UFMG mantém exposição sobre a ditadura ameaçada por falta de verba. Por Joaquim de Carvalho

Atualizado em 31 de julho de 2017 às 19:36
Manifestação pela exposição sobre a ditadura: esquecer jamais.
Ditadura pode não ser só de militares: algo soa familiar?

A Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) prorrogou por mais um mês a Exposição “Desconstrução do Esquecimento: Golpe, Anistia e Justiça de Transição”.

Foi uma vitória de manifestantes da esquerda do Estado, que acusavam o governo federal de bloquear verbas do evento e, com isso, inviabilizar a continuidade da exposição.

Em carta enviada a Betinho Duarte, do coletivo Alvorada, o reitor da universidade, Jaime Arturo Ramírez, disse: “Cientes da importância desta exposição para a UFMG e o nosso país — em especial em momento tão adverso da nossa vida política, social e econômica –, é com grande satisfação que informamos que a exposição será mantida no Centro Cultural até 31 de agosto, para que ela possa cumprir, assim, o papel para o qual foi concebida: não deixar que nos esqueçamos jamais!”

A mostra foi montada em cinco salas da galeria Aretuza Moura, do Centro Cultural UFMG, no centro de Belo Horizonte, e reúne obras inéditas de oito artistas.

Um dos primeiros visitantes foi o servidor aposentado Inani Campos, expulso da UFMG e perseguido por sua atuação política contra a ditadura.

Depois da visita, segundo registro o site da UFMG, ele disse ter revivido sentimentos do passado. “Essa exposição me faz lembrar que nenhum povo se liberta se não conhecer, se não tiver memória social, se não conhecer sua história”, afirmou.

A declaração lembra um movimento que ocorreu nos anos 70 na Alemanha (na época, a Alemanha ocidental), quando, incentivado pelo governo social-democrata, a população começou a discutir abertamente o que tinha representado o nazismo.

Hoje, em muitas cidades alemãs, locais de referência do nazismo são marcados com placas, como os locais onde eram presos judeus, as instalações da SS e outras das quais os alemães não mais se orgulham.

Foi um acerto de contas com o passado.

No Brasil, por iniciativa do ativista Jair Krischke, a Prefeitura de Poro Alegre e o movimento de direitos humanos tentou marcar com pedras locais onde houve torturas e prisões arbitrárias durante o regime militar.

Jair foi procurado por oficiais do Exército, entre os quais o general Sérgio Etchegoyen, hoje ministro de Michel Temer, responsável pelo Gabinete de Segurança Institucional, que perguntou: “O senhor não vai colocar nenhuma pedra na frente dos meus quartéis, vai?”.

Jair respondeu: “Não sabia que o senhor tinha quartéis. Pensei que fossem da república”. A conversa durou mais de cinco horas, e o resultado é que os quartéis onde houve prisões políticas não foram marcados com as pedras.

A preocupação com o esquecimento é que levou os manifestantes de esquerda de Minas Gerais a se mobilizarem para que a exposição continuasse.

Na sexta-feira da semana passada, artistas que participam do coletivo Alvorada realizaram a manifestação em frente ao Centro Cultural.

Um dos artistas apresentou uma instalação em que se colocou como um torturado no pau de arara, nas mesmas condições descritas por vítimas da ditadura militar.

O coletivo Alvorada também instalou faixas. Uma delas dizia: Pela Democracia, Exposição Fica”. Outra lembrava: “Uma ditadura pode assumir diversas formas. A militar é uma delas”.

No fim de semana, quando foram informados da continuidade da exposição, os manifestantes comemoraram. Alguns choraram.

Parece uma conquista pequena, mas, para quem conhece a diferença entre ditadura e democracia, um passo adiante é sempre comemorado, principalmente quando se tem à frente autoridades tentando impedir a passagem e, mais do que isso, convidando para a volta a um passado tenebroso.

Os dias eram assim.