Por que o pedido de prisão dos réus do Mensalão vai dividir o STF novamente

Atualizado em 17 de outubro de 2014 às 17:36
Valério
Valério

A retomada no STF das sessões da ação penal 470,  o processo do Mensalão, ganhou uma nova tensão com o requerimento pelo início do cumprimento imediato da pena de prisão, feito pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Ele quer que 23 dos 25 condenados na ação penal iniciem imediatamente o cumprimento de suas penas de detenção.

A considerar as declarações de alguns ministros, a questão parece que irá dividir, novamente, o STF.

O princípio que estará no centro do debate é o da presunção de inocência (art. 5º, LVII, da Constituição da República), que estabelece que ninguém pode ser considerado culpado até uma sentença penal condenatória irrecorrível. De modo simplificado, isso significa que, enquanto estiver pendente algum recurso, o réu não pode iniciar o cumprimento da pena, porque é considerado inocente para efeitos legais.

Enquanto não for definitiva a condenação, apenas pode o acusado ser detido se for decretada uma prisão processual (temporária ou preventiva), que só é cabível se houver necessidade, por risco real de fuga ou se o réu estiver atrapalhando a produção de provas, por exemplo. Não é esse o caso dos réus do mensalão.

O que se discutirá no caso do Mensalão é a possibilidade de início de cumprimento parcial da pena, ou seja, a parte da que é definitiva.

Alguns réus, como já expliquei aqui, terão direito aos embargos infringentes. Acontece que esse recurso apenas permite a discussão de parte da condenação, ou seja, os casos de condenação que tenham tido quatro ou cinco votos pela absolvição. Muitos réus foram condenados por mais de um crime e apenas contra a condenação de um dos crimes (“quadrilha ou bando” ou “lavagem de dinheiro”) cabem os embargos infringentes. Isso significa que a condenação pelos crimes que não permitem recurso são definitivas.

Marcos Valério foi condenado a 40 anos, 4 meses e 6 dias de reclusão por oito crimes. Apenas a condenação por crime de quadrilha ou bando poderá ser mudada, o que significa que a pena de 38 anos, 1 mês e 6 dias é definitiva. A eventual absolvição por crime de quadrilha ou bando não interferiria no regime inicial, que continuaria sendo o fechado.

Em outros casos a situação é diversa. José Dirceu foi condenado por corrupção ativa e por quadrilha ou bando a pena de 10 anos e 10 meses, com início em regime fechado. A condenação por corrupção ativa a pena de 7 anos e 11 meses é definitiva por ter sido por 8 votos a 2. Acontece que se Dirceu for absolvido por crime de quadrilha, seria possível, embora não obrigatório, a fixação de regime semiaberto para o cumprimento dos 7 anos e 11 meses. Isso significa que a condenação por crime de corrupção ativa não é definitiva, já que o regime inicial pode ser mudado de fechado para semiaberto.

Há, portanto, duas situações diferentes.

Em casos como o de Marcos Valério, penso ser imprevisível a decisão do STF. Entendo que uma decisão pelo início do cumprimento da pena seria possível, pois não significaria afronta ao princípio da presunção da inocência.

Nos casos, porém, em que o julgamento dos embargos infringentes pode interferir no regime inicial de cumprimento da pena, como Dirceu, seria uma afronta à presunção da inocência o início de cumprimento imediato. Basta pensar no absurdo que seria ele iniciar a pena por corrupção ativa em regime fechado e, depois, ser absolvido por quadrilha e o STF fixar o regime semiaberto. Ele teria permanecido indevidamente meses em regime fechado.

Há, também, a possibilidade de que o STF entenda que, enquanto houver algum recurso pendente, o início do cumprimento da pena seja impossível.