“O PT é frouxo com a velha direita”: Gilberto Maringoni, candidato ao governo de SP pelo PSOL, fala ao DCM

Atualizado em 14 de junho de 2014 às 20:05
Maringoni
Maringoni

 

Aos 55 anos de idade, Gilberto Maringoni é candidato ao governo do estado de São Paulo pelo PSOL. A decisão foi anunciada no dia 18 de maio, encerrando a pré-campanha do professor de filosofia, acadêmico e colunista da Folha Vladimir Safatle, que até então era o favorito do partido. Maringoni, anteriormente, já tentara se tornar vereador nas eleições de 2012, quando conquistou 3841 votos.

Doutor em História pela USP, ele deu aulas de jornalismo na Faculdade Cásper Líbero, publicou pesquisas sobre a Venezuela e atualmente leciona na Universidade Federal do ABC. Também tem uma carreira consolidada como jornalista e cartunista.

Maringoni conversou com o DCM sobre suas chances, seus concorrentes, o legado do PT, a regulação da mídia e, claro, a Copa.

André Singer, que foi porta-voz do primeiro mandato de Lula, fala em esgotamento do petismo. O que é pior: o desgaste do PT ou o fortalecimento de uma oposição neoliberal?

O PT não apenas é frouxo e condescendente com a velha direita, como abriga vários políticos que agem como a direita. Alguns exemplos são Paulo Bernardo, José Eduardo Cardozo, Gleisi Hoffmann entre outros. Você me coloca um dilema sem solução sobre o que é pior.

O PT deveria deixar de adotar políticas e alianças de centro-direita para permanecer no poder? 

Não sei se Lula e o PT deveriam deixar de fazer tais alianças. Não estou mais no PT. Mas o problema não são as alianças. É o rebaixamento programático que muitas vezes se faz para consolidar uma aliança. Sobre a esquerda petista, há muita gente boa lá. Também não conheço em detalhes a vida interna da agremiação para opinar a respeito.

Por que ocorre a polarização PT-PSDB?

São partidos com real inserção na sociedade brasileira. No entanto, quanto mais o tempo passa mais seus programas se igualam.

Como foi o processo de seleção do PSOL para sua escolha como candidato ao governo do estado?

Fui convidado por vários dirigentes após ter a informação da desistência do professor Vladimir Safatle, que era uma unanimidade no partido para estas eleições. Nunca entendi direito o que ocorreu. Eu nunca concorri contra ele, que é um dos mais brilhantes intelectuais de sua geração, com forte presença nos debates públicos. E fui aprovado pelo Diretório Estadual de São Paulo para me apresentar à Convenção do PSOL, que ocorrerá neste domingo (15).

Quais são as propostas principais do senhor com o PSOL?

O centro de nossa ação é fortalecer o caráter público e democrático do Estado. Isso passa por desprivatizar suas ações e reduzir o papel no grande capital privado nos negócios da administração.

Como foi o desempenho do governador Alckmin durante a greve dos metroviários em São Paulo, na sua opinião?

O governador Alckmin, que deixa um legado de desinvestimento no metrô ao longo dos últimos 20 anos, tem um comportamento típico de oligarca da República Velha. Trata a questão social como caso de polícia. Não dialoga, não busca entendimento e tenta criminalizar o movimento. Seu comportamento é uma das coisas que mais envergonham o Brasil.

Uma das grandes crises mais recentes em São Paulo foi a da falta d’água no Sistema Cantareira. Como o senhor pretende mudar isso se for governador?

Há vários relatórios nos últimos 10 anos apontando problemas no abastecimento. A Sabesp não fez os investimentos necessários. E por que não fez? Por trabalhar na lógica das empresas privadas. Parte considerável de seus lucros vai para os acionistas privados. Isso não se modifica apenas com investimento, mas com uma política de retomada do controle total da empresa por parte do poder público. Serviço público não é compatível com lucro privado.

 

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Aécio Neves é um candidato forte à presidência? 

Aécio, há anos, é blindado pela grande mídia. Em Minas, isso chega a ser caricato, pelo poder que o governo estadual tem diante dos meios de comunicação. Aécio é o típico candidato da direita que se diz moderninha. Tem uma pinta de mauricinho e diz que tomará medidas amargas em seu governo. Tais medidas são sempre contra os de baixo. Nunca ouvi ou li um pensamento por parte de Aécio que fugisse das obviedades conservadoras que pululam pela sociedade.

