O rock não devia mais ter mártires como Chorão

Atualizado em 7 de março de 2013 às 12:14

Os saudosistas estão dizendo que sua morte é a alma do rock porque não são eles que são enterrados.

Chorão. RIP.
Chorão. RIP.

O vocalista do Charlie Brown Jr., Chorão, teve uma morte anunciada. Separado da mulher, estava com depressão, segundo sua prima, a colunista Sônia Abrão, e morava sozinho num apartamento que, de acordo com a polícia, não tinha móveis e condições de higiene. Foi encontrada cocaína em vários lugares, assim como garrafas vazias de cerveja, energéticos, vinhos etc.

Amigos próximos se diziam preocupados há meses. Chorão, o apelido de Alexandre Magno Abrão, era um tipo difícil, que andava isolado. Trancava-se no camarim após os shows e permanecia horas ali, eventualmente com apenas uma pessoa. Sua equipe ficava transtornada.

De temperamento explosivo, teve várias encrencas. Quebrou o nariz do cantor do Los Hermanos após um bate boca no aeroporto – Marcelo Camello brincou com o fato de Chorão ter feito uma propaganda da Coca-Cola (como se isso fosse um grande problema, aliás). Brigou com uma garota que estava na plateia do programa de Serginho Groisman pelo mesmo motivo. Atropelou três adolescentes em Santos. No ano passado, passou 7 minutos dando um sermão no baixista de sua banda, Champignon, no palco, porque ele teria voltado para o grupo “por dinheiro”.

Ele tinha 42 anos, um filho de 23 e conseguira juntar um patrimônio razoável. Além da banda, tinha uma pista indoor de skate em Santos, sua cidade do coração. Mas seguia o protocolo de seus ídolos autodestrutivos. Sexo, drogas e rock’n’roll. Ninguém viu no que ia dar? Provavelmente, sim. Havia o que fazer? Talvez não.

É uma morte,  digamos, fora de moda. Até meados dos anos 90, roqueiros morriam como moscas em circunstâncias parecidas. É um clichê. O último dos grandes a ter esse destino foi o baixista do The Who, John Entwistle, que não resistiu a uma noitada de pó e garotas de programa num quarto de hotel em Las Vegas, em 2002. Um clássico. Depois dele, a história que mais repercutiu foi a do fundador do Slipknot, Paul Gray, com uma superdose de morfina em 2010.

Os saudosistas estão dizendo que isso é rock de verdade, seja lá o que significa. Os saudosistas precisam de mártires porque não são eles que vão para o caixão. E então os saudosistas escrevem sobre a pureza da arte, sobre os artistas que não se vendem ao sistema, e vão para casa comer lasanha.

Chorão será lembrado por seus fãs pelo som pesado e competente que fazia, mistura de hip hop e hard rock, pelas letras que, paradoxalmente, eram entendidas como lições de vida – e pela morte trágica, evitável e fora de época.