, tendo trabalhado com diretores como Bertrand Tavernier, Robert Enrico e Claude Chabrol. Esteve em Pret-a-porter, de Robert Altman. Os dois farão você ficar tenso, rir e chorar, mas sem forçar a barra, sem jamais perder a mão.

O filme é inspirado na história real de Phillipe Pozzo di Borgo e Abdel Salou

Intocáveis é inspirado na história verídica de Phillippe Pozzo di Borgo e de Abdel Salou. Já tinha virado um documentário em 2004 e dado origem a duas autobiografias, uma de Phillipe (lançada no Brasil como O Segundo Suspiro) e outra de Selou. Eu não queria dizer isso, mas os dois aparecem no final. Bem, é um motivo a mais para assistir a uma das grandes fitas de 2012.