O PSDB fica abraçado a Temer porque aposta que o eleitor tem memória curta. Por Willy Delvalle

Atualizado em 14 de julho de 2017 às 15:46
Reunião do PSDB para decidir que o muro é mais gostoso

Uma imagem inesquecível. 12 de maio de 2016. Cerimônia de posse do ministério de Michel Temer. Homens brancos e ricos dominam a cena. Um detalhe chama a atenção. Temer, o vice que assume o lugar da presidente afastada, divide o primeiro plano com alguém que o abraça, sorridente, em comemoração. É Aécio Neves. Antes rival da chapa que o reelegeu a vice, agora é um aliado. O abraço entra os dois entra para a história como o símbolo de uma trajetória semelhante. Aliados delatados pela JBS e denunciados pela Procuradoria Geral da República. Aliados na tentativa de se safar da cassação. Aliados que despencam a cada dia nas pesquisas de popularidade. Aliança que lança o PSDB num dilema pela própria sobrevivência: ficar ou sair do governo Temer?

Desde a explosão da crise que abala a presidência da República, diversas reuniões foram realizadas para tentar definir se o partido desembarca ou permanece. Mas até agora, nenhuma cravou uma decisão. Na Comissão de Constituição e Justiça do Senado (CCJ), cinco tucanos votaram a favor do prosseguimento da denúncia contra Temer. Dois votaram a favor. Uma posição definitiva ficou para agosto. E olhe lá. O presidente interino Tasso Jereissati diz que não tem controle sobre o partido, que desembarca “naturalmente”. Ministro de Temer, Aloysio Nunes grava vídeos na internet defendendo com unhas e dentes a permanência. Parece muito difícil para os tucanos abandonar de imediato um governo com 7% de aprovação popular.

Eleições

“Talvez o partido que tenha mais dificuldades para tomar qualquer tipo de decisão nesse momento evidentemente seja o PSDB”, afirma Rodrigo Gallo, cientista político e professor da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP). “A decisão de deixar o governo Temer agora pode comprometer uma aliança que o PSDB possa precisar ano que vem”, diz.

Gallo aponta que um dos papéis do PMDB na política brasileira tem sido como articulador, compondo governos há décadas. E o mesmo vale para Michel Temer. “Adiar a decisão é uma forma de esperar que o inevitável possa acontecer, como o Temer cair. Aí o PSDB retira o apoio. É esperar até o último momento para tomar uma decisão”, especula. No caso de Temer não cair, desembarcar agora significaria ficar de fora de um governo que continuaria até o ano que vem, ano de eleições.

Para José Álvaro Moisés, professor aposentado de Ciência Política na USP, o PMDB pode não ser tão necessário para o que a conjuntura política do ano que vem precisa. Ele lembra que, sem os pemedebistas, Fernando Henrique foi eleito em 1994 e Aécio Neves chegou próximo dos 50% dos votos em 2014. “Eu não sei se o apoio do PMDB é indispensável para o PSDB, para renovar a perspectiva do que é a social democracia nos dias contemporâneos. Não sabemos nem sequer se o PSDB terá um nome competitivo para 2018”.

Racha

José Álvaro sugere que o partido devesse dar ouvidos à ala dos deputados mais jovens, que defendem o desembarque do governo Temer. Segundo Rodrigo Gallo, o interesse desse grupo de tucanos pode estar em evitar uma dependência perigosa do PMDB.

“Temer foi eleito vice-presidente numa chapa com o PT e ele foi um dos articuladores do processo de impeachment. Será que compensa se aliar a um partido que na história recente se mostrou ‘traidor’ do seu aliado?”

No caso da ala mais antiga, Gallo cita os laços formados historicamente. “Os nomes mais antigos do partido provavelmente, em vários momentos de suas trajetórias políticas, estiveram ligados ao Temer ou ao PMDB”.

2018

José Álvaro afirma que o contexto político brasileiro caminha para uma renovação da política brasileira, de modo que os eleitores vão querer novos nomes, propostas e maneiras de encarar as políticas públicas.

“O grau de deterioração que chegamos até agora foi muito profundo, impacta muito na sociedade, deixando os eleitores muito decepcionados, irados em relação ao funcionamento do sistema político”, atribui.

Nesse panorama, o papel da atual oposição deverá ser o de lembrar a população que o PSDB apoiou a política do governo Temer, afirma Gallo. A aposta do PSDB, segundo o professor, é que a economia volte a crescer. “Se a Reforma Trabalhista demonstrar para o mercado recuperação econômica, o partido vai mostrar que defendia a ponta da recuperação da economia brasileira”, prevê.

A lógica seria de que não importa se o aliado é um presidente extremamente impopular e corrupto, mas o que for feito para aumentar o nível de emprego. “A gente não pode ignorar que o eleitor do Brasil tem memória curta. Daqui até o ano que vem, muitas coisas podem ser esquecidas. O que define de fato as eleições são os 30 dias que as antecedem”, afirma.

Aécio Neves

O PSDB ganhou muitos votos com a candidatura do senador à presidência da República. Mas com os escândalos de corrupção, seu poder poderia ter chegado ao fim. Ledo engano, na visão de Rodrigo Gallo.

“Nós temos a impressão, pelo que a mídia mostra, de que o Aécio é um sujeito que foi descartado. Isso é uma meia verdade. Se ele conseguiu retomar o cargo, se ele continua tendo aliados dentro e fora do Senado significa que ele ainda é um nome forte dentro do partido. Talvez ele não consiga ser eleito para mais nada, mas não podemos descartar que ele continua sendo um articulador dentro e fora do PSDB”, afirma.

Em maio, o senador mineiro chegou a ser afastado do mandato pelo Supremo Tribunal Federal. Um mês depois, conseguiu voltar. Poderoso, também teve arquivado seu processo de cassação. A moeda de troca teria sido o apoio ao governo Temer.

No início da semana, Aécio estava na reunião de tucanos no Palácio dos Bandeirantes, em São Paulo, para discutir os rumos do partido com o governo federal. “Aécio defende o Temer provavelmente porque após o impeachment eles fizeram uma aliança e o Aécio Neves, como presidente do PSDB, conduziu o partido a apoiar o Temer”, acredita José Álvaro.

Eleitor

“Eles se abraçam para tentar se salvar”, diz Fábio Rabello, 25 anos, analista de crédito e estudante de Direito. Para ele, que votou no PSDB para a presidência em 2010 e 2014, os tucanos estão unidos a Temer pela corrupção.

“Creio eu que, com a independência do Ministério Público, do Poder Judiciário, dessa vez vai ser diferente. Não vejo que o PSDB vai escapar, assim como o PT não escapou, nem o Temer. Já está chegando neles também”, observa.

A aliança, na visão de Fábio, diminui a confiança no partido, num impasse que é negativo tanto para os tucanos quanto para o país. “Historicamente, o PSDB é um partido de indecisos, em cima do muro. Na hora do ‘vamos ver’, eles nunca tomam uma atitude”, afirma. Ele lembra a postura do partido no início do governo Collor, num impasse sobre aceitar ou não o convite para ocupar ministérios do alagoano.

“De um lado, Mario Covas era contra. Do outro, Fernando Henrique, Bresser-Pereira e outros políticos eram a favor. Decidiram que o partido não tomaria posição nenhuma. Isso é terrível”, avalia. Para Fábio, o PSDB está sem rumo. “Se afastaram muito de suas origens. É muito cacique para  pouco índio”, opina.

Voto

Fábio diz não se arrepender de ter votado em Aécio, pelo fato de não conhecer na época os casos de corrupção envolvendo o então candidato à presidência. Afirma acreditar que era a melhor proposta. “Na campanha, Dilma Rousseff dizia que o país estava ‘mil maravilhas’ e não estava. Os gastos públicos estavam alarmantes. As coisas iam desandar e deu no que deu”, analisa.

Para ele, se as eleições fossem hoje, Aécio estaria fora de cogitação. “Os envolvimentos e as provas que vêm surgindo são suficientes para mostrar que ele não é aquilo que apresentava para o povo”, aponta.

Diante de um sistema político em ruínas, total desconfiança no Congresso e uma democracia ameaçada, o estudante de Direito propõe que tanto o PSDB quanto os outros partidos afastem quem está comprovadamente envolvido com corrupção.

Em meio a essa desconfiança, nem um “novo” nome como Dória convenceria Fábio. “Acredito que se ele deixar a prefeitura para tentar a presidência da República, vai dar um fim na carreira política dele, um passo maior do que a perna. Até porque a gestão dele até agora não mostrou a que veio, tirando uma coisinha ou outra”, critica.

A aliança com Temer afeta sua confiança no PSDB. Mesmo assim, ele ainda votaria em algum candidato do partido. Mas em quem? “Por enquanto ninguém. Estou sem candidato para 2018”, afirma.