Categories: DestaquesMídia

Por dentro das redações: o papel dos donos em decisões como a do Datafolha. Por Paulo Nogueira

O patrão sabe de tudo previamente

Vi algumas pessoas se perguntando quem é o responsável pela fraude da Folha no Datafolha.

O editor executivo Sérgio Dávila ou o editor e dono Otávio Frias?

A pergunta traduz um desconhecimento de como funcionam as empresas jornalísticas.

As decisões realmente importantes, no campo da política e da economia sobretudo, são todas elas dos donos.

Isso quer dizer que a culpa no Datafolha foi de Otávio Frias. Dávila foi, é verdade, cúmplice. Mas não mais que isso.

Muitas vezes os proprietários fingem que não têm nada a ver com certas decisões que provocam repulsa.

Roberto Civita gostava de atribuir maldades da Veja aos “meninos” da redação. Essa desculpa era costumeira quando RC ia a Brasília pedir favores do governo e topava com queixas sobre absurdos que a revista publicara.

Mas, como Dávila, os meninos eram apenas cúmplices. Nenhuma decisão editorial relevante da Veja, principalmente nos anos de jornalismo de guerra contra Lula e o PT, foi tomada por alguém que não fosse Roberto Civita.

Os editores jamais o afrontaram. Praticaram invariavelmente a famulagem.

João Roberto Marinho, da Globo, faz a mesma coisa. Num trecho de uma conversa gravada, ele é citado como tendo atribuído aos jornalistas da Globo certas coisas.

Não é verdade. A linha editorial da Globo é controlada rigidamente pela família Marinho, e por ninguém mais.

Numa reunião semanal, João Roberto conversa com os principais editores e jornalistas da casa. Nesse encontro são definidos por João Roberto, em nome de seus dois irmãos, os parâmetros da cobertura política da Globo.

Deste papel — o de definidores das diretrizes — os barões da mídia nunca abdicam. Os jornalistas que os cercam sabem que não sobreviverão se desafiarem as vontades dos patrões.

No jornalismo de guerra que caracterizou a imprensa brasileira pós-PT, a obediência aos Marinhos, Frias e Civitas virou um atributo obrigatório entre chefes de redações.

No caso do Datafolha, para voltarmos ao princípio da conversa, são zero as chances a fraude não ter sido vista e aprovada previamente por Otávio Frias.

Dávila, o editor executivo, oscilou apenas entre a cumplicidade e a famulagem.

Paulo Nogueira

O jornalista Paulo Nogueira é fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.

Disqus Comments Loading...
Share
Published by
Paulo Nogueira

Recent Posts

‘Se não reagirmos, em 15 anos não haverá mais democracia no mundo’, diz pesquisador

João Cezar de Castro Rocha tem um trabalho árduo que ele mesmo se impôs: frequentar…

38 minutos ago

Tarcísio pula abertura de feira de agronegócio para acompanhar ato de Bolsonaro em Ribeirão Preto

Os governadores de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), e de Goiás, Ronaldo Caiado (União),…

1 hora ago

Aniversário de 79 anos da morte de Mussolini tem homenagens facistas

O 79º aniversário da morte de Benito Mussolini e sua amante, Claretta Petacci, foi celebrado…

3 horas ago

Quem é Andressa Mendonça, ex-mulher que ameaça ‘contar podres’ de senador bolsonarista

Andressa Mendonça, ex-mulher do senador Wilder Morais, ganhou destaque neste domingo (28) ao ameaçar expor…

3 horas ago

Ex-mulher de senador Wilder Morais ameaça contar podres se bolsonarista não abrir carteira

Ex-mulher do senador Wilder Morais (GO), Andressa Mendonça ameaçou expor os podres do bolsonarista caso…

4 horas ago

Madonna de cidadã honorária do Rio é o cúmulo da viralatice. Por Nathalí

Por Nathalí Dessa vez a síndrome de vira-lata foi longe demais: a câmara de vereadores…

5 horas ago