“O que empurrou o PSDB para a direita foi o 1º governo FHC”, diz o líder do grupo Esquerda pra Valer. Por José Cássio

Atualizado em 17 de fevereiro de 2016 às 7:53
Montoro, Covas e FHC na fundação do PSDB
Montoro, Covas e FHC na fundação do PSDB

 

A social democracia idealizada como modelo político por Franco Montoro continua fiel às suas origens?

O DCM foi buscar essa e outras respostas com um dos líderes do “Esquerda Pra Valer” (EPV), corrente política que atua promovendo o que dizem ser a “uma guinada para a esquerda” dentro do PSDB. Para o deputado federal mineiro Eduardo Barbosa a resposta é: “Sim e não”.

Sim, porque o PSDB prega no seu estatuto a vocação de um partido que defende a justiça social e entende o papel do Estado como “provedor” de políticas púbicas básicas, como a assistência à saúde, educação e defesa das minorias. E não porque ao longo dos anos acabou atraindo um público dissonante desta ideologia.

“Não vou citar nomes, mas não me sinto confortável com a minha bancada nesta Legislatura”, diz o deputado, referindo-se a parlamentares ligados a doutrinas religiosas, policialescas, preconceituosas e que pregam um modelo econômico liberal incompatível com o partido que surgiu ¨longe das benesses do poder, mas perto do pulsar das ruas”.

Na opinião do deputado, não foi a chegada do PT ao poder, com Lula, que empurrou o PSDB para a direita, mas sim o primeiro governo de FHC (1995-1998). “Naquele período havia a necessidade de uma reestruturação da economia, por causa da forte inflação”, diz ele. “A tarefa foi feita, mas ficamos presos à imagem de um partido ligado ao setor econômico e de doutrina liberal”.

Isso, somado à decadência das lideranças conservadoras, exemplos de Antônio Carlos Magalhães no Nordeste e Paulo Maluf, em São Paulo, acabou, segundo o deputado, “atraindo” os órfãos da direita para dentro do partido.

Eduardo Barbosa é taxativo com relação aos líderes dos movimentos de ultradireita Kin Kataguiri (MBL) e Rogério Chequer (Vem Pra Rua). “Eu não abonaria a ficha de filiação deles no PSDB”, diz. “Professam conceitos equivocados e que não representam os nossos valores. Recebê-los seria ampliar o que já está ocorrendo com a nossa bancada”.

A defesa dos direitos humanos é outra bandeira defendida pelo “EPV”. Aproveito para perguntar sobre as recentes cenas de violência promovidas pela PM nas manifestações estudantis em São Paulo e contra os professores em Curitiba. “O caso do Paraná eu não acompanhei, então fica difícil comentar, mas em São Paulo o que houve foi um erro de interpretação e condução que acabaram resultando em violência”, diz Eduardo Barbosa.

Na opinião dele, em conflitos assim as autoridades tendem a imaginar situações fora da realidade. “O erro foi pressupor que havia um movimento black bloc infiltrado nas manifestações dos estudantes”, diz o deputado. “Não era o caso e o resultado prático foi uma violência injustificada”.

O médico pediatra nascido na pequena Pará de Minas, 90 quilômetros à Oeste de Balo Horizonte, está no sexto mandado como deputado federal. Conta que já foi petista, embora não filiado. “Quem quando estudante não se empolgou com os movimentos da massa liderados por Lula?”, diz, rindo. Sobre Dilma, tem opinião divergente do Esquerda Pra Valer: ele é a favor do impeachment. “Na realidade, o que eu defendo é a renúncia da presidente”, diz.

Sobre corrupção na política, e quando perguntado sobre o envolvimento de Aécio Neves nos escândalos de Furnas, fala em falsa moral. “Uma coisa é a corrupção. Outra, bem diferente, é o caixa dois de campanha”, diz.

“Negar o caixa dois é acreditar em história da carochinha. Ele faz parte da história política do país e se estende das campanhas de vereadores à de presidente da República. O problema é falsa moral da própria sociedade: quem apoia uma determinada liderança procura evitar que o adversário saiba – e isso ao longo do tempo gerou um círculo vicioso”.

Sobre seu conterrâneo, diz se tratar de um líder progressista com capacidade para perceber as preocupações centrais da sociedade. Na comparação com o governador de São Paulo, com quem Aécio divide a preferência dos tucanos na corrida pela presidência em 2018, diz que Geraldo Alckmin tem um perfil mais ligado no contato com o movimento popular. “A história do Aécio é diferente. É um progressista que tem um estilo leve de fazer política”, diz, desconsiderando o ódio que o senador tem disseminado na sua obsessão pela presidência da República.

Sobre o assunto que está mobilizando os debates no PSDB, as prévias para a escolha do candidato do partido à prefeitura de São Paulo, Eduardo Barbosa diz simpatizar com os três candidatos, embora sua preferência seja por dois: Ricardo Tripoli, seu colega na Câmara dos deputados, e Andrea Matarazzo, de quem só conhece a história. “O Tripoli eu conheço pessoalmente e sei das suas qualidades”, diz. “Com relação ao Andrea se trata de alguém que tem história no partido e experiência na vida pública”.

O candidato de Geraldo Alckmin, João Doria, que o deputado diz conhecer pessoalmente, é uma surpresa. “É um empresário de sucesso, que lida com dinheiro de uma forma glamorosa, o que pra nós é um pouco aberrante”, diz. “É por melhor que seja, está acostumado com uma vida de aplauso, e na política vai aprender que esses momentos são raros. Pelo contrário, terá de conviver com críticas e forte pressão”.

Com relação ao legado de Montoro, que idealizou uma sociedade justa e escancaradamente democrática, e concretizou o sonho na forma de um partido político, Barbosa diz que há muito a construir.

“Temos uma juventude imediatista e pouco reflexiva. De outro lado temos uma carência de lideranças que se soma a um pluralismo de ideias tão difusas que sinceramente não sei onde vai dar. Nosso papel é aprofundar o debate de forma a reencontrar o espírito que nos foi legado por aqueles que puseram de pé um partido focado na justiça e na liberdade”.