A história da cadela Resistência e como ela foi adotada por Lula e a namorada. Por Renan Antunes

Atualizado em 30 de junho de 2020 às 15:34
Resistência na Vigília Lula Livre (FOTOS RAMIRO FURQUIM)

Eu a conheci em Curitiba, numa noite gelada do outono paranaense, em abril de 2018.

Ela estava na rua. Era uma cadelinha preta toda trêmula, encarangada de frio, enrolada apenas num lenço vermelho. Foi na primeira semana de Lula na cadeia.

O nome dela era Resistência.

Ela circulava entre as barracas da vigília do Lula, sem um lugar fixo pra ficar – mas todo mundo dava um carinho nela.

Eu a notei. O fotógrafo Ramiro Furquim também e fez uns cliques dela, que posava sem saber que iria ao estrelato – não das estrelas da fama, mas a das bandeiras do PT.

Eu sentei com um pessoal que viera do Oeste para a vigília e perguntei se ela tinha dono. Era de todo mundo. Me consta que teria vindo num ônibus, embarcada em algum ponto entre Chapecó e Curitiba.

Alguém dos metalúrgicos disse que ela foi recolhida nas ruas do bairro Santa Cândida, onde corria o risco de ser atropelada numa via rápida.

Sua origem não importa. A pituquinha era dócil. Não latia e nem rosnava para ninguém no acampamento, ciente de seu papel de mera coadjuvante na cena dos humanos.

Seus olhos tristes me diziam que ela queria mais. Queria alguém para chamar de seu. Queria um canto quente para dormir protegida e duas refeições ao dia.

Dividi uma bolacha d’água com ela, que não se fez de rogada.

A vida dela seguiria na mesma toada por mais de um ano, em seu protesto silencioso em defesa de Lula, que ela  não conhecia, mas que se tornaria seu dono.

Terminei minha reportagem e no dia seguinte fui embora, deixando Rê pra trás – eu sou cachorreiro, mas não posso trazer pra casa todo vira-latas que encontrar nas ruas ou teria que abrir um canil.

Não voltei mais ao acampamento. Ela? Foi crescendo na estima dos acampados.

Foi lá pelo fim de 2019 que Rê conheceu Janja, hoje a mulher do presidente Lula.

Janja se apaixonou pela bichinha. Levou-a para Sampa, deu um trato em veterinário e banho de pet shop, até deixá-la nos trinques – nada mais de lenço vermelho, mas sim uma estrelinha, tipo jóia, presa nos pelos da cabeça.

Resistência só viria a conhecer Lula depois que ele foi libertado. Paixão à primeira vista, os dois se deram muito bem.

Dias atrás eu vi umas fotos dos dois num jornal, Lula com Resistência no colo, ele usando um computador.

Tratei de descobrir a raça dela. Segundo a veterinária Sarita Marie Cavalcante de Souza, Resistência tem pedigree de Tomba-Latas.

É uma legítima SRD – sem raça definida, com alguma mistura de Poodle.

Sarita e sua irmã Sued me disseram que se sentiram honradas em identificar a cadelinha de Lula, de quem são admiradoras.

Resistência é calejada nas ruas. Teve sorte.

Conseguiu não um, mas dois humanos, casa, comida, caminha limpa, carinho e se precisar de tratamento vet seus donos pagam as despesas.

O pessoal do acampamento gostava de dizer que com o tempo ela passou a identificar os bolsonaristas e rosnar pra eles  – mas deve ser exagero, seria a primeira cadela com “viés ideológico” da história.

Por todos os relatos, hoje os três vivem felizes em São Bernardo – Janja, Lula e Rê.

É certo que dias de tormenta estão no horizonte, mas nada que Resistência não consiga enfrentar.

Resistência com seus donos, Lula e Janja