O voyeurismo indigente dos turistas que fazem safári humano na Rocinha. Por Kiko Nogueira

Atualizado em 25 de setembro de 2017 às 16:05
Turistas são impedidos de entrar na Rocinha ocupada pelo Exército

Um grupo de vinte turistas franceses foi à Rocinha levado por um profissional da empresa Favela Tour, especializada no ramo.

Por razões óbvias, não puderam entrar. Ficaram na passarela projetada por Oscar Niemeyer tirando fotos e fazendo selfies.

Segundo o Globo, uma moradora comentou: “É uma sensação estranha! Parece que somos seres de espécie diferente. Nem com um clima desse que estamos vivendo agora os turistas deixam de visitar a Rocinha”.

Esse tipo de “turismo” é comum e rende dinheiro. É um safári humano, que mistura voyeurismo com um grau baixo de idiota e falta de empatia.

Na Colômbia, por exemplo, o passeio para as Islas del Rosario, no Caribe, é atravessado por favelas.

Os barqueiros param próximos a um píer numa delas, de onde meninos magros e pobres dos barracos saltam.

Eles nadam até perto da embarcação e gritam: “Amigo, amigo! Dinheiro, amigo! Money!” O pessoal, rindo, arremessa moedas na água.

Quando os garotos não conseguem pegá-las na superfície, eles, bons mergulhadores, um tanto desesperados, vão em busca delas no fundo. Lembram os “peixinhos” do imperador Tibério em Capri.

Os turistas, provavelmente, acham que fazem uma boa ação. Ou não acham nada. Se refletissem, veriam que não passa de um show de humilhação.

A Rocinha tem jipes que perfazem um roteiro organizado por gente da “comunidade”. Tudo com a autorização do tráfico. A África do Sul tem tours no meio da miséria do Cape Flats e para o Soweto, em Johannesburgo.

Existem dezenas de agências especializadas em passeios por “comunidades carentes” do Rio.

Ao invés de elefantes e girafas, as pessoas fotografam gente subindo e descendo as vielas, os bares “pitorescos”, ouvem uma batucada, tomam uma cachaça, procuram sexo.

Ao voltar para casa, o sujeito tem uma história para contar sobre como sobreviveu num dos lugares mais perigosos do mundo. Ou acha que, sei lá, fez antropologia e conheceu o “Brasil real”.

Existe um interesse legítimo em usar o turismo para ajudar. O nome que se deu a isso é “volunturismo”. O viajante se engaja em atividades sociais ou ambientais.

O que é bem diferente de assistir de camarote, com uma câmera na mão, num esquema com traficantes, aos miseráveis, atirando-lhes esmolas como se fossem sardinhas para focas, achando que essa é uma contribuição para um mundo mais bacana, ou só mais uma diversão incluída no pacote.