O jantar de 100 reais e o problema de 50 mil anos

Atualizado em 14 de maio de 2013 às 11:47

O cavalheirismo já não devia mais ser uma ofensa às mulheres.

Não foi sem um tanto de valentia que consegui chegar ao fim de “A Falácia Feminista”, que deu suas piruetas nas redes sociais. É uma modalidade nova de texto irrelevante escrito dentro da contingência de um blog de nicho (no caso, a blogueira dá dicas de sobrevivência no exterior — pelo que pude inferir do título). Esses textos, quando “vazam”, tornam-se alvo de 1º: críticas feitas com boa fé; 2º: humoristas diletantes; 3º: o pessoal que só liga seus computadores à internet para fazer os outros chorarem (trolls).

(Aconteceu com uma blogueira que explicava como lidar com a babá do seu filho outro dia. Tacharam-na de arrogante, desumana, nefelibata, quando explicou os arranjos que faz para preservar sua intimidade ou economizar num restaurante se a babá está à tiracolo).

A moça do texto de hoje, que se chama “Maria Farinha” na rede social, cometeu ali um arrazoado ora confuso, ora ininteligível, sobre o que espera de um pretendente. Em trocados: até os 20 anos, ela achava bonito encher a cara e comer cachorro-quente durante a fase da “prospecção”. Hoje, que está mais velha e se sente cansada e “prostituída” em seu trabalho de tradução de textos, quer mais capricho.

Ela cita o exemplo de um rapaz que, duríssimo, fez-lhe a suprema gentileza de convidar para um jantar cuja conta rompeu a barreira psicológica dos três dígitos. Para ela, o jovem não tinha o dinheiro. Mas ele disse que tinha: apenas que gastava tudo com videogame. Quando a conheceu, jogou o joystick para o alto, passou o ferro (calma, leitor) na camisa de botão e deu outro fim ao que, de seu soldo, dedicava ao entretenimento eletrônico.

Depois, ela se perde para nunca mais voltar quando se dirige aos que a acusam de se vender por R$ 100. Que fiquem sabendo, ela diz, que as prostitutas são pessoas maravilhosas, capazes de grandes atos altruístas e por aí segue-se uma linha de pensamento mais turva que o Nescau dos filhos do Luciano Huck.

O problema, mesmo, foi o mote que algumas pessoas pegaram para discutir a diferença entre “gentileza” e “cavalheirismo”. Numa pesquisa pelo Twitter, vi escritores sem romance e articulistas sem coluna em batalhas etmológicas, de sociologia, espirituais, pessoais, enfim, um sururu daqueles.

Aparentemente, a instituição chamada “cavalheirismo” é uma ofensa às mulheres. É uma forma “polida” de domesticá-las, trazê-las à ponta de um chicote psicológico através de favores “irrecusáveis”. Mas se o sujeito faz a mesma coisa — dá um presente, chama para jantar num lugar mais caro e paga — pode ser também gentileza e não o vitoriano e vilificado (adoro aliterações) cavalheirismo. Tudo depende… Ninguém sabe do quê.

A conversa, como sempre, se degenerou numa altercação azeda, em que, juro, não vi uma só pessoa falando algo digno de nota. Talvez, e é um palpite muito humilde, talvez não seja num só dia e sobre um texto que me parece baseado em rusgas da moça com algum rapaz desatencioso, que vamos resolver esse magnífico problema de 50 mil anos que é o homem e a mulher não terem a menor ideia do que o outro quer dizer (quem falar que o Chico Buarque entende as mulheres pode passar no guichê e tirar o atestado de bobo).

Cada um sabe o que faz, uai. Se a moça gosta que paguem, o cara que julgue se ele quer ficar com uma menina que exige que lhe paguem as coisas. Se não, bola pra frente.