O Led Zeppelin vai ao cinema (e salva o rock mais uma vez)

Atualizado em 19 de setembro de 2012 às 7:52

A notícia mais excitante no mundo da música pop nos últimos dias não foi a nova turnê de Lady Gaga, a esquisitice do Gangnam Style ou um topless “acidental” de Rihanna. Foi o lançamento de um filme, um CD e um DVD de um show de uma banda que acabou há 32 anos. Depois de fazer uma contagem regressiva misteriosa em sua página oficial no Facebook, o Led Zeppelin anunciou seus planos para lançar o registro do show na O2 Arena, de Londres, em 2007. No dia 17 de outubro, um longa metragem chega a 1500 cinemas no mundo todo (no Brasil, nas redes Cinemark e UCI). O CD e o DVD saem em novembro. Naquela noite, 20 milhões de pessoas entraram na fila virtual por ingressos, sendo que apenas 18 mil conseguiram a entrada. O Led Zep continua com sua estratégia de não encher as prateleiras de produtos e subprodutos, mas de oferecer pouca coisa, de alta qualidade, de um jeito especial – em que o fã se sente também especial. Page cuida pessoalmente dos remixes e relançamentos. Poucos filmes têm autorização para colocar o Zep na trilha (um deles foi Quase Famosos, depois de uma longa negociação).

Foto de Mark Bowman: "Seria uma pena não dividir esses momentos com milhões de pessoas que não viram o show"

É pouco provável que haja outras reuniões. Robert Plant é sempre o mais reticente com relação a isso. Declarou que está cansado e que daqui a pouco precisará de ajuda para atravessar a rua. Um exagero, evidentemente, já que Plant está em forma aos 64 anos, com sua vasta cabeleira loira (milagrosamente mais vasta do que há 40 anos) e a voz nos trinques, embora não alcance mais os agudos de Since I’ve Been Loving You e nem suba uma oitava em Ramble On, como nos velhos tempos.

O frisson é um atestado de excelência à maior banda dos anos 70 – e facinho uma das cinco maiores de todos os tempos. Jimmy Page está limpo, não baba mais no palco (alguém se lembra dele tocando no Live Aid?) e não foi superado pela miríade de guitarristas que o sucederam no posto de guitar hero. A Gibson Les Paul na altura dos joelhos, as notas na trave que ele incorporou ao seu estilo – está tudo lá, como o diabo gosta. John Paul Jones, desprezado pela dupla Page/Plant nas turnês que os dois fizeram nos anos 90, é um monstro tímido, estrategicamente plantado junto à bateria, capaz de tocar qualquer coisa com elegância e sem uma gota de suor. Jason Bonham, filho do baterista John Bonham, morto em 1980 após 40 doses de vodca, é um substituto à altura do pai, até mesmo na maneira como subjuga o bumbo. Os quatro mostraram sua categoria ao longo de 16 canções em mais de duas horas de espetáculo para uma plateia que cantava tudo em coro.

Uma das bandas mais copiadas da história, o Led Zeppelin não teve rival na fusão de blues com hard rock que inventou e que foi dar, depois, em filhos bastardos como o heavy metal e todas as suas ramificações cavernosas. Quatro virtuoses que fizeram um disco diferente do outro, sem se acomodar a fórmulas, e que também estabeleceram um padrão de mau comportamento que se tornou lendário. Avião particular, muito dinheiro, drogas, orgias, suítes destruídas, groupies, mortes, ocultismo… o cardápio completo da decadência, com direito a uma sessão de pescaria na janela de um hotel, envolvendo uma fã, que acabou num sinistro ritual cujos detalhes não vou descrever aqui. Foram massacrados pelos punks. No final das contas, porém, o que fica é a música – colossal e capaz de atravessar o tempo incólume.

Page, com sua Les Paul, toca o theremin

O fotógrafo Mark Bowman, amigo de Jimmy Page e de Ronnie Lane, o compositor, cantor e baixista do Faces, foi um dos poucos que puderam fotografar o show no O2 Arena. Segundo Bowman, a área VIP tinha Dave Grohl, Beck, Brian May, Jeff Beck, Juliette Lewis, Marilyn Manson, Ben Harper, Laura Dern, Paul McCartney, David Gilmour, Priscilla e Lisa Marie Presley, Liam e Noel Gallagher e Mick Jagger. Abriram com Good Times Bad Times e seguiram com hits como Black Dog, In My Time of Dying, Dazed and Confused e Stairway To Heaven (esta, uma surpresa, já que a resistência de Plant em cantar o hino hippie de letra sem sentido é famosa). Entraram para o bis duas vezes, a primeira com Whole Lotta Love e a segunda, definitiva, com Rock’n’Roll. “Até Paul McCartney foi visto completamente enlouquecido nessa última música, agitando os braços e pulando para cima e para baixo como um adolescente. Aliás, como todos nós”, diz ele.

“A banda estava extremamente unida, o som estava ótimo e a vibração no ar não tinha paralelo. Seria uma pena não dividir esses momentos com milhões de pessoas que não tiveram a chance de ver seus heróis ao vivo pela primeira e talvez última vez”.

Jones, Plant e Page: os três velhinhos não foram superados