2013 não acabou? O relato de nosso repórter sobre as agressões da PM no último protesto do MPL

Atualizado em 10 de janeiro de 2015 às 10:44

 

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Ainda me lembro de dois barulhos de bombas na mesma rua, os outros três que ouvi na Consolação e do desespero das quatro mulheres que correram comigo até uma garagem de um sobrado na Rua Matias Aires, na Consolação, em São Paulo.

Eram 19h e ficamos escondidos ali por mais de meia hora, falando em voz baixa e com medo que a Tropa de Choque da PM invadisse o local. Estávamos no protesto do Movimento Passe Livre contra o aumento da tarifa.

Uma amiga minha conseguiu ter mais azar. Conversávamos antes dos disparos de bala de borracha e das bombas de efeito moral. Sentíamos que o clima estava pesando quando vimos rapazes black blocs indo depredar um banco. Só não imaginávamos que a reação seria naquela proporção.

Ela fugiu para um bar na mesma rua, esquina da Matias com a Rua Augusta. O problema é que a polícia foi atrás e invadiu o local. E ela se escondeu atrás de uma geladeira, num local onde “jamais imaginou que caberia”.

Antes de correr para o bar, minha amiga Cecília chegou a ver um PM apontando uma arma de bala de borracha contra seu rosto e teve uma bomba jogada próxima dos seus pés, mas conseguiu evitar o estouro se movimentando a tempo.

Eu cheguei uma hora antes do horário oficial da manifestação, às 16hrs. Conversei com integrantes do movimento Território Livre no Teatro Municipal e vi cartazes dizendo que às 17h ocorreria uma assembléia pública do Movimento Passe Livre  para definir o percurso da mobilização. Aproveitei o tempo livre para descobrir onde estava a polícia e vi que tudo ainda estava muito vazio.

Às 16h30, vi que a lateral direita da prefeitura encheu de viaturas da Força Tática e da Tropa de Choque. Poucos guardas municipais estavam no local e um grupo menor de manifestantes estava montando cartazes por ali, separados da turma do Municipal.

Às 17h, os grupos de manifestantes se reuniram. Ao mesmo tempo, a PM girou com suas vitaduras para interditar a rua de acesso à prefeitura, lotando de carros. A Tropa de Choque chegou pela lateral e se fixou na frente das Casas Bahia, antigo Mappin.

Na assembléia, a PM filmou a decisão dos manifestantes, ouviu toda a rota e conversou com algumas lideranças, informando que acompanharia a mobilização. Alguns oficiais do Choque possuíam câmeras GoPro presas no torso de suas armaduras “RoboCop”.

Um grupo de petistas protestava contra o prefeito Fernando Haddad, sem fazer alusão ao governador Geraldo Alckmin que era “homenageado” em outros cartazes. O grupo pequeno de filiados do PT, cerca de 10 pessoas, pedia revogamento da tarifa de ônibus. Um homem chamado Alexandre me explicou que eles são de fato militantes.

Às 17h30, a Polícia Militar cercou completamente o protesto. Achei que teríamos  problemas para sair dali. Um senhor visivelmente bêbado começou a xingar as viaturas que impediam nosso deslocamento. “Estou aqui lutando pelos meus direitos e não por este estado de merda”, gritou, xingando os PMs.

No mesmo local, um pouco adiante, estava o blogueiro do UOL Leonardo Sakamoto. Tirei sarro no Facebook afirmando que ele estava recebendo autógrafos de fãs. “Não, estava só assinando a papelada de direitos de imagem que pedem em protestos”, ele me explicou, quando começamos a andar.

Não se via só bandeiras tradicionais, do PSOL, do PSTU, dos black blocs e do Movimento Passe Livre. Havia integrantes do RUA, um movimento anticapitalista, e até do Partido Pirata, que prega ciberativismo e estava fazendo streaming no local junto com outro grupo conhecido, o Mídia NINJA.

Ou seja, a impressão que se tinha é que as Jornadas de Junho de 2013 aumentaram muito as vertentes de mobilizações que desejam a tarifa zero ou uma redução drástica dos custos em transporte público.

 

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A massa de pessoas aumentou de cerca de mil para 5 mil à medida que contornamos o Teatro Municipal e pegamos as ruas em direção à Ipiranga. De lá, o protesto estava determinado a tomar a Consolação. Fraquejamos num momento, no cruzamento da São Luís, quando a PM tentou conter o avanço. Um princípio de confusão começou entre black blocs e o cordão de isolamento da polícia, mas foi suprimido.

A Tropa de Choque deixou o povo avançar e os manifestantes formaram seu próprio cordão de união, enquanto gritavam e pulavam mesmo num calor de cerca de 35 graus. “Mais um aumento eu não aguento!”.

Subimos a Consolação com relativa calma no começo. O protesto tomou a pista em direção à Avenida Paulista. Progressivamente, a massa tomou a via na contramão. O problema é que, conforme expandíamos de tamanho, as pessoas ficavam cada vez mais dispersas e menos concentradas. Os blocs então assumiram a dianteira.

Começaram então palavras de ordem contra a PM. “Tem que ser dismilitarizada! Fascistas! Fascistões!”.

O clima começou a pesar cada vez mais. Os black blocs então correram ainda mais à frente e depredaram uma agência bancária. O Choque não perdoou essa e contra-atacou. Eu estava com minha amiga Cecília naquele instante.

Foi neste momento, da ponta da Consolação até a Rua Matias Aires, que nós fomos encurralados com três bombas de efeito moral. Quem ficou na avenida ainda teve que topar com balas de borracha.

Eu corri e entrei na primeira porta aberta que vi na Matias. Era uma garagem e eu estava com quatro mulheres e um homem que eu sequer conhecia. Chequei no Twitter e vi que muita gente estava sendo perseguida e presa.

Os donos da casa foram conversar conosco. Eram evangélicos e iam começar o culto dali a poucos minutos. Eu fui olhar pela janela. Quando vi que o Choque havia saído dos bares e estava conversando com a imprensa, decidi que talvez fosse o momento de sair. Estava certo. Perguntei cordialmente a um PM como eu deveria sair dali. Ele, percebendo que eu estava no protesto, respeitosamente não respondeu minha pergunta. E pediu água mineral para o mesmo dono da residência onde eu estava.

Os números da manifestação são confusos. O Passe Livre fala em 30 mil pessoas. Eu chuto em torno de 15 mil e a PM diz que haviam 5 mil. Cerca de 50 foram presas. O fato é que, conforma éramos encurralados, o movimento perdeu completamente sua força e repetiu as primeiras mobilizações de 2013.

 

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