O julgamento no TSE está criando campo para um ‘não político’ na presidência. Por Mauro Donato

Atualizado em 7 de junho de 2017 às 11:12

 

Vermos um adversário amargar nas mãos da justiça pode ser intimamente prazeroso. Nem por isso devemos permitir que a justiça saia das balizas.

O julgamento da chapa Dilma – Temer terminou seu primeiro dia ontem com uma questão em aberto: aceitar ou não que fatos novos sejam incluídos no processo.

O processo de cassação da chapa teve início dois anos atrás. A juntada de ‘fatos novos’ aos 46 minutos do segundo tempo está realmente obedecendo a critérios legais ou abrindo uma porta – mais uma – para um imenso movimento de caçada não só a políticos mas à política como um todo?

O cenário de ‘ninguém presta’ na política atual é altamente perigoso. Admito que é desanimador saber que a imensa maioria dos parlamentares que votaram pelo impeachment de Dilma Rousseff era composta por condenados ou investigados em processos na justiça.

Na Justiça Eleitoral inclusive. Mas jogar todo mundo num único balaio e lançar no calabouço é justo? É o melhor a ser feito?

É preciso perguntar se não estamos assistindo de camarote a uma semeadura para o surgimento de um ‘não político’ na presidência. Afinal, a própria independência de alguns ministros do STF em relação a pessoas e empresas alvos da Lava Jato é questionável. Gilmar? Janot? Fachin? Moro?

Por mais que não se goste de Michel Temer e menos ainda de sua tomada do poder na base da mão grande, não se pode perder de vista que ‘fatos novos’ nada mais são que delações. E delações não são provas enquanto forem apenas isso, delações.

Ficarmos aguardando o ‘vazamento’ de trechos inéditos de áudios da Odebrecht ou JBS que envolvem quem já está com a corda no pescoço significa aplaudir ao procedimento de liberação a conta-gotas de ‘fatos novos’ que nada mais são que instrumentos que obedecem a algum timing administrado por interesses camuflados.

Delegado da Lava Jato já admitiu isso, inadvertidamente, claro. As gravações – e depoimentos – já foram todas ouvidas. As autoridades estão julgando com apenas uma parte delas e estão tomado conhecimento do todo aos poucos?

A verdade é que se está misturando as coisas e manipulando a opinião pública a bel prazer de uma conjectura esperta. Michel Temer ser o verdadeiro dono dos R$ 500 mil que estavam na mala de seu capanga maratonista Rodrigo Rocha Loures é um outro processo (que deveria colocá-lo em cana inclusive).

Mas isso é um fato recente, nada tem a ver com o processo que está julgando a campanha e a chapa lá do ano 2014.

Tentar separar as campanhas é uma estratégia da defesa de Temer. É uma tentativa e está entre seus direitos. Mas quem está sentado lá, envergando a toga, sabe são indissociáveis. Titular e vice são uma dobradinha. Michel Temer, para votar em si mesmo, precisou digitar o 13 de Dilma. Assim como não há prestação de contas do vice no TSE, é tudo uma coisa só.

Catapultar Temer é o sonho de consumo atual, mas ludibriar o povo com isso é canalhice. Para tirá-lo, nunca foi difícil nem faltariam argumentos. Afinal, se Dilma Rousseff caiu por conta das ‘pedaladas’, Temer também as assinou.

Michel Temer deve cair, mas não é preciso criar brechas perigosas na Justiça por causa disso.