Cara Damares,
Sei que não sou, nem de longe, o tipo de mulher que lhe apraz.
Sou feminista, esquerdista e não gosto de rosa.
Há, entretanto, duas coisas suficientemente fortes que nos unem: a primeira é que somos mulheres, e viemos ao mundo com essa honra e sentença; a segunda é que ambas sofremos abusos ao longo da vida, no pé de goiabeira ou na rua, pelo pastor ou pelo amigo da família, pouco importa: só nós conhecemos as marcas que carregamos.
Para mim, essas marcas se transformaram em potência de luta; para você, por alguma razão até hoje desconhecida, tornaram-se combustível para dedicar uma atenção ainda maior ao ofício de perseguir mulheres, como uma capitã do mato de cor-de-rosa, uma carrasca em tom desequilibrado que esquece as próprias feridas tentando ferir suas irmãs, mas só consegue ser o centro de uma ridícula ciranda de absurdos.
Seu comportamento sádico, ninguém pode negar, tem o timing perfeito: você julga que justo hoje, o Dia internacional da mulher, é o dia perfeito para dizer que “o governo Bolsonaro ensinará os meninos a levarem flores para as meninas e abrir a porta do carro para mulheres, por que não?”
Primeiro, querida, porque eles já sabem; cavalheirismo barato é o ponto forte de todo canalha.
Segundo, porque as mulheres do futuro – talvez você ainda não as conheça – abrem as portas de seus próprios carros e preferem flores vivas, que elas mesmas cultivam.
Enfim, é obsoleto. Mas há muitas coisas que o governo poderia ensinar aos homens: a não estuprarem, por exemplo.
Para que outras meninas e mulheres não passem pelo que você passou um dia. Que te parece?
Para isso, a educação sexual – que você demoniza – é o melhor, se não o único caminho.
Às vezes, confesso, me ocorre que você peca por ignorância; mas logo me lembro de não subestimar outras mulheres e concluo que você sabe exatamente o que está fazendo, e sabe exatamente a quem tem servido, embora saiba pouco sobre o que temos chamado de realidade.
No mundo real – fora da esquizofrênica bolha ultradireitista – igualdade não incentiva violência, como você declarou. “Já que é igual, ela aguenta apanhar” (?).
Um conhecimento básico de direito constitucional resolve a questão: a isonomia da Constituição de 1988 (para vocês, só um pedaço de papel), difere do conceito puro e simples de igualdade: significa reconhecer as diferenças (biológicas, sociais, de gênero, enfim), e promover políticas públicas para equalizá-las.
Por isso não faz sentido desprezar a isonomia para que mulheres não apanhem: basta ensinar aos homens a não baterem.
Por fim, cara compatriota, talvez você pense que vale a pena, em nome de seus ideais irreais, servir de joguete em um governo sujo, que te descartará como um chiclete mascado, mas, se eu puder te dar ainda um conselho, ocupe-se antes em cuidar da cabecinha.
Juízo é coisa que, quando a gente perde, fica difícil recuperar.
Procure intervenção psiquiátrica urgente.
Quem sabe dá jeito.
Um abraço.
Nathalí