Como avalia Paulo Skaf? Ele atrapalhará as eleições? E Alexandre Padilha?

Skaf atrapalha quem? Ele está em segundo lugar nas pesquisas, alavancado pela máquina do PMDB e da Fiesp. É um candidato do setor empresarial paulista, que já teve melhores dias aliado de um setor da direita pemedebista. Sobre Padilha, eu não o conheço pessoalmente. Sua gestão no ministério da Saúde, tirando o programa Mais Médicos, é tímida. Não enfrentou os planos de saúde…

O senhor apoia a iniciativa do prefeito Fernando Haddad na expansão dos corredores de ônibus?

Sim, apoio. É uma iniciativa positiva. Mas não basta. É preciso, aqui também, que o poder público opere parte do sistema. É preciso recriar uma empresa nos moldes do que foi a CMTC.

Quais são suas propostas para o transporte público? Dizendo de maneira concreta e com números, se possível.

Transporte público se divide em pelo menos três modalidades na cidade de São Paulo: metrô, trem e ônibus. Só as duas primeiras são de responsabilidade do estado. Ônibus são da alçada da prefeitura. O metrô ficou mais de 20 anos quase sem investimentos. O ritmo de construção diz muito sobre a dinâmica dos investimentos.  Nos primeiros 17 anos de operação – entre 1974 e 1991 – foram implantados 57 quilômetros de linhas. Um ritmo de 3,35 quilômetros por ano. Nos 22 anos seguintes – entre 1992 e 2014 – foram assentados apenas mais 18 quilômetros. Aqui, o ritmo desabou para 770 metros por ano. O que é preciso? Investimento e a desprivatização do sistema.

O senhor mantém diálogos com movimentos que cresceram nas Jornadas de Junho, como o Passe Livre?

Sim, o PSOL mantém.

Qual é o seu balanço sobre os protestos no Brasil, de junho de 2013 até junho de 2014? Quais foram os acertos? E quais foram os erros?

Foi um momento de virada na conjuntura dos movimentos sociais. Tiveram um caráter espontâneo muito forte. Vale ressaltar que agora eles mudaram de qualidade. Estão nas categorias e nos setores organizados, o que é ótimo.

O que acha dos black blocs?

Os black blocs primam por uma ação individual e acima dos movimentos organizados. São autoritários, individualistas e criam situações propícias para a infiltração policial. A esquerda não pode ter nenhuma condescendência com eles. Eles atrapalham as mobilizações sociais.

Falta uma alternativa à esquerda na política brasileira?  

Nós do PSOL estamos tentando construir uma dessas alternativas. O Brasil precisa de uma esquerda viva e atuante.

O senhor leu “O Capital no século 21” de Thomas Piketty? O que pensa sobre o livro?

Não li o livro do Piketty, mas acho muito importante a polêmica armada em torno da obra. Ele não é um homem de esquerda e acha que o capitalismo regulado é a saída para as crises contemporâneas. Sobre a retomada de conceitos marxistas, acho muito positivo. Marx e seus seguidores estudaram profundamente a economia capitalista. Ninguém, como ele, fez uma crítica tão radical e profunda da sociedade capitalista.

Qual sua opinião sobre a regulação da mídia?

É absolutamente essencial regular a mídia. No jornalismo impresso, precisamos de uma lei que garanta o direito de resposta. Em TV e rádio, é necessário regular de forma mais abrangente, pois se tratam de concessões públicas. O que se quer? A base de tudo é a Constituição de 1988. E a publicidade oficial precisa ter sua veiculação reexaminada. Neste aspecto, o PT em 12 anos nada fez.

Como o senhor se sente concorrendo ao governo com poucas chances de ganhar?

Eu me sinto muito bem. Sempre digo: Mesmo com chances pequenas, sou agora um dos seis únicos paulistas que pode chegar ao Palácio dos Bandeirantes. Minha intenção é contribuir para um debate programático mais claro.

Está vendo os jogos da Copa?

Vou assistir os jogos em casa. A Copa é um evento privado, mas sua realização aqui no Brasil implica inúmeras ilegalidades. A pior delas é a violação da soberania nacional. Mas não sou contra a Copa em si.

 

Ilustração feita por ele
Ilustração feita por Maringoni