O PSDB é cúmplice dos atos que estão pedindo “intervenção” militar?

Atualizado em 2 de novembro de 2014 às 21:35
Eduardo Bolsonaro, a fina flor do neofascismo, discursa com pistola na cintura
Eduardo Bolsonaro, a fina flor do fascismo de passeata, discursa com pistola na cintura

 

Uma frase de Bertrand Russel, mas também muito divulgada na internet como sendo de autoria de Charles Bukowski, provoca: “O problema do mundo de hoje é que pessoas inteligentes estão cheias de dúvidas e pessoas idiotas estão cheias de certezas.”

Eram entre 4 e 5 mil pessoas cheias de certezas que estavam no vão do MASP neste sábado. Tinham certeza absoluta de que as urnas foram fraudadas, que o Marco Civil Regulatório foi apenas o primeiro passo para uma censura total da mídia, que a desmilitarização da PM é uma conspiração soviética, que o comunismo está em marcha acelerada. “O vermelho não faz parte da nossa bandeira”, gritavam caras pintadas de verde e amarelo e outras pálidas porém maquiadas de indignação.

A página do evento dizia: “Este evento tem lado”, e “quem não concorda pode ir pra Cuba”, nas palavras do organizador Paulo Batista. O lado defendido era o “Fora PT”, isso ficou claro no grito de guerra. A maneira de se concretizar o desejo é que não é unanimidade e alguns querem que isso ocorra da forma mais imediata possível: intervenção militar.

Cinquenta anos após o golpe, a louca do 64 deu as caras nas ruas outra vez. Não parecem ser maioria entre os descontentes com a derrota (estes querem o processo de impeachment), mas não são poucos. E tampouco foram rejeitados. Eram manifestantes que estiveram na reedição da Marcha da Família em março deste ano.

Houve até um princípio de confusão, menos por discordarem da necessidade das forças armadas e mais pela liderança pura e simples do ato.

“Tem que ter intervenção militar total sim, o impeachment não adianta, a Dilma está com os três poderes. É impossível, vamos pensar um pouco: os únicos que podem salvar a nossa pátria são os militares. A gente tem o mensalão, o petrolão, o comunismo sendo pregado. A gente tem tudo para ela cair, tudo” disse Luciano Aquino, de um movimento que se intitula a ‘força de resistência brasileira’.

Se até pouco tempo atrás essa preocupação parecia descabida, esse flerte com a ditadura militar agora assombra. Não se brinca com isso. E ainda que o PSDB agora tente tirar o corpo alegando não concordar com esse devaneio, foi sua apelação para uma auditoria junto ao TSE que provocou essa marola.

Em recente entrevista à Folha de S.Paulo, o professor de filosofia João Carlos Brum Torres demostrava preocupação com essa situação. Para ele, o risco do lacerdismo não viria da liderança do PSDB mas da opinião pública. “Especialmente em São Paulo há uma voz de repúdio absoluto e completo”.

Sem dúvida, em São Paulo o protesto foi muito maior que nas demais cidades e a tal voz demonstrava repúdio, preconceito, xenofobia e desinformação igualmente abolutas e completas. Estranhamente são pessoas rotuladas de ‘gente de bem’, ‘família’.

Porta-voz das tais vozes, Paulo Batista, organizador do evento batizado de “Ou a Dilma cai fora ou São Paulo para”, iniciou os discursos em cima do caminhão de som:

“Faremos justiça arrancando aquela podridão. Fora PT! A Dilma usou os Correios para fazer panfletagem, isso é uma vergonha. Estão aparelhando o judiciário e o legislativo.”

Era só o começo. Depois veio um inflamado Paulo Eduardo Martins, ovacionado:

“Fico feliz de estar aqui numa manifestação que eles jamais imaginaram que a gente conseguiria fazer pois sempre tiveram a segurança do monopólio do discurso (?!), a segurança da hegemonia cultural e política, e isso começa a ser quebrado por gente como vocês que hoje tiveram coragem de sacrificar o seu sábado de sol para vim gritar pelo Brasil, pela liberdade, porque e inegável que está se construindo uma ditadura nesse país. Está na hora da gente decidir se queremos o Brasil de volta ou se aceitamos ser a Venezuela. Hoje somos muitos aqui mas ainda não somos suficientes para barrar os mandos nefastos que essa gente tem para nós. Eles têm dinheiro e não têm caráter algum. O STJ já é o que é. A justiça eleitoral hoje é presidida por um estagiário do PT, o Dias Tofolli. Não dá para confiar tendo um deles na cabeça. Tenho certeza de que este é só o primeiro ato da resistência.”

 

bolsonaro paulista

 

Mas então foi ao microfone Eduardo Bolsonaro, deputado federal eleito com 82 224 votos, sacrificar seu (e meu) sábado de sol. Bolsonaro, aliás, carregava na cintura uma pistola:

“É uma satisfação falar para um público tão seleto porque não tem ninguém recebendo grana para estar aqui. Nós temos que ficar atentos no caso do petrolão. Youssef tem muito ainda a falar. E ele, se Deus quiser, vai ligar o PT aos paraísos fiscais. Mas eles não vão sair facilmente, são outros tempos, não vai ser como no tempo do Collor. Então vamos ficar atentos, eles sempre têm um plano por trás. Atualmente tem a PEC51 que quer desmilitarizar a polícia. Por que? Será que o problema da violência hoje é a militarização da PM? Contem comigo lá dentro, a polícia serve ao povo, não a um partido. Dilma Rousseff fala que se orgulha muito do seu passado mas não fala o que fez: sequestros, assalto a Adhemar de Barros e etc – o povo gritava ‘Dilma terrorista’ – e não queremos uma pessoa desse porte como presidente.

É por isso que durante as eleições eu falava: ‘eu voto no Marcola mas não voto em Dilma Rousseff porque pelo menos o Marcola tem palavra, a Dilma não, fala que vai fazer uma coisa e faz outra’. Sempre tem um projeto com nome muito bonito como ‘comissão da verdade’. Que balela! O PT querendo a verdade? Temos que seguir mobilizados, a guerra só está começando. Tive a oportunidade de morar no exterior, levar uma vida tranquila tendo o trabalho que fosse lá fora, com segurança, com saúde, com educação, seja na Austrália, nos Estados Unidos, mas eu falei ‘não, aqui é minha terra, nós temos que morar aqui’, e como um dia todos nós vamos morrer, eu prefiro morrer lutando por essa causa nobre, nossa liberdade.”

Como tudo pode piorar, vejo a intrépida revolucionária Isabella Trevisani fazendo mais um de seus desabafos ensaiados:

“Eu sou jovem e não quero viver numa ditadura comunista. Estou cansada da Dilma falar que vai trabalhar pelo povo e roubar a gente no petrolão, no mensalão, é dinheiro na cueca… estou cansada de ser roubada, estou cansada de ter minha juventude estragada. A Dilma era para estar na cadeia, guerrilheira comunista. E hoje a gente está aqui contra isso e não saio daqui sem impeachment. Fora Dilma e leva o PT junto, vai para Cuba.” Ao fundo, um coro cantava ‘a direita revida, a direita revida.’

Fico tentando imaginar como a juventude de Isabella está sendo estragada. Ela está bem vestida, limpa, e não parece subnutrida. A gratuidade de sua indignação me leva a sugerir que uma faixa enorme seja esticada diante daquele público: intervenção psiquiátrica já!

 

bolsonaro faixa