“Nós poderíamos nos chamar Partido Liberal”: uma entrevista de Hitler útil à extrema direita que tenta renegá-lo

Atualizado em 15 de agosto de 2017 às 13:16
Hitler tenta explicar a uma extremista brasileira porque eles são parentes

 

“Annie Hall”, o melhor filme de Woody Allen, tem uma cena antológica.

Alvy Singer, o alter ego do cineasta, está numa fila de cinema com a namorada, quando um sujeito começa a discorrer com empáfia sobre Marshall McLuhan, velho guru da teoria da comunicação.

Alvy/Allen não aguenta e pede que ele pare com as bobagens. O homem rebate alegando que leu tudo sobre McLuhan e suas teses.

Allen resolve, então, tirar o próprio Marshall McLuhan de trás de um pôster para confrontar o fanfarrão.

“Eu ouvi o que você estava dizendo. Você não conhece nada do meu trabalho. Entendeu tudo errado. O fato de você dar um curso de qualquer coisa é inacreditável”, diz McLuhan.

A nova moda indigente da extrema direita brasileira, cujo guru é Olavo de Carvalho e o messias é Bolsonaro, é jurar que o nazismo é de esquerda.

Essa fraude veio à tona com força depois dos atos terroristas em Charlottesville perpetrados por neonazistas numa marcha denominada “Unite The Right”.

No festival de imbecilidades, um procurador de Goiás, Ailton Benedito, que mora no Twitter, sacou da algibeira o argumento: “Partido Nacional SOCIALISTA dos Trabalhadores Alemães, conhecido como NAZISTA. Os próprios nazistas se declaravam SOCIALISTAS”. A caixa alta é cortesia dele.

Se vivo fosse, o führer poderia conversar, como fez McLuhan, com os direitistas que embarcaram na tentativa desesperada de renegá-lo.

O jornal britânico The Guardian tem uma seção chamada “Grandes Entrevistas do Século 20”.

Uma delas, publicada em 1932 na revista Liberty, é com o velho Adolfo. O autor é o poeta e escritor alemão George Sylvester Viereck.

Segue um trecho:

“Por que”, perguntei a Hitler, “você se declara um nacional-socialista, já que o programa de seu partido é a antítese daquilo comumente creditado ao socialismo?”

“O socialismo”, ele retrucou, derrubando sua xícara de chá, exaltado, “é a ciência de lidar com o bem comum. O comunismo não é o socialismo. O marxismo não é o socialismo. Os marxistas roubaram o termo e confundiram o seu significado. Eu devo tirar o socialismo dos socialistas”.

“Nós poderíamos nos chamar Partido Liberal. Nós escolhemos nacional socialistas. Nós não somos internacionalistas. Nosso socialismo é nacional. Exigimos o cumprimento das reivindicações justas das classes produtivas pelo Estado com base na solidariedade racial. Para nós, estado e raça são um.”

(…)

“Queremos uma Grande Alemanha que una todas as tribos alemãs. Mas a nossa salvação pode começar no canto mais remoto. Mesmo que tivéssemos apenas 10 acres de terra e estivéssemos determinados a defendê-los com nossas vidas, os 10 acres se tornariam o foco da nossa regeneração. Nossos trabalhadores têm duas almas: uma é alemã, a outra é marxista. Devemos despertar a alma alemã. Devemos destruir o câncer do marxismo. O marxismo e o germanismo são antíteses.”