O Doi-Codi de Sérgio Cabral

Atualizado em 24 de julho de 2013 às 15:18

A Comissão Especial de Investigação de Atos de Vandalismo em Manifestações Públicas é uma aberração inconstitucional.

Cabral quer poder bisbilhotar todo mundo
Cabral quer poder bisbilhotar todo mundo

O artigo abaixo foi publicado no site Vaidapé.

A notícia saiu nos jornais meio na pressa, entre uma e outra fala do governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral.

Mas nesta segunda-feira o negócio começou para valer: entrou em vigor o decreto que cria no Rio de Janeiro a CEIV, Comissão Especial de Investigação de Atos de Vandalismo em Manifestações Públicas.

O que o governo quer com isso?

“A comissão vai unificar o trabalho de investigação, uma vez que estavam registrados em diferentes delegacias. Ela vai dar maior agilidade e eficiência ao trabalho de elucidação de crimes e aplicação da lei. É uma resposta das forças de Segurança e do MP, que é o desejo da sociedade diante de sua perplexidade com os acontecimentos”, disse Cabral.

Na prática, essa Comissão reunirá membros do Ministério Público, Secretaria de Segurança do Estado e das polícias civil e militar para investigar casos de vandalismo e participação em manifestações.

O Estado vai investigar e endurecer – esse é o recado. Cabral está preocupado com “a presença de organizações internacionais cujas redes na internet permitem um nível de comunicação que não se tinha no passado”.

Ao texto:

Art. 2º Caberá à CEIV tomar todas as providências necessárias à realização da investigação da prática de atos de vandalismo, podendo requisitar informações, realizar diligências e praticar quaisquer atos necessários à instrução de procedimentos criminais com a finalidade de punição de atos ilícitos praticados no âmbito de manifestações públicas.

“Todas as providências necessárias.” “Quaisquer atos necessários.” Não foi à toa que já chamaram essa comissão de Doi-Codi de Cabral.

Art. 3º As solicitações e determinações da CEIV encaminhadas a todos os órgãos públicos e privados no âmbito do Estado do Rio de Janeiro terão prioridade absoluta em relação a quaisquer outras atividades da sua competência ou atribuição.

Quer dizer: se um juiz tem qualquer outro pedido em mãos – habeas corpus, ação indenizatória, o que seja – ele deverá deixar de lado para autorizar quebras de sigilo e outras demandas que essa comissão exigir para investigar os atos “de vandalismo”. Qualquer crime investigado pela Ceiv terá prioridade em relação aos outros.

Só que isso, como lembra Paulo Rená (que é mestre em direito constitucional) é inconstitucional. Sim, porque a Constituição do Estado do Rio de Janeiro já determina quais serão as prioridades.

“Parágrafo único. As empresas Operadoras de Telefonia e Provedores de Internet terão prazo máximo de 24 horas para atendimento dos pedidos de informações da CEIV.”

A partir de agora, os cidadãos do Rio de Janeiro poderão ter seu sigilo telefônico e suas correspondências e trocas de mensagem online violadas para fins de investigação da Comissão.

Só que é crime interceptar comunicações telefônicas ou eletrônicas sem autorização judicial.

“Certamente, essa previsão de obrigação sobre as Operadoras de Telefonia e Provedores de Internet extrapola a competência legislativa do Governador”, diz Rená. “É um uso abusivo do poder Estatal. É uma norma que só serve para ameaçar os intermediários. O decreto incita as operadoras a cometer um crime previsto em lei, e a violar a Constituição Federal.”

Além disso, os estados não podem regular as telecomunicações. Isso é competência da União.

O decreto de Sérgio Cabral é ilegal. É inconstitucional. Ultrapassa as competências do Estado.

A não ser que já estejamos Estado de Exceção – desta vez, de maneira mais descarada. Cidadãos já foram proibidos de ir e vir de várias maneiras diferentes neste último mês.

O Ceiv é mais um passo nesta direção – um passo institucionalizado. “O fato é que, na prática, está instaurado um estado de exceção por esse decreto”, diz o jurista.

Junte isso à sequência de acontecimentos do último mês em todo o País. Ao que foi o dia 13 de julho e ao que fizeram parecer o dia 17 de julho em São Paulo.

O Gil falou isso há cinco décadas: aqui é o fim do mundo.