O verdadeiro povo foi às ruas em Salvador. Por Nathali Macedo

Atualizado em 19 de março de 2016 às 18:45

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A onda de fascismo que tem sido perigosamente despertada no Brasil – e, aliás, não é de hoje – conseguiu, pela primeira vez desde 64, instalar na população uma tensão política angustiante.

Ninguém, de fato, tem passado bem ao ver grupos fascistas – como os carecas do ABC, por exemplo – marchando ao lado dos chamados cidadãos de bem inconformados diante da realidade, para eles triste, de inclusão social que lhes bate à porta.

Depois do episódio antes risível e agora preocupante – pela violência cada vez mais explícita que o fascismo tem espalhado – das manifestações pró-golpe, nós precisávamos de um bálsamo que nos devolvesse o sentimento de que o povo ainda está atento, de que aqueles que compõem o verdadeiro povo ainda saem de suas casas e manifestam sua opinião.

E foi isso, principalmente, que as manifestações em defesa da democracia me devolveram hoje. Milhares de pessoas nas ruas, incansavelmente. Gritos que não foram calados pela onda de ódio que se alastra desesperadoramente.

Hoje, de fato, havia povo nas ruas. Homens, mulheres (muitas mulheres), negros (muitos negros), a comunidade trans e LGBT, jovens, velhos, pessoas de todos os cantos do estado – todos aqueles que são, de fato, povo brasileiro. Nenhum adereço carnavalesco, nenhuma babá vestida de branco, nenhum banquete de filé mignon, e, principalmente, nenhuma marionete do golpe.

Não, eles não foram. A guerra política antes tímida e agora feroz que o Brasil vivencia não se manifestou nas ruas de Salvador no 18 de março, porque os pró-golpe estavam reclusos em suas casas.

Queria acreditar que a ausência – talvez possamos chamar de recuo – tenha se dado por respeito, mas é difícil ao acompanhar as agressões irracionais àqueles que não se manifestam contra o golpe que tenta se anunciar.

Outra possibilidade, entretanto, me parece coerente:

Hoje havia povo nas ruas. Cara de povo. Cheiro de povo. Gritos do povo. As mulheres de grelo duro, a juventude politizada, o negro da periferia: tudo que a elite detesta.

Porque dividir o mesmo ar com a negraiada e os “comunas” se eles podem desfilar confortavelmente na orla, com cerveja e champanhe?

Você sabe, eles não se misturam.

Todos aqueles rostos combativos na luta pela democracia seriam suficientes para me acalantar diante de tanta tensão, mas houve ainda um bônus excepcional que ratificou a minha certeza, já concretizada, de que estou no caminho certo.

Um morador de rua dirigiu-se a um dos manifestantes com os quais eu conversava, parada numa rua após o fim da manifestação: “A sua luta também é a minha luta! Você quer apanhar de militar? Você quer? Eu não quero. É nós”.

Voltei pra casa com muito mais do que o sentimento de dever cumprido, mas a certeza otimista – e quem pode me condenar por isso? – de que o fascismo pode ser combatido pela força de quem jamais se calará.

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