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“O jihadismo está em alta no mercado das revoltas da juventude”, diz especialista

Publicado na DW.

 

O pesquisador francês Olivier Roy é autor de numerosos livros sobre o islamismo, entre eles A santa ignorânciaO islã globalizado A laicidade face ao islã. Atuando desde 2009 no Instituto Universitário Europeu, em Florença, Itália, ele defende que há diversas e distintas manifestações dentro do islamismo.

Em entrevista à DW, ele fala sobre o que leva jovens a aderirem a práticas violentas como as da jihad. Apontando o extremismo islâmico como a nova forma de revolta juvenil, o cientista social explica que os jovens encontram espaço e reconhecimento em meio a ideologias fáceis desse tipo.

Para Roy, aqueles que já trabalharam pela ideologia jihadista e a abandonaram poderiam ter um papel importante para convencer jovens com tendências radicais: eles poderiam mostrar que não vale a pena dar a vida por essa causa extremista.

Deutsche Welle: Os terroristas de Paris cresceram em nossa sociedade. O que atrai jovens europeus para o radicalismo islâmico e o jihadismo?

Olivier Roy: Entre eles, predomina uma frustração perante a sociedade. Trata-se de uma juventude rebelde, que busca algo por que possa se engajar. A jihad é perfeito: quando você entra nele, se torna um herói, aparece nas manchetes dos jornais, todos vão falar de você. Tanto faz que as pessoas o odeiem, pois você já as odeia, de qualquer jeito.

No mercado das revoltas da juventude, o jihadismo está em alta. Há 30 anos existia o extremismo de esquerda, os movimentos revolucionários. Mas a ideologia da esquerda é intelectual demais para esses jovens: eles querem algo mais brutal, eles querem combater.

Algumas pessoas são mais suscetíveis ao radicalismo?

Na França, há os muçulmanos da segunda geração. Eles nasceram e cresceram no Ocidente, mas seus pais vêm de um país muçulmano. Eles têm problemas na transmissão de culturas e tradições, em muitos casos os pais não passaram adiante sua cultura, nem lhes deram uma formação religiosa. Por isso, eles precisam começar do zero.

No salafismo e no fundamentalismo islâmico, encontram a religião que lhes convém, pois é uma religião de normas, mandamentos e proibições. Além disso é uma forma de religião que traça uma linha clara entre os fiéis – os “bons” – e os infiéis – o seja, todos os outros, inclusive os pais e outros muçulmanos. Assim, o salafismo é para eles uma espécie de ideologia pronta, que lhes dá o sentimento de pertencer a uma vanguarda ou elite que está salvando o mundo.

Isso poderia explicar a radicalização religiosa. Mas não o fato de eles estarem prontos a combater e matar – se preciso, a si mesmos.

Com certeza! A radicalização religiosa não leva automaticamente ao jihad: apenas uma pequena minoria acaba caindo nele, os que são fascinados por violência e morte. Há uma dimensão suicida e niilista: na Europa, eles não tentam de verdade escapar após os atentados, a maioria morre diretamente no local. Quando vão para a Síria, eles se candidatam voluntariamente aos ataques suicidas. Ou deixam o “Estado Islâmico” (EI) usá-los como “bucha de canhão”. Essas pessoas têm claramente uma cultura da morte.

O senhor vê alguma possibilidade de chegar a elas? Quando pais, amigos ou colegas observam que seu filho, amigo ou conhecido está indo numa direção perigosa?

É claro que o meio social é muito importante. Mas a experiência mostra: quando eles ultrapassam um certo ponto, não há mais como convencê-los. O único meio que poderia trazê-los de volta é quando eles vivenciam o fracasso de seu próprio jihad. Temos centenas de jihadistas que voltam da Síria. Alguns possivelmente cometeram terríveis crimes por lá, mas outros estão decepcionados e se afastaram do jihad. Essas pessoas poderiam ter um importante papel em convencer outras que não vale a pena dar a vida por essa luta.

Muitos terroristas já cumpriram penas na cadeia, e o período na prisão teve papel importante em sua radicalização. Como se pode evitar isso?

Entre os jovens condenados, há um grande percentual de muçulmanos da segunda geração. Os jovens são abertos à manipulação e às influências, e se deve cuidar das necessidades psicológicas e espirituais dos jovens presos. Por isso cada país deveria criar um sistema profissional de assistência espiritual muçulmana nas prisões.

 

Diario do Centro do Mundo

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