‘Entrevista com Escritores Mortos’ 7: Anthony Trollope

Atualizado em 3 de julho de 2015 às 18:34
Anthony Trollope
Anthony Trollope

A “entrevista” abaixo faz parte de nossa série “Conversas com Escritores Mortos”. Nosso sétimo entrevistado (seguindo Liev Tolstói, Giacomo Casanova, Virginia Woolf, Sêneca, Colette e Rainer Rilke) é o romancista inglesa Anthony Trollope (1815 – 1882).

Mr. Trollope, o senhor foi um romancista excelente – um dos maiores do século XIX. Poderia nos oferecer alguns conselhos de como escrever um bom romance?

Um bom romance deve ser ambas as coisas (realista e sensacionalista) e ambas no mais alto grau.

Como assim?

Que haja verdade – verdade de descrição, verdade de caracterização dos personagens, verdade humana quanto a homens e mulheres. Se houver essa verdade, não creio que um romance possa ser sensacionalista demais. Mas é importante ressaltar que, de todas as características que um romance deve ter, a mais importante é ser legível. Isto é, sem passagens muito entediantes nem excesso de descrições.

Compreendo. E quanto a criação de personagens?

Os personagens devem estar com o autor quanto este se deita para dormir, quando desperta de seus sonhos – ele tem que aprender a odiá-los e a amá-los. Deve saber se são frios ou passionais, verdadeiros ou falsos, e falsos até que ponto e verdadeiros até que ponto. A estreiteza e a baixeza, a profundidade e a expansão de cada um têm que estar claras para ele.

O senhor lia muito?

É claro. O hábito da leitura, eu afirmo categoricamente, é o prazer mais puro e perfeito que Deus preparou para suas criaturas. Ele se conserva quando todos os outros prazeres desvanecem. É capaz de consolá-lo quando todos os outros entretenimentos se forem. E dura até a sua morte. Irá transformar suas horas em momentos agradáveis enquanto você estiver vivo.

Concordo.

E o que, em todo o mundo, pode ser mais luxuoso do que um sofá, um livrinho e uma xícara de café? Há algo mais civilizado que isso?

Não existe nada mais civilizado que isso. Mudando de assunto, Hetta Carbury e Paul Montague formam um dos casais mais adoráveis da literatura. O senhor sempre foi romântico?

Quanto a isso, eu só posso lhe dizer uma coisa: Não deixe o amor interferir com seu apetite. Nunca interferiu com o meu. É o conselho mais útil que já recebi em toda a minha vida.

Faz sentido.

O amor é complicado. Podemos vê-lo por um prisma mais simplificado, e daí dizemos que o amor é como qualquer outra luxúria – você não tem direito a ele, a não ser que pague bem caro por isso. Sempre digo que aqueles que tem coragem de amar deveriam ter coragem de sofrer. Mas eles não tem, e esperam que o esplendor dure eternamente. Não dura. Aqueles que se amam costumam se repelir, mais cedo ou mais tarde.

Hmmm…

Tenho uma teoria particularmente curiosa sobre o amor: acredito que os homens raramente amam. Um homem pode admirar, gostar, se apaixonar e ter alguém apaixonado por ele. Ele pode estimar e aprovar, talvez até venerar. Ele pode conhecer uma mulher que é parte dele mesmo – a parte mais sagrada, e portanto irá protegê-la dos ventos mais fortes. Mas tudo isso não faz com que ele a ame. Um homem não pensa que separar-se de uma mulher é como se fosse deslocado de si mesmo. O homem tem apenas um centro, e é ele mesmo. A mulher tem dois. Mesmo que ignore o segundo, ele continua sendo metade de sua existência. Se ela realmente ama, nunca deixa de amar.

Comovente – mas me tira as esperanças, de certo modo.

Não tenha esperanças. Não existe felicidade no amor, exceto no final de um romance inglês. Digo por experiência própria – veja meus romances, por exemplo! O final de um romance, tal como o final de uma festa de aniversário infantil, deve ser repleto de docinhos, caramelos e ameixas açucaradas.