O povo europeu quer vingança contra os banqueiros

Atualizado em 8 de março de 2013 às 17:07

As pessoas perderam a paciência com os abusivos salários das mesmas pessoas que provocaram a atual crise.

Canary Wharf, o coração do mercado financeiro londrino
Canary Wharf, o coração do mercado financeiro londrino

 

O texto abaixo, publicado originalmente no jornal inglês Guardian, é de autoria do jornalista e escritor Simon Jenkins. Colunista do Guardian e comentarista da BBC, Jenkins dirigiu os jornais Times e Evening Standard.

Os camponeses estão se revoltando por toda a Europa. Querem a cabeça dos banqueiros e estão dispostos a consegui-la. Até agora, a resposta popular à crise financeira tem sido de perplexidade geral e brandura nos castigos exigidos. Os bancos convenceram as populações de que foi tudo um azar do destino. Por outro lado, são grandes de mais para falir e os seus dirigentes bons de mais para pagar pelos prejuízos.

Durante quatro anos, os bancos britânicos receberam quase 500 biliões de libras [cerca de  bilhão de reais] de dinheiro público e novas emissões de moeda. Recuperaram-se bem e mantiveram-se ricos – enquanto todos os demais ficaram pobres.

Os tempos agora estão mudando. Os bancos e os governos não conseguiram, nem uns nem os outros, a recuperação económica. O povo quer vingança e teve-a – paradoxalmente – no Parlamento Europeu.

Ali, foi determinado que os banqueiros da UE não podem receber bonificações superiores aos salários, ou duas vezes maiores, desde que os acionistas aprovem. Isto se aplica a qualquer banco de qualquer território da UE e aos bancos de fora da União que trabalhem no seu território.

Entrementes, um referendo suíço exige que os executivos obtenham a aprovação explícita dos acionistas para a estipulação dos seus salários, com proibição de bonificações de ingresso e de saída. A Holanda está ponderando restringir o limite dos prémios a 20%. Mesmo a não intervencionista Grã-Bretanha tem agora a Associação Nacional de Fundos de Pensões exigindo que os conselhos de administração mantenham os aumentos dos salários dos executivos abaixo da inflação.

O outrora onipresente grupo de pressão da finança europeia foi praticamente neutralizado, dada a escala do escândalo. O governo alemão cedeu ao Parlamento Europeu, por pressão da oposição social-democrata, na sequência da revelação de que o Deutsche Bank tinha cortado 40 milhões de euros na bonificação de um corretor envolvido no escândalo da manipulação das taxas Libor [conhecido em julho de 2012], o que implica um montante original inacreditável.

A campanha suíça do referendo surgiu depois que se soube que a empresa farmacêutica Novartis tinha dado ao seu presidente demissionário um bônus de 72 milhões de francos suíços [cerca de 180 milhões de reais]. Quase 70% dos suíços votaram favoravelmente a nova proposta.

Só na Grã-Bretanha os ministros ainda dançam ao som da música dos banqueiros. No mês passado, os executivos do Royal Bank of Scotland passaram por cima do seu acionista estatal e atribuíram-se 600 milhões de libras em bónus, depois de apresentarem perdas de cinco bilhões de libras no exercício de 2012. O deficitário Lloyds foi aos cofres e deu aos funcionários de topo 365 milhões de libras de prémio. O HSBC, implicado num escândalo de lavagem de dinheiro, anunciou que 78 dos seus executivos londrinos iam levar para casa mais de um milhão de libras cada um.

As sondagens revelam que a opinião pública é esmagadoramente hostil aos pagamentos dos executivos. Só o governo britânico se interpõe entre os muito ricos e uma opinião pública enraivecida. A revolta dos camponeses significa que nem mesmo os ministros britânicos podem desafiar a opinião pública para sempre.

A verdade é que os banqueiros geraram esta sede de vingança durante mais de quatro anos, sem se importar. Desde a década de 1980 e da desregulamentação financeira, acumularam montantes inimagináveis em qualquer outra área de atividade.

Isto não tem nada a ver com mercados livres, exceto no seio de um grupo restrito de gente da alta finança. Os banqueiros modernos auferem “proventos econômicos” explorando cartéis oligopólicos de serviços financeiros. Os bônus astronômicos e assimétricos derivam de dinheiro que pertence na verdade a depositantes e acionistas, que com ele cobrem os riscos. Em qualquer outro negócio, essas bonificações seriam consideradas um roubo à empresa.

Não há associações tão ferozes na defesa dos seus interesses como as das profissões dos ricos.  Os bancos berram que o teto imposto às bonificações fará a sua avidez “sair do país”. Parece um exagero. O mais provável é as atividades mais tóxicas irem embora, e com isso não se perde nada.

Para todos os efeitos, a culpa é dos bancos. Aproximaram demasiado as suas asas douradas do sol e ele as derreteu. Só têm uma coisa a seu favor: a cultura de ganância da City não foi nada comparada com a cultura de inépcia do banco central britânico. Nunca na história econômica britânica se desperdiçou tanto numa causa tão infrutífera. E continua a não se ver nenhum sinal de remorso.