O caso Eduardo Coutinho: qual o risco de morar com alguém com esquizofrenia?

Atualizado em 27 de outubro de 2014 às 13:22
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Coutinho

 

É possível prevenir um surto psicótico?

Esta é uma pergunta que muitos devem estar se fazendo depois da tragédia do cineasta Eduardo Coutinho, morto por seu filho Daniel a facadas. É possível perceber quando uma pessoa terá um surto? Como saber se alguém tem esquizofrenia? O que provocou tamanho estrago?

Lembro-me de um caso no interior de São Paulo. Após passar por um bar numa tarde de domingo, onde provavelmente consumiu álcool, um homem matou as duas irmãs e se matou. As irmãs eram carinhosas e acolhedoras. Ele sempre demonstrou um comportamento fora do comum: pouco trabalhava e sua conversa era por demais estranha. Qual a culpa do álcool nisso tudo? Provavelmente é o deflagrador de um surto psicótico, de alguém com um quadro psicótico.

Conviver com alguém com um transtorno desses não é nada fácil. O contato com a realidade dessas pessoas fica prejudicado, assim como os relacionamentos interpessoais. Afetos e pensamentos ficam alterados. Sua conversa é estranha. Não conseguem trabalhar ou estudar direito. Tendem a ensimesmar-se.

Todos nós, de alguma forma, podemos ter momentos assim. Que ninguém saia por aí achando ser um psicótico. Mas, em pessoas com transtorno psicótico, esses fatores não passam despercebidos. Com o tratamento adequado, utilizando-se medicação, psicoterapia e orientação familiar, pode-se estabilizar os sintomas e a própria vida. Com uma chance maior de que se evite um surto, que são momentos pautados por delírios e alucinações. Se isso gerar no indivíduo a sensação de estar sendo ameaçado ou perseguido, ele pode ter atitudes violentas e agressivas. Mas isto não é regra.

O esquizofrênico pode ter delírios e alucinações auditivas ou visuais em momentos de crise. Escuta vozes que podem dizer-lhe para fazer coisas, como matar o pai a facadas ou mesmo se matar. Se ele tiver sintomas paranóicos e pensar que o mundo conspira contra ele, delírios e alucinações podem ser muito mais ameaçadores.

Apesar do absurdo de suas alucinações, a pessoa não se contém em seus atos porque, para ela, é tudo real. Por isso é necessário a psicoterapia, para que haja consciência de que há uma ruptura com o real. De acordo com o delegado Rivaldo Barbosa, responsável pelo caso, Daniel confessou o crime. “Ele explicou que tinha medo constante de viver e o objetivo era se suicidar, mas ele disse que não queria deixar os pais desamparados”, disse Barbosa.

É possível conviver com alguém assim? É, desde que esteja em tratamento. E prever um surto? Muito pouco provável. Prevenir um fato tão extremado? Ao perceber que a pessoa está alucinando ou delirando, é preciso que busque ajuda imediata. Confrontá-lo ou tentar sozinho contê-lo não é boa pedida. Ele não está conectado à realidade. Pode inclusive ver o seu interlocutor como um demônio a ser combatido por ele, o “Arcanjo Gabriel”.

Mesmo estando em tratamento, o portador da doença, por não se perceber doente – uma de suas características – nem sempre usa a medicação. Por isso a importância da família. Ou usa outras drogas para aliviar os sintomas. Como o álcool, no caso citado. Daí pode resultar um surto.

Mas de onde vem esse transtorno? É do ser humano e o acompanha desde sempre. Não discrimina sexo, raça, etnia ou nível sócio econômico. E atinge apenas 1% da população mundial.

Para quem quiser conhecer a história de um esquizofrênico que atingiu o sucesso, não sem antes passar por diversos problemas, vale assistir “Uma Mente Brilhante”, filme de 2001 que retrata a vida do Nobel de Economia John Nash. Não sei se Eduardo Coutinho viu este filme, mas é uma pena que o desfecho, em seu caso, foi outro.