O repórter da Veja que perseguiu um sobrinho de Lula

Atualizado em 26 de fevereiro de 2015 às 21:59
Péssimo exemplo: Campbell, da Veja
Péssimo exemplo: Campbell, da Veja

O Brasil precisa desesperadamente de novas regras para a mídia.

Vou repetir.

O Brasil precisa desesperadamente de novas regras para a mídia.

O episódio em que um repórter da Veja usou nomes falsos para tentar se aproximar de um sobrinho de Lula é uma extraordinária demonstração de que é vital definir, logo, o que um repórter pode e, sobretudo, o que não pode fazer.

O jornalista já cometera uma monstruosidade — noticiara uma festa milionária de um sobrinho de Lula em Brasília. Lula não tem sobrinho em Brasília, logo se soube. O repórter, não contente com a estupidez que cometera, se lançou a uma louca cavalgada. Foi atrás de um sobrinho de Lula em Sorocaba, como se tivesse um direito divino a invadir a privacidade alheia.

A Inglaterra está passando por um debate imprescindível ao Brasil.

No caso inglês, o que levou à conclusão de que as velhas normas não mais serviam foi a descoberta de que jornalistas de um tabloide de Murdoch invadiram em busca de furos a caixa postal de uma garotinha que fora sequestrada.

A menina, afinal, foi assassinada, mas o jornal morreu com ela. Dias depois que se soube do método monstruoso do tabloide, Murdoch não teve outra ação que não fosse fechá-lo.

Os ingleses chegaram à conclusão de que a auto-regulamentação da imprensa não funcionara, e passaram a discutir novas formas de fiscalizá-la.

O basta foi dado num país como a Inglaterra, em que a Justiça não é complacente com a mídia.

Você pode imaginar o que acontece no Brasil, onde os tribunais costumam ser favoráveis, qualquer que seja a situação, às grandes empresas de jornalismo.

Dilma reduz o problema quando defende a regulação econômica da mídia. É claro que isso tem que ser feito. Há que coibir monopólios e oligopólios, como em qualquer atividade econômica, ou a competição é prejudicada e a sociedade sofre as consequências.

Mas isto é apenas parte do drama. Também os métodos têm que ser revistos, como na Inglaterra e, a rigor, em qualquer país civilizado.

A leniência em relação à mídia dá em situações intoleráveis como esta em que um repórter da Veja se julgou no direito de promover um cerco a um adolescente.

Num mundo menos imperfeito, a opinião pública se insurgiria contra esse barbarismo jornalístico.

Mas vivemos num país em que, até a chegada da internet e com ela uma pluralidade de vozes, a opinião pública era manipulada por um punhado de coronéis da mídia – Marinhos, Frias, Civitas, Mesquitas e vamos parando.

É este coronelato que comanda a resistência cínica à modernização das relações entre a imprensa e os cidadãos.

O argumento central, amplamente repetido pelos analfabetos políticos que são um alvo fácil dos coronéis, é que se trata de censura.

Ora, quem acredita nisso, como disse Wellington, acredita em tudo.

Sequer os coronéis podem acreditar numa mistificação dessas.

No Brasil, a mídia se comporta como um poder à parte, diante do qual todos os demais poderes tremem vergonhosamente.

Alguém ganha com isso: os coronéis, não por coincidência donos de algumas das maiores fortunas do país e do mundo.

E alguém perde com isso – o Brasil.

Não é possível que o interesse da mídia vá sempre predominar sobre o interesse público.

Para que o Brasil seja um país socialmente avançado, o interesse público terá que se sobrepor ao de meia dúzia de famílias.