Mulheres pedalando deixam a cidade mais bonita

Atualizado em 18 de março de 2013 às 20:49

A presença feminina faz a diferença na paisagem urbana, e não estamos falando apenas de beleza física.

 

Quando São Paulo vai ver mulheres de bicicleta na mesma quantidade de Copenhague?
Quando São Paulo vai ver mulheres de bicicleta na mesma quantidade de Copenhague?

O texto abaixo foi publicado, originalmente, no site as bicicletas.

Antes que minhas amigas feministas me xinguem, já aviso que esse não é um post sobre mulheres belas. Poderia ser: mulheres que pedalam são sempre mais belas (pois são mais saudáveis). Mas não se trata de repetir o óbvio.

Mulheres são mais espertas que homens. É fato.  Tanto que se expõem menos ao risco que homens. Quem sempre morre em acidentes de moto são homens. Quem sempre se mata em alta velocidade? Homens. Sim, a tolerância ao risco é maior entre os homens. Tomo por medida eu mesmo. Passo todo santo dia, de bicicleta, por um dos locais mais inóspitos de São Paulo para um ciclista (e para muitos motoristas): a praça Campo de Bagatelle.

Lugar que de fato é perigoso. Já fui atropelado lá. Quantas vezes vi mulheres trafegando ali? Em anos passando por lá, apenas duas vezes. Elas, mais espertas, fazem outros trajetos. Não se expõem ao risco ao qual me exponho.

Portanto, o que quero dizer é que, para bom observador, ver mulheres trafegando de bicicleta num local indica que esse mesmo local é seguro. Seguro não no sentido da violência dos assaltos, mas sobretudo seguro em relação à violência do trânsito. Ou seja, é um local onde o humano se sobrepõe à máquina.

É fato: a presença feminina humaniza o local. A presença feminina civiliza o local.  E um local civilizado é sempre mais belo que a barbárie. Esse dado é importante.

A própria presença feminina influencia como se darão as relações entre os ocupantes daquele local. A conhecida habilidade feminina para o contato inter-humano, aquela coisa do diálogo olhando-se nos olhos, impõe um padrão de coordenação, e não de subordinação, na ocupação transitória daquele espaço, que é a rua.

Copenhague prova a tese do autor deste texto
Copenhague prova a tese do autor deste texto

Mulheres na rua. Esse é o fator a ser observado. Nos locais em guerra, raramente vemos mulheres na rua. A rua é interdita às mulheres nos locais onde não se respeitam direitos humanos, onde as cidades não passam de amontoados de moradias, desprovidas dos mais básicos serviços públicos, onde vigora a lei do mais forte, e não a ética da boa convivência.

Ora, o local onde há boa convivência é sempre mais agradável. Sempre mais leve.   Para  trafegar, para morar.  Portanto, transmite maior sensação de segurança, e permite que outros aspectos da vida, além da ansiosa busca pela sobrevivência, aflorem e seja usufruídos pelos humanos.

É aí que mora a verdadeira beleza da presença feminina. Não é a beleza dos corpos, a beleza dos rostos, das roupas. Mas a beleza da presença. E é justamente essa presença, que enfrenta toda sorte de obstáculos, que vão da violência real à violência simbólica, mas que se impõe, que é preciso enaltecer.

Claro, o ideal seria não precisar enaltecer a presença feminina sobre duas rodas nas cidades. O ideal seria ver nisso apenas e tão somente atos cotidianos sem significado maior. Mas numa metrópole como São Paulo, gigantesca e local de tantas violências contra a mulher, essa presença feminina pedalante permite ousar sonhar com uma lógica de trânsito que não seja escorada na supremacia do mais forte sobre o mais fraco, mas na convivência mais igualitária.

(Texto escrito enquanto eu ouvia música feita por mulheres: Fanny, Patti Smith e The Iron Maidens, pois sim, mulheres há que fazem rock de excelente qualidade.)