Por que o Marco Civil da Internet está sendo empurrado com a barriga

Atualizado em 17 de outubro de 2014 às 17:30

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Há três semanas seguidas que o assunto fica para a próxima.

Encalhado no Congresso há mais de dois anos, após o “escândalo” Edward Snowden a presidente Dilma Rousseff jogou o PL do Marco Civil em cima da mesa da Câmara com o carimbo “urgente” em letras garrafais. Henrique Alves declarou então que a Câmara não poderia ficar com a pauta trancada por nem mais um dia, ainda assim precisou adiar de semana em semana alegando falta de consenso. Seria votado hoje, não será mais.

O que está por trás dessa lenta condução com a barriga tem muito menos relação com a complexidade do que chamam de “a constituição da internet” em que direitos e deveres entre usuários e provedores de internet serão balizados e muito mais com um enorme e tentador balcão de negócios.

Operadoras de telefonia é que estão emperrando a votação e estão muito menos preocupadas com a liberdade de expressão do que com a oportunidade de transformar a internet em um produto semelhante ao das TVs pay-per-view. É aí que o tal consenso ainda não foi atingido: no modelo de negócio. Depois disso, para elas tanto faz se os dados deverão ser armazenados no Brasil ou em Kuala Lumpur, se poderemos ver fotos pornográficas ou se o bullyng irá regredir. O mais importante é que já estaremos algemados.

É de suma importância que não haja qualquer tipo de criação de “pacotes” que concedam acesso a determinados conteúdos da internet e é por isso que essa votação deve ser acompanhada muito de perto. A TV está com os dias contados e não se pode permitir que seu modelo se repita na internet.

Ontem, o relator do projeto lei, deputado Alessandro Molon (PT/RJ) apresentou mais um “texto final” com o intuito de fortalecer o princípio de neutralidade de rede. Entretanto, isso não garante que aprovação do artigo mais espinhoso. “Se quiserem votar amanhã (hoje), estou pronto. Se quiserem adiar para terça ou quarta da próxima semana, também. Só acho que o projeto precisa ser votado ainda este ano”, disse o deputado.

Ainda este ano? Está difícil acreditar. Além do lobby das empresas, a bancada do PMDB também vem se colocando contra a neutralidade.

Para quem hoje está na faixa etária dos 20 anos, a internet é algo que acompanha sua vida desde sempre (já são 105 milhões de internautas brasileiros), portanto é curioso que ainda não exista uma regulamentação sobre o tema. A proposta do marco civil traz, entre outros, os princípios da garantia da liberdade de expressão, a proteção da privacidade e dos dados pessoais e a neutralidade da rede. Alguns dos direitos dos usuários que constam no projeto são:

·        Informações claras e completas nos contratos;

·        Controle sobre os dados pessoais;

·        Inviolabilidade e sigilo das comunicações;

·        Manutenção da qualidade contratada da conexão;

·        Não suspensão da conexão à internet salvo por débito.

Entre as obrigações do provedor de internet estão inclusas a guarda sob sigilo dos registros de conexão do usuário pelo prazo de um ano e a garantia de que o provedor só poderá fornecer acesso a esses dados mediante ordem judicial.

O Marco Civil da internet é um projeto construído através de uma colaboração inédita envolvendo Estado e sociedade, tornando-se modelo de legislação progressista, elaborado para proteger a liberdade da internet e de seus usuários a partir das garantias de neutralidade da rede. É o texto original que deve ser respeitado. O lobby corporativo vem sendo o entrave, tornando o processo de negociação em algo não transparente.

Permitir o controle da rede é perpetuar o Homer Simpson passivo espectador da TV, massa de manobra para grandes grupos. A internet deve ser livre, como aliás, já é hoje